A USC (Universidade do Sul da Califórnia) cancelou um discurso de formatura que seria feito pela muçulmana Asna Tabassum após alegar que emails e outras mensagens alertaram sobre um plano para interromper a cerimônia, incluindo pelo menos um que tinha a estudante como alvo.
“Nos últimos dias, as discussões relacionadas à seleção de nosso orador assumiram um tom alarmante”, disse Andrew Guzman, o pró-reitor e responsável pela decisão final de escolher Tabassum. “A intensidade dos sentimentos, alimentada tanto pelas redes sociais quanto pelo conflito em curso no Oriente Médio, cresceu, incluiu muitas vozes de fora da USC e escalou a ponto de criar riscos substanciais relacionados à segurança e à interrupção da cerimônia.”
A universidade se recusou a fornecer detalhes sobre a origem das mensagens ou informar se elas estavam sob investigação criminal. A decisão foi tomada após dois grupos pró-Israel do campus reclamarem da seleção citando o apoio da estudantes aos palestinos nas redes sociais.
Tabassum, uma estudante de engenharia biomédica que se identifica como americana de ascendência asiática, não pôde ser contatada para comentar. Mas, em um comunicado, ela criticou a medida.
“Estou chocada com essa decisão e profundamente decepcionada que a universidade esteja cedendo a uma campanha de ódio destinada a silenciar minha voz”, escreveu Tabassum. “É incerto que a decisão da USC de revogar meu convite para falar tenha sido tomada unicamente com base na segurança.”
O Conselho de Relações Islâmico-Americanas, uma organização de direitos civis muçulmana, classificou a decisão de “covarde” e exigiu que a USC revertesse a medida.
Os discursos de formatura podem ser o próximo ponto de controvérsia para o debate sobre liberdade de expressão que tem dominado muitas universidades americanas desde o início da guerra entre Israel e Hamas.
Autoridades universitárias tiveram que lidar com debates acalorados sobre protestos de estudantes pró-Palestina, que, segundo estudantes judeus e ex-alunos, frequentemente se transformam em antissemitismo. Os manifestantes, por sua vez, afirmam que a reação é uma tentativa de censurar suas crenças políticas.
Ao reconhecer que o cancelamento do discurso quebrou a tradição da universidade, Guzman disse que a deliberação não está relacionada com a liberdade de expressão.
Erroll Southers, responsável pela segurança da USC, afirmou em uma entrevista que a decisão seguiu uma enxurrada de mensagens ameaçando as próximas cerimônias. “Elas identificavam a oradora e eram significativas em detalhes sobre a pessoa, o evento e a intenção de interromper nossa cerimônia de formatura.” disse Southers, vice-presidente de Segurança do campus.
O professor disse que ainda não haviam decido se permitiriam que Tabassum se sentasse no palco durante o evento.
A USC havia anunciado no dia 5 de abril que Tabassum, natural de Chino Hills, na Califórnia, seria a oradora de 2024. Ela foi selecionada entre mais de 200 estudantes que atenderam aos requisitos acadêmicos —uma média de notas de pelo menos 3,98. Desse grupo, um comitê formado por membros do corpo docente avaliou mais de 100 candidatos.
O anúncio da seleção citou o trabalho voluntário da aluna com organizações sem fins lucrativos na área de Los Angeles, incluindo uma clínica móvel de pressão arterial que visita abrigos para pessoas sem-teto e um grupo que ela cofundou para distribuir suprimentos médicos em regiões vulneráveis ao redor do mundo.
Pouco depois do anúncio, um grupo do campus conhecido como Trojans for Israel emitiu uma declaração dizendo que Tabassum “transita abertamente em uma retórica antissemita e antissionista”. O comunicado citou a biografia dela nas redes sociais, que incluía um link para uma página que chama o sionismo de “ideologia racista e colonialista”. Uma reclamação semelhante veio da unidade da filial do grupo Chabad no campus. As organizações pediram à universidade para reconsiderar a seleção.
Anuj Desai, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Wisconsin-Madison, sugeriu que Tabassum poderia ter motivos legais para processar a universidade, especialmente à luz de uma lei da Califórnia que apoia o direito à liberdade de expressão estabelecido na Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos aos estudantes.
“Se o motivo pelo qual estão removendo ela é por causa de suas opiniões, então isso parece muito mais um problema de liberdade de expressão”, disse ele. “Normalmente, diríamos para reforçar a segurança.”
Mas Desai disse que a universidade poderia ter justificativas para interromper seu discurso se descobrisse que Tabassum planejava usar sua fala como um fórum, como os oradores de formatura às vezes fazem, para expressar sua indignação sobre questões atuais.
“Eles podem legitimamente dizer que não querem um discurso sobre o Oriente Médio —não somos pró-palestinos e não somos pró-israelenses”, disse ele.
Em uma decisão igualmente polêmica, a Faculdade de Direito da Universidade da Cidade de Nova York suspendeu a tradição de deixar os alunos escolherem seu orador. Essa decisão, divulgada pelo jornal The Forward, aconteceu após Fatima Mousa Mohammed, uma estudante de direito de origem iemenita, criticar a Polícia de Nova York em seu discurso do ano passado e pedir a seus colegas para lutar contra o “capitalismo, o racismo, o imperialismo e o sionismo“.
O conselho de administração da universidade chamou os comentários de “discurso de ódio” e a Hunter College levantou preocupações sobre um plano de realizar a cerimônia de formatura de 2024 da Faculdade de Direito da Universidade da Cidade de Nova York no seu campus, em maio. Em vez disso, a faculdade anunciou que a cerimônia será no Apollo Theater.