A etapa final do Sínodo da Sinodalidade, convocado há quatro anos pelo papa Francisco como uma grande oportunidade para debater o futuro da Igreja Católica, começou nesta semana no Vaticano com expectativas bem menores do que as iniciais.
Na primeira fase, em 2023, a instituição chegou a tratar de questões controversas como a participação mais decisiva das mulheres, a ordenação de homens casados como padres e a inclusão de pessoas LGBTQIA+. Nos últimos meses, porém, o potencial reformista desse sínodo e do próprio papado de Francisco perdeu força.
“Esta não é uma assembleia parlamentar, mas um lugar de escuta em comunhão. Tenhamos o cuidado de não transformar as nossas contribuições em teimosias a defender ou agendas a impor, mas oferecê-los como dons a partilhar”, disse o pontífice na missa de abertura do sínodo, na praça São Pedro.
O processo de consulta de fiéis em todo o mundo foi considerado o mais ambicioso da história recente do catolicismo. Chegou a ser visto por alas progressistas como um caminho para mudanças expressivas e foi tachado pelo campo conservador como fonte de um iminente cisma.
Passado o impacto inicial, porém, vieram os ajustes à realidade. Tão logo foi divulgado o relatório de síntese da sessão do ano passado revelou-se a divisão dos participantes sobre tópicos como o acesso das mulheres ao diaconato –o tema foi o ponto que mais atraiu objeção.
Em dezembro, a publicação do “Fiducia supplicans”, que autorizou a bênção de casais considerados irregulares pelo Vaticano, como homossexuais e divorciados, foi outro sinal de dissenso. Diversas autoridades religiosas condenaram publicamente a medida.
“Ficou claro que fazer reformas revolucionárias é impossível”, diz à Folha Matteo Matzuzzi, editor-chefe e vaticanista do jornal Il Foglio Quotidiano. “Essas coisas podem ser discutidas durante um mês dentro do Vaticano e nunca haverá acordo. A não ser que seja por imposição do papa, mas ele parece não querer chegar a isso, porque criaria uma fratura importante dentro da igreja.”
Em março, outro indício de que a assembleia de agora estava sendo esvaziada veio quando Francisco anunciou a criação de dez grupos de estudos para analisar, até julho de 2025, assuntos divisivos. Um deles foi encarregado de realizar uma pesquisa “teológica e pastoral” sobre o diaconato feminino.
Quatro meses depois, a divulgação da pauta de trabalhos confirmou que o diaconato das mulheres, a inclusão de católicos LGBTQIA+ e o celibato de padres não estarão na agenda oficial de debates das próximas semanas. A decisão agradou à ala mais conservadora da igreja, que vê o adiamento de eventuais mudanças indesejadas, e frustrou os progressistas, que ansiavam por reformas.
Nas próximas três semanas, 368 participantes, como cardeais, bispos e especialistas leigos, realizam uma última rodada de reflexões para a produção de um documento com indicações a Francisco. Com o texto final em mãos, o papa poderá ou não fornecer diretrizes ao clero, esperadas para 2025.
Com os temas polêmicos de fora, espera-se que o sínodo se concentre em questões ligadas ao caráter missionário, com chamados por mais decisões compartilhadas e mais participação das mulheres nessa tarefa. Também deve haver recomendação de mais transparência, inclusive econômica, e mais responsabilidade do clero, como em relação a abusos sexuais.
Atualmente há 1,39 bilhão de católicos no mundo, alta de 11% desde quando Jorge Bergoglio virou papa, em 2013. Enquanto o número de bispos permanece estável, o de padres e de religiosas professas (freiras, irmãs e madres) está em queda. Subiu o total de diáconos –o primeiro degrau na hierarquia católica–, que hoje só podem ser homens, inclusive casados.
Com pouco espaço para mudanças de impacto agora, o legado de Francisco, 87, passa por questionamentos. “Potencialmente, [o sínodo] poderia ser seu grande legado, mas isso se a assembleia decidisse alguma coisa importante”, diz Matzuzzi.
Diante da idade avançada e dos 11 anos de pontificado, cresce a impressão de que sua capacidade transformadora foi diluída. “A força motriz reformadora se apagou um pouco. Essas coisas ou são feitas no início ou se tornam mais difíceis. Começo a pensar que a revolução não acontecerá neste pontificado”, afirma o vaticanista.