Por Igor Gielow / Folhapress
Um atentado com um patinete-bomba matou na manhã desta terça (17) o comandante das forças de defesa contra armas nucleares, químicas e biológicas da Rússia, general Igor Kirillov. Ele estava acompanhado por um assistente, Ilia Polikarpov, que também morreu.
Na véspera, o SBU (serviço secreto da Ucrânia) o havia condenado in absentia pela acusação de emprego de armas químicas na guerra iniciada por Vladimir Putin em 2022. Nesta terça, o órgão confirmou de forma anônima a autoria do ataque.
Kirillov, 54, é o mais valioso alvo militar morto fora de combates na guerra, onde ao menos dez generais russos tombaram. Desde 2017, ele liderava o departamento das Forças Armadas dedicado a proteger as tropas em caso de ataques com armas de destruição em massa.
Ganhou fama no atual conflito ao divulgar uma lista de 19 laboratórios de armas biológicas que seriam operados pelos Estados Unidos nas áreas que a Rússia ocupou na Ucrânia. Kiev nega, e ao aplicar sanções contra o militar o governo do Reino Unido o acusou de ser um “importante divulgador de desinformação”.
Na via inversa, os russos dizem que a acusação de emprego de armas químicas é improcedente. O país é signatário de convenção internacional que veta tais armamentos, e diz ter liquidado os estoques remanescentes do tempo da Guerra Fria sob supervisão externa.
Segundo Kiev, houve 4.800 incidentes com armas químicas usadas pela Rússia desde o início do conflito, a maioria o emprego de granadas com cloropicrina, um gás asfixiantes e irritante muito usado na Primeira Guerra Mundial (1914-18).
Kirillov, que tinha mulher e dois filhos, fazia a mesma acusação contra os ucranianos, inclusive no ataque à região russa de Kursk, neste ano. Ele também dizia, igualmente sem provas, que Kiev preparava uma bomba suja, um artefato radioativo primitivo, para acusar Moscou de atacá-la com armas nucleares.
Sua morte é mais vistosa na campanha de assassinatos que a Ucrânia só admite tacitamente. Até aqui, os alvos mais conhecidos eram ativistas ligados à promoção da guerra. Em agosto de 2022, por exemplo, uma bomba matou Daria Dugina, filha do ideológo nacionalista Aleksandr Dugin, em Moscou. Jornalistas simpáticos ao Kremlin e blogueiros militares também foram alvos.
No caso de Kirillov, a bomba estava plantada em um patinete elétrico estacionado em frente a um prédio residencial na avenida Riazanski, cerca de 7 km a sudeste do Kremlin.
Moscou, como outras cidades, tem esses veículos para uso compartilhado espalhados em diversos pontos, embora imagens do local sugiram um patinete mais sofisticado. Segundo o Comitê Investigativo Russo, órgão que assume esse tipo de caso, uma apuração foi aberta.
A entrada do edifício foi danificada e as janelas de vários apartamentos foram quebradas. Segundo a agência Tass, a investigação preliminar indica que a explosão teve a potência de 1 kg de TNT.
Kirillov era um tenente-general, que com duas estrelas na hierarquia russa equivale ao segundo posto no começo da carreira de oficial-general no país, assim como em alguns do Ocidente mas não o Brasil, ainda há generais de uma estrela, chamados de major-general.
Sua morte ocorre em um momento de assertividade russa no campo de batalha e dificuldades militares e políticas em Kiev. Ela não tem impacto operacional na guerra, mas sim psicológico: o Kremlin trabalha para isolar a capital do conflito, e aos poucos foi naturalizando sua presença no cotidiano, mas mantém a cidade bastante protegida contra os usuais ataques com drones, por exemplo.
A retaliação russa é certa, como já anunciou um dos falcões do governo Putin, o ex-presidente Dmitri Medvedev, que pediu ação “imediata”. Resta saber se haverá proporcionalidade ou se o Kremlin fará algo mais espetaculoso, como o emprego do míssil Orechnik.
A arma foi testada em combate pela primeira vez no dia 21 de novembro contra a cidade de Dnipro, assustando o mundo dadas suas características semelhantes à de um míssil intercontinental para ataques nucleares. Ela é de alcance intermediário, contudo, mas também emprega ogivas múltiplas virtualmente impossíveis de interceptar.
Putin tem dito que irá empregá-lo novamente, e ameaçou atacar “centros de decisão em Kiev”, mas o Pentágono diz que uma campanha maciça é impossível porque não há números suficientes do míssil.
Em campo, os russos prosseguiram com seu avanço no leste ucraniano, tomando a 190ª cidade ou vilarejo dos rivais neste ano. Neste caso, a ação foi em Donetsk, cuja conquista parece prioritária para Moscou o Ministério da Defesa diz ter cerca de 70% do território em suas mãos.