O frio de 2º C na madrugada desta quinta-feira (8) em Washington não desanimou dezenas de pessoas, que, munidas de camadas e camadas de blusas, cobertores e cadeiras de camping, formaram uma fila ao lado da Suprema Corte na esperança de conseguir um assento na audiência que debate se Donald Trump deve ou não ser impedido de concorrer na eleição.
As estudantes Alondra Padilla, 22, e Wu Luoyan, 23, chegaram por volta da 1h30. “Pelo menos não estava ventando muito, tivemos sorte”, diz Padilla, envolta em quatro camadas de blusas.
As duas estenderam um cobertor no chão e revezaram sonecas sentadas ao longo da noite, apoiadas na grade colocada ao redor do prédio por segurança. No cardápio, sanduíches que trouxeram de casa e bolacha Oreo.
“Eu acho que isso é algo que vai fazer história, por isso quis vir”, diz Padilla, filha de pais mexicanos nascida na Califórnia. Para ela, está claro que o ex-presidente cometeu insurreição e, por isso, deve ser impedido de participar da eleição.
Já Sahar Smith, 56, discorda. Usando um boné vermelho em apoio a Trump e um broche com o nome do ex-presidente, afirma que chegou por volta das 3h30. Para passar o tempo, lia a autobiografia do juiz Clarence Thomas, “My Grandfather’s Son” (o filho do meu avô).
A mulher do magistrado, Ginni Thomas, é uma ativista conservadora que apoiou Trump em suas alegações sem provas de fraude eleitoral em 2020. Por isso, houve pedidos para que o juiz se declarasse impedido de participar deste caso –o que não ocorreu.
“Eu acredito que essa é uma questão pelos nossos direitos e liberdades, e por isso eu espero que os juízes, todos os nove, verão como um direito constitucional que nós, o povo, escolhamos nossas autoridades eleitas”, afirma ela.
Embora não seja um apoiador do ex-presidente, George Haywood, 71, vê com preocupação a repercussão política caso a Suprema Corte decida impedir Trump de concorrer. Apontando para o Capitólio, do outro lado da rua, ele diz que, em sua visão, o empresário cometeu insurreição quando seus apoiadores invadiram o Congresso, em 6 de janeiro de 2021.
“Isso o desqualifica como candidato, mas não acho que a Suprema Corte vá fazer isso, e talvez não seja mesmo politicamente inteligente, porque os seus apoiadores vão dizer que ele está sendo perseguido”, afirma Haywood, que mora a poucos quarteirões e resolveu passar por ali de manhã para ver se teria sorte para conseguir um lugar.
Para os estudantes de direito na Universidade Georgetown Aaron Frazee, 26, e Ursa Beckford, 30, a Suprema Corte está em uma encruzilhada.
“É complicado. Acho que é meio que um cenário de perde-perde. Qualquer que seja a decisão, muitas pessoas vão ficar chateadas e haverá muita agitação”, diz Frazee.
“Pessoalmente, eu acho que ele deveria ser desqualificado. Acho que a 14ª Emenda é clara e acredito que tenha havido uma falta de responsabilização das pessoas por suas ações recentemente. Então, é isso que eu acho que deveria acontecer, mas estou preocupado com o resultado de qualquer forma”, declara.
Além das consequências políticas para Trump, a decisão pode ter um impacto sobre a credibilidade da própria Suprema Corte, duramente atingida por opiniões conservadoras nos últimos anos. Questionados sobre esse efeito, os dois são céticos.
“A confiança na Corte já está muito baixa”, diz Beckford. “Eu acho que haja uma desconfiança crescente no governo e nas eleições, e isso é preocupante.”
Pouco depois das 10h no horário local, quando a sessão estava marcada para começar, uma policial gritou para a fila que conseguiria colocar cerca de dez pessoas para dentro —menos do que os 40 que circulavam na expectativa de quem esperava.
Dois adolescentes que estavam havia 17 horas na fila comemoram. “Eu poderia chorar”, disse um. “Deus é bom”, emendou o outro.