O Tribunal Constitucional de Uganda rejeitou recurso e decidiu manter em grande parte a lei anti-LGBTQIA+ aprovada e promulgada no ano passado, que prevê prisão perpétua para pessoas que se envolvam em relações homossexuais. A corte é a segunda maior instância judicial do país, abaixo apenas da Suprema Corte.
Há também na lei a previsão de pena de morte em caso de “homossexualidade agravada”, termo amplo que inclui atos de relações do mesmo sexo com menores ou pessoas com deficiência, aqueles realizados sob ameaça ou enquanto alguém está inconsciente. A acusação ainda do que a lei se refere como “tentativa de homossexualidade agravada” pode acarretar uma pena de prisão de até 14 anos.
A rejeição do recurso contra o texto, assinado em maio passado pelo ditador Yoweri Museveni, no poder desde 1986, mina esforços de ativistas e grupos de direitos para abolir a legislação que foi recebida com críticas e criou tensões de países ocidentais com Campala.
Uganda enfrentou consequências internacionais por aprovar a lei. O Banco Mundial suspendeu novos financiamentos ao país, e os Estados Unidos impuseram sanções e restrições de visto a altos funcionários ugandenses.
A legislação, no entanto, é popular em Uganda, uma nação sem saída para o mar com mais de 48 milhões de habitantes, onde líderes religiosos e políticos frequentemente se manifestam contra a homossexualidade.
As repercussões para Uganda serão observadas de perto em outros países africanos onde o sentimento anti-LGBTQIA+ tem aumentado e leis em sentido semelhante são atualmente analisadas, incluindo Quênia, Namíbia, Tanzânia e Sudão do Sul. Em fevereiro, o Parlamento de Gana aprovou uma lei parecida, mas o presidente do país disse que não a assinaria até que o Supremo Tribunal se pronunciasse sobre sua constitucionalidade.
O tribunal de cinco juízes em Uganda rejeitou o pedido para anular a lei em sentença de 200 páginas que, apesar da decisão contrária ao recurso, indica também que o texto viola vários direitos fundamentais concedidos na Constituição do país, incluindo o direito à saúde e à privacidade.
“Recusamos anular o Ato Anti-Homossexualidade de 2023 em sua totalidade, nem concederemos uma liminar permanente contra sua aplicação”, disse Richard Buteera, um dos juízes, ao ler o resumo da sentença em tribunal lotado.
Frank Mugisha, um proeminente ativista dos direitos LGBT+ e um dos peticionários, disse que grupos de direitos irão apelar da decisão do Tribunal Constitucional para a Suprema Corte.
“Estou muito triste”, disse Mugisha em uma entrevista por telefone ao jornal The New York Times. “Os juízes foram influenciados pela propaganda do movimento anti-gay que continuou dizendo que isso é de interesse público e refutando todos os argumentos que fizemos relacionados à Constituição e obrigações internacionais.”
A aprovação da lei —que também impõe multas pesadas a organizações condenadas por “promover” a homossexualidade— alarmou defensores dos direitos humanos, que disseram que ela daria novo ímpeto para a introdução de leis draconianas equivalentes em outras nações africanas. Uganda está entre os países africanos que já proíbem relações entre pessoas do mesmo sexo, mas a nova lei cria delitos adicionais e prescreve penas muito mais severas.
As Nações Unidas, junto com grupos locais e internacionais de direitos humanos, disseram que a lei conflitava com a Constituição de Uganda e que provavelmente seria usada para assediar e intimidar sua população LGBTQ+.
O sentimento anti-LGBT+ é prevalente entre legisladores e líderes religiosos muçulmanos e cristãos. Eles dizem que a homossexualidade é uma importação ocidental, e realizaram comícios para mostrar apoio à lei antes de sua aprovação aprovada.
Algumas semanas após ser levada ao Parlamento, a lei foi rapidamente aprovada com apenas dois votos contrários.
Ativistas, acadêmicos e advogados de direitos humanos que desafiaram a lei no tribunal disseram que ela contrariava não apenas a Constituição de Uganda, que garante liberdade contra discriminação, mas também tratados internacionais, incluindo a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. Eles também argumentaram que o Parlamento aprovou a lei sem tempo suficiente para a participação pública —argumentos rejeitados pela corte.
Grupos de direitos humanos disseram que desde a introdução e aprovação da lei, ugandeses LGBTQ+ enfrentam violência e assédio.
A Convenção pela Igualdade, uma coalizão de grupos de direitos humanos em Uganda, documentou centenas de violações e abusos de direitos, incluindo prisões e exames anais forçados. Ugandeses gays e transexuais também foram expulsos de suas casas e agredidos por membros da família o que forçou muitos a fugirem para países vizinhos, como o Quênia.
A aprovação da lei também trouxe repercussões de saúde para Uganda. Especialistas se preocupam que a lei dificultaria o acesso médico para pessoas gays, especialmente aquelas em busca de testes, prevenção e tratamento contra o HIV.
Os Estados Unidos disseram que restringiriam vistos para autoridades de Uganda que se acredita serem responsáveis por fazer avançar a legislação. O governo de Joe Biden também removeu Uganda de um programa especial que permite acesso livre de impostos a produtos africanos nos Estados Unidos.