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Somos humanos, dizem haitianos após fake news de Trump – 11/09/2024 – Mundo

As fake news amplificadas pela campanha de Donald Trump nos Estados Unidos nos últimos dias sobre imigrantes do Haiti levaram a respostas de políticos da nação caribenha denotando a xenofobia e o racismo dos comentários. “Mais uma vez temos de proclamar nossa humanidade”, disse uma ministra haitiana.

Figuras de peso da campanha republicana têm afirmado, sem mostrar evidências, que imigrantes haitianos em Springfield, cidade no estado de Ohio, estão roubando animais de estimação da vizinhança para comê-los. O candidato a vice de Trump, JD Vance , foi uma delas.

Até que o próprio ex-presidente ecoou a fake news durante o debate contra Kamala Harris na noite desta terça-feira (10). “Olhe o que está acontecendo nas nossas cidades. Estão comendo cachorros, gatos, todos os bichos de estimação das pessoas que vivem lá”, disse.

Trump foi então desmentido pelo mediador do debate da ABC, que lembrou que a rede consultou autoridades de Springfield, para as quais nunca chegou qualquer denúncia pública de que imigrantes estejam comendo animais de estimação no município.

Mas a campanha de desinformação contra a comunidade migrante do Haiti está lançada. “Não é a primeira vez que somos vítimas de campanhas de desinformação, estigmatizados e desumanizados para servir a interesses políticos”, escreveu a chanceler haitiana, Dominique Dupuy, em carta pública. “Mais uma vez cabe a nós, juntos, levantarmos nossa voz e proclamarmos nossa humanidade.”

Antes, Dupuy já havia feito menção indireta ao caso ao compartilhar em seu perfil no X frases de Toni Morrison, escritora americana vencedora do prêmio Nobel em 1993. “A função do racismo é a distração. Ele impede você de fazer seu trabalho. Ele mantém você explicando, repetidamente, sua razão de ser”, dizia a passagem.

Quem também se manifestou foi Leslie Voltaire, outro membro do conselho presidencial que se formou a duras penas no Haiti para tentar dar início a uma saída da grave crise humanitária que a nação enfrenta com a pobreza e o domínio de gangues armadas locais.

“As recentes acusações de que os haitianos em Springfield consomem animais domésticos não são apenas infundadas, mas inaceitáveis”, disse ele. “Esta retórica visa injustamente a uma comunidade que, por meio do seu trabalho árduo, tem contribuído de forma consistente e significativa para a sociedade americana. Estas histórias correm o risco de dividir e pôr em perigo comunidades já vulneráveis.”

JD Vance, o candidato a vice de Trump, é senador por Ohio e há tempos intensificou seu discurso contra imigrantes. Ele foi a principal voz a ecoar a desinformação sobre os haitianos, até que na última segunda-feira (10) escreveu em seu perfil no X: “É possível, claro, que todos esses rumores sejam falsos.”

Mas questionado por uma jornalista da rede CNN após o debate de terça-feira sobre qual seria o objetivo de Trump ao ecoar à audiência uma informação falsa, disse apenas que “as autoridades locais não dizem que não é verdade, mas que não têm evidência”.

Mais de 852 mil haitianos vivem nos Estados Unidos, segundo o censo mais atualizado do país. Isso representa quase 10% da população que ainda reside em território haitiano. Cada vez mais imigrantes do país caribenho buscam os EUA para que, ao obter algum trabalho no país, possam enviar dinheiro a seus familiares que seguem na terra natal. Essas remessas são uma fatia de 16% do PIB haitiano.

Muitos desses imigrantes não tiveram como destino inicial os EUA, mas países como o Brasil ou o Chile. Nos últimos anos, haitianos em território brasileiro têm deixado o país para tentar chegar aos EUA por meio de rotas perigosas e por vezes mortais, como a selva de Darién, e ganhar em dólares, moeda forte das transações.

O The New York Times lembrou em reportagem recente que o discurso de Vance contra os imigrantes foi catapultado no ano passado, quando um acidente de trânsito envolvendo um motorista haitiano deixou uma criança que estava em uma van escolar morta.

O republicano abraçou e surfou no ressentimento de moradores, passando a apregoar mensagens como a de que os haitianos estão “drenando serviços públicos” e “causando caos” e que “a princípio, nem deveriam estar ali”.

A própria Casa Branca chamou os recentes comentários de racistas. O porta-voz John Kirby afirmou ser profundamente preocupante a “teoria da conspiração propagada no Partido Republicano para dividir as pessoas com base em mentiras e um elemento de racismo”.

O Haiti vive a mais grave crise humanitária das Américas. Mais da metade da população local está em situação de fome aguda. Em apenas três meses, de abril a junho, 1.400 pessoas foram mortas pela violência das gangues e outras 400 sequestradas, segundo os últimos dados da ONU.

A Polícia Federal (PF) do Brasil treinará os policiais haitianos a partir do fim deste ano, e uma missão de policiais liderada pelo Quênia está no país. A operação é financiada principalmente pelos EUA.

Fonte: Folha de São Paulo

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