Desde que depuseram a ditadura de Bashar al-Assad no último dia 8, rebeldes sírios têm tentado convencer o mundo de que são uma força política moderada e querem ser vistos como governo legítimo do país.
O chefe da HTS (Organização para a Libertação do Levante, na sigla em árabe) exemplifica bem essa mudança de imagem. Antes, ele usava barba longa e um turbante e se apresentava com o codinome Abu Mohammed al-Jolani. Agora, de barba mais curta e roupas militares, usa o nome real—Ahmed al-Sharaa—para tentar se afastar de seu passado radical.
Harmonie Toros, que leciona na Universidade de Reading, no Reino Unido, diz que o mundo não deveria estar se perguntando se a mudança de Sharaa é autêntica ou não. Em vez disso, precisa se questionar como incentivar esse e outros grupos a ampliar o processo de moderação.
“Essas organizações se moderam ou se radicalizam dependendo dos incentivos que têm diante de si”, afirma Toros, especialista em negociação com grupos armados não estatais. Na visão dela, isolar essas facções ou puni-las com sanções são contraproducentes no longo prazo.
O histórico de Sharaa depõe contra. A facção que ele lidera se chamava antes Jabhat al-Nusra. Era um braço da Al Qaeda ligado, inicialmente, ao EI (Estado Islâmico). Foi só em 2016 que ele rompeu os laços e mais tarde transformaria a Nusra em HTS.
Sharaa adotou uma perspectiva mais pragmática. O projeto do EI de construir um califado global por meio de atentados terroristas já estava ruindo. Sua organização preferiu um discurso nacionalista, voltado a derrubar Assad e reconstruir a Síria.
É difícil julgar a situação de imediato. Uma das coisas importantes, afirma Toros, é entender que organizações como a HTS não são homogêneas. Têm diferentes facções internas com interesses díspares. A comunidade internacional precisa apoiar, agora, aqueles que defendem a moderação.
Há precedentes de grupos que conseguiram, em alguma medida, criar novas narrativas e adentrar a política. Um exemplo são as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), que fizeram acordos de paz com o governo.
Isso não quer dizer que o mundo precise esquecer os atos de violência cometidos por grupos como a HTS, Toros diz. Mas é necessário manter o diálogo aberto e ter paciência. “Processos de paz levam bastante tempo. Vai demorar para construir novas instituições, após mais de cinco décadas de regime autoritário na Síria.”