O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, construiu seu caminho em direção à presidência em 2016 a partir da defesa e apoio à construção de um “grande e belo muro” ao longo da fronteira do país com o México. Neste ano, os rivais de Trump nas eleições primárias, em busca de qualquer vantagem contra ele, decidiram olhar para o norte.
Nikki Haley, ex-governadora da Carolina do Sul, enfatiza frequentemente aos eleitores que não é apenas a fronteira ao sul que precisa de reforço na fiscalização, mas a fronteira do norte também. Quando questionada se seus comentários significavam que ela apoiava a construção de um muro, ela disse: “Se for isso for preciso para mantê-los fora, faremos um muro, faremos qualquer tipo de patrulha de fronteira que precisarmos ter.”
O governador da Flórida, Ron DeSantis, que encerrou sua candidatura e declarou apoio a Trump no domingo (21), sugeriu recentemente a construção de um muro ao longo de alguns pontos considerados, na perspectiva dele, problemáticos da fronteira entre os EUA e o Canadá.
Vivek Ramaswamy desistiu da disputa na semana passada, mas não antes de ir com uma equipe de filmagem até Pittsburg, uma pequena cidade no estado de New Hampshire localizada logo abaixo da fronteira ente EUA e Canadá. Ele posteriormente recebeu críticas de jornalistas e comentaristas canadenses quando afirmou que os EUA não deveriam construir apenas um, mas dois muros.
A ideia de um muro ao longo da fronteira mais ao norte de New Hampshire, uma região isolada e de floresta, parece um pesadelo. Chip Jones, 74, um republicano e ex-chefe de bombeiros aposentado de Massachusetts, conversou sobre o assunto em uma entrevista em um restaurante local. “Um muro na fronteira em Pittsburg… isso simplesmente não parece certo.”
“Não parece”, respondeu Beverly Martin, 79, que também é republicana e lecionou economia doméstica por 18 anos na Pittsburg School. “Muitas pessoas em Pittsburg têm parentes em ambos os lados da fronteira, e pessoas das cidades fronteiriças no Canadá vêm aqui trabalhar.”
A fronteira ao sul do país tem se firmado na mente do eleitorado americano. A questão tem contribuído para os baixos índices de aprovação do presidente Joe Biden e tem ameaçado sua base de política externa. A questão também tem envolvido o Congresso, bem como sobrecarregado prefeitos e líderes locais que lidam com abrigos lotados e serviços sociais deficientes à medida que mais e mais famílias de migrantes são levadas de ônibus para cidades em todo o país.
O Partido Republicano fez apelos para acabar com as políticas de santuário, as quais determinam que o governo federal não pode obrigar as autoridades a atuarem na fiscalização da imigração, e defendeu repressões militarizadas aos cartéis de drogas e deportações em massa de pessoas que entraram nos Estados Unidos durante o governo Biden.
Os alertas republicanos sobre terroristas, criminosos e traficantes trouxeram destaque nacional para certos lugares, como a fronteira norte de New Hampshire, o que frustrou algumas pessoas que vivem lá. Ao contrário das comunidades hispânicas ao longo da fronteira entre os EUA e o México, eles não estão acostumados a serem uma parte tão proeminente do debate nacional sobre imigração.
Tal como as cidades fronteiriças ao sul, Pittsburg está localizada em uma terra que já foi ferozmente disputada: primeiramente entre franceses, britânicos e os nativos abenakis, e mais tarde entre britânicos e americanos. O Tratado de Paris, assinado em 1783 e que encerrou a Revolução Americana, deixou mal definida a linha divisória entre o que hoje é Québec e New Hampshire. Frustrados com a disputa, os moradores divididos entre duas nações estabeleceram seu próprio governo, a República do Riacho Indígena.
Em outubro de 2023, o governador de New Hampshire, Chris Sununu, que declarou apoio a Haley, e outras autoridades estaduais anunciaram um aumento nas patrulhas ao longo da fronteira. “A maioria dos deslocamentos vem da fronteira ao sul, mas a maioria dos deslocamentos de pessoas na lista de monitoramento de terroristas vem da fronteira ao norte”, disse Sununu em uma entrevista.
As estatísticas mais recentes com base na Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA mostraram que as detenções de pessoas que entraram ilegalmente na área que abrange New Hampshire, Vermont e partes do norte do estado de Nova York no ano passado atingiram os níveis mais altos em pelo menos 16 anos. Entre outubro de 2022 e setembro de 2023, os agentes detiveram 6.925 pessoas em situação irregular, um aumento em relação aos 1.065 registrados no mesmo período do ano anterior.
Na prefeitura de Pittsburg, Linda Clogston, cobradora de impostos e tesoureira da associação histórica local, trabalhou com líderes da comunidade e autoridades de ambos os lados da fronteira para instalar marcos comemorativos da República do Riacho Indígena e outros locais históricos. Ela afirmou que os moradores de Pittsburg pareciam mais preocupados com o aumento dos preços dos imóveis do que com quem estava atravessando a fronteira.
Na cidade, é possível ver evidências da “onda Trump”. Bandeiras e cartazes pró-Trump estão pendurados nas paredes de algumas casas e nos quintais. Na beira da uma estrada, havia uma placa “Build the Wall” (construa o muro) presa a uma árvore. Com a proximidade das primárias, a imigração foi citada por vários eleitores como uma das principais preocupações eleitorais, mas eles geralmente estavam se referindo à fronteira ao sul dos Estados Unidos.