Um grupo ligado ao bilionário Jorge Paulo Lemann pode influenciar decisões dentro do Ministério da Educação (MEC) envolvendo cerca de R$ 6,6 bilhões. A influência é resultado de um acordo fechado entre MEC e a ONG MegaEdu, financiada pelo empresário, para que a organização opine a respeito de políticas públicas de conectividade nas escolas do país.
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As informações foram divulgadas pelo jornal Estadão nesta segunda-feira (25) e antecedem o lançamento da Estratégia Nacional de Escolas Conectadas, marcado para terça-feira (26). O projeto também teve participação da MegaEdu.
Segundo a publicação do Diário Oficial da União (DOU), a parceria com o MEC foi firmada dia 14 de agosto, tem duração de 36 meses e “não envolve transferência de recursos entre os partícipes”.
No entanto, a reportagem sugere possível conflito de interesse, pois a MegaEdu teria sido levada para o ministério por uma colaboradora da Secretaria de Educação Básica que, “até semana passada, constava como integrante do comitê de especialistas do Centro Lemann, outra entidade do empresário”, informa o texto, ao citar que o nome da funcionária foi retirado após o Estadão questionar o MEC sobre a ligação das duas partes do acordo.
Além disso, a atuação do grupo não ocorre apenas no Ministério da Educação, pois a ONG também participa do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) — onde estão 40% dos recursos que o governo estima investir até 2026. O fundo pertence ao Ministério das Comunicações. Uma CEO da MegaEdu foi convidada para ser uma das 13 integrantes do comitê que prevê até R$ 2,7 bilhões para projetos de conectividade das escolas públicas, favelas e áreas rurais.
O Estadão ainda informa que a MegaEdu também estaria sendo chamada para opinar sobre o uso de outros R$ 3,1 bilhões de dinheiro privado que as operadoras de telefonia foram obrigadas a investir para arrematar faixas do leilão do 5G.
Ao jornal paulista, a MegaEdu respondeu que não há conflito de interesses, e a Fundação Lemann afirmou que a ONG tem reconhecimento e legitimidade para atuar junto ao governo federal. O MEC também foi procurado pelo periódico, mas não comentou a ligação com o empresário. A Gazeta do Povo entrou em contato com os envolvidos e aguarda retorno.
Espaço do grupo Lemann dentro do MEC aumentou após críticas de Lula
A MegaEdu foi aberta formalmente em outubro de 2022 e está diretamente ligada à Fundação Lemann – organização do bilionário brasileiro. Até mesmo o telefone registrado pela MegaEdu na Receita Federal é o mesmo da fundação, segundo a reportagem do Estadão.
Em fevereiro, o presidente Lula fez duras críticas a Lemann ao comentar o caso das Americanas, que entrou em recuperação judicial após um escândalo contábil vir à tona em janeiro deste ano. O empresário é um dos principais acionistas da companhia.
“Esse Lemann era vendido como o suprassumo do empresário bem-sucedido. Era o cara que financiava jovens para estudarem em Harvard para formar um novo governo. Falava contra a corrupção todo dia. E depois comete uma fraude que pode chegar a R$ 40 bilhões”, disse o petista em entrevista para a RedeTV. “Vai acontecer o que aconteceu com o Eike Batista. As pessoas vendem uma ideia que elas não são, na verdade”, prosseguiu, ao referir-se ao caso da Americanas.
O que chama a atenção, segundo o jornal, é que desde as críticas de Lula a Jorge Paulo Lemann, a MegaEdu só aumentou seu espaço na máquina do governo federal. Em janeiro, a ONG foi recebida no MEC. Nos meses seguintes, se reuniu diversas vezes com representantes da Secretaria de Educação Básica.
Em maio, a MegaEdu alcançou um assento no disputado conselho gestor do Fust, que estabelece “os critérios de seleção de propostas” que receberão recursos operacionalizados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em agosto, assinou o “acordo de cooperação” com o Ministério da Educação.
Ainda segundo a reportagem do Estadão, um dos estudos da MegaEdu foi aproveitado pelo governo até agora para uma proposta de ampliar o número de escolas atendidas com conexão à internet entre 2023 e 2024, ano eleitoral.
Ao Estadão, a MegaEdu disse a que a organização não tem fins lucrativos e seu “único foco é o social”. A associação informou ainda que trabalha com base em dados, “sem interesse comercial”, e que está fazendo estudos que amparem a discussão sobre quais critérios e parâmetros de conectividade de escolas permitem o uso pedagógico da internet.
“Em relação ao Conselho Gestor do FUST, a MegaEdu foi indicada por 17 organizações, que fazem parte de uma coalizão ampla da sociedade civil, para representá-los em 1 das 3 cadeiras reservadas para a sociedade civil”, registrou.
Já a Fundação Lemann informou que atua há mais de duas décadas “em temas que considera prioritários para o desenvolvimento do país, como a melhoria da educação pública”. A entidade defendeu a atuação da ONG, registrando que a MegaEdu “faz um trabalho relevante” no setor e que esse reconhecimento a legitima “a colaborar e firmar parcerias com diversas instituições, incluindo o governo federal e seus ministérios envolvidos na garantia do direito à aprendizagem e à conectividade”, finalizou a Fundação.