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Relativização do terrorismo gera conflitos em universidades do Brasil

O terrorismo do grupo Hamas contra Israel e a escalada de tensão no Oriente Médio têm reverberado no ambiente acadêmico brasileiro. Declarações de professores que relativizam o caráter terrorista do Hamas ou manifestam antissemitismo repercutiram, nos últimos dias, dentro e fora de universidades.

Na segunda-feira (16), a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) cancelou uma palestra online sobre o conflito no Oriente Médio com Fernanda de Melo, bacharel em Relações Internacionais, depois que ela comemorou a morte da brasileira Bruna Valeanu, que residia em Israel, via redes sociais. Dias antes, Fernanda havia ministrado uma aula pública na Universidade de São Paulo (USP), organizada pelo Comitê de Estudantes em Solidariedade ao Povo Palestino.

Na mesma aula, Fernanda estava acompanhada de outro palestrante, o professor de Relações Internacionais da PUC-SP Reginaldo Nasser, que, em uma entrevista recente ao Instituto Conhecimento Liberta, equiparou os atos terroristas do Hamas à forma como o Estado de Israel trata os palestinos. “Infelizmente, aconteceu com civis israelenses agora algo com que os palestinos convivem há 75 anos”, afirmou.

Outros casos recentes de professores com viés semelhante têm sido criticados nas redes sociais, como o da antropóloga Francirosy Barbosa, professora do curso de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo) no campus de Ribeirão Preto, que, após os atentados, manifestou em suas redes “apoio total à luta do povo palestino” e disse que a situação atual tem “um único culpado, o sionismo, que explora, mata, humilha os palestinos há décadas”. Ela é integrante de um grupo de trabalho para combater o “discurso de ódio e o extremismo” do atual Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

À Gazeta do Povo, a professora de Relações Internacionais Daniela Alves, diretora-executiva do Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais (CEIRI), relata preocupação quanto à manifestação de professores que relativizam o terrorismo. “Quais são os valores que eles estão passando para os alunos?”, questiona. “Há uma relativização de conceitos. Quando isso passa a ser defendido entre acadêmicos, isso também tem um reflexo no nosso sistema político e no nosso sistema jurídico. Porque a produção acadêmica influencia, também, as políticas públicas”, complementa.

Para Daniela, uma explicação possível para que a relativização do terrorismo tenha sido banalizada em universidades brasileiras – mesmo sendo vista como abjeta na sociedade brasileira como um todo – é a desconexão do ambiente acadêmico com a realidade do cidadão comum. Professores criam bolhas autorreferenciais e se descolam daquilo que, em outros contextos sociais, tende a ser senso comum.

“Dentro da academia, você se fecha em pequenos grupos, e precisa escolher qual é o grupo do qual você vai fazer parte. E esse grupo vai ficar se autocitando em livros e artigos praticamente a vida inteira”, observa. “Há alunos que saem da faculdade, em qualquer curso das ciências humanas, e já entram direto no mestrado. Não tiveram nenhuma vivência profissional fora disso, mas conseguem algum estágio como professor em algum lugar”, complementa.

Universidades ficam na defensiva após reação ao discurso anti-Israel

A reação nas redes sociais à relativização do terrorismo por professores universitários tem colocado as instituições de ensino na defensiva.

A UEPB, por exemplo, cancelou não só a presença de Fernanda de Melo, mas também o evento do qual ela seria palestrante. A palestra, intitulada “Entendendo o Conflito entre Israel e Palestina”, estava sendo organizada pelo Centro de Estudos em Política, Relações Internacionais e Religião (CEPRIR), que publicou em nota: “O debate será retomado em momento oportuno. Aproveitamos o ensejo para reforçar que o CEPIR não coaduna com qualquer tipo de intolerância ou racismo, e os mesmos não são aceitos das partes que o compõem”.

Na semana passada, a diretoria das Faculdades Ibmec orientou professores não especializados a evitar opinar sobre a guerra na imprensa. Só o coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec, o professor José Niemeyer, tem autorização para dar declarações públicas sobre o conflito em nome da instituição. O objetivo é evitar comentários inoportunos.

Fora do Brasil, os atentados terroristas também suscitaram polêmicas no ambiente universitário. A principal delas partiu da Universidade de Harvard, nos EUA, onde 34 associações estudantis da instituição de ensino assinaram uma carta afirmando que Israel é responsável pela escalada da violência no Oriente Médio.

O viés anti-Israel dos alunos não parece ser casual. O cientista político Adriano Gianturco recorda um relatório de 2022 da Middle East Studies Association – sociedade americana de pesquisadores especializada em Oriente Médio – que evidencia um viés anti-Israel em 80% dos professores membros.

“Mais que falar de percepções subjetivas e casos, menciono este estudo para mostrar dados empíricos, ou seja, não é algo casuístico, acidental, mas tem este dado. Isso nos Estados Unidos. Imagino que no resto do mundo seja pior ainda”, afirma.

Para ele, um ambiente acadêmico plural é importante, mas a busca pela diversidade de ideias não deve servir como pretexto para disseminar uma visão deturpada sobre o conflito em curso. “O ideal é um ambiente plural. Agora, uma coisa é Israel-Palestina, e outra coisa é Hamas”, comenta.

Professores midiáticos viram centro de polêmicas

As polêmicas no ambiente acadêmico também têm envolvido professores brasileiros com forte presença em meios de comunicação em temas relacionados a Oriente Médio.

Em artigo do dia 10 de outubro no jornal Folha de S.Paulo, Salem Nasser, doutor em Direito Internacional pela USP e professor da FGV-SP, criticou o uso da palavra “terrorista” para classificar o Hamas.

“A Folha pode chamar o Hamas de grupo terrorista para se manter fiel ao seu Manual, mas, para manter-se fiel ao mesmo Manual, precisaria se referir a Israel como um Estado terrorista e aos seus governantes como terroristas, de acordo com a sua própria definição. (…) se a Folha faz questão de abarcar, no modo como se refere ao Hamas, o que percebe como violações do direito humanitário, ou como crimes de guerra, ou, ainda, crimes contra a humanidade, eu recorreria a outra terminologia que não a de terrorista”, escreveu.

Um abaixo-assinado em repúdio ao artigo de Nasser publicado no site Change.org já tinha mais de 8.000 assinaturas na tarde da sexta-feira (20).

“O Professor Salem H. Nasser tem uma sólida formação acadêmica. Entretanto, o conhecimento pode ser utilizado para fazer o bem, ou para destruir. Hoje, convocamos a FGV, que é digna do nosso respeito, para que tome as medidas cabíveis para garantir a segurança de seus alunos e uma posição firme contra qualquer professor ou colaborador que se utiliza do nome da instituição para disseminar um discurso de ódio contra qualquer indivíduo ou minoria e para apoiar atos terroristas”, afirma o documento.

Outra controvérsia se originou na PUC-Rio, tendo como centro Michel Gherman, professor de Sociologia da UFRJ e pesquisador do Centro de Estudos do Antissemitismo da Universidade de Jerusalém. Em um debate com alguns professores sobre os atentados em Israel, estudantes judeus criticaram o posicionamento dos debatedores, inclusive de Gherman, que havia sido chamado para representar o lado judeu. Alunos e professores entraram em conflito, e alguns alunos judeus foram silenciados, como relata esta reportagem da Gazeta do Povo.

Fonte: Gazeta do Povo

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