Há notícias falsas sobre uma crise humanitária em Nagorno-Karabakh (Azerbaijão). A estrada de Lachin não está bloqueada, e não há intenção de fazer os armênios no Azerbaijão passarem fome. Mas a luta pelo poder entre os separatistas armênios dentro do Azerbaijão continua.
Senhores da guerra de um exército de 10 mil soldados que ainda está estacionado ilegalmente no Azerbaijão, um bilionário armênio da Rússia (que nunca viveu em Karabakh, mas que está na lista de sanções da União Europeia devido ao conflito na Ucrânia), e algumas outras personalidades ambiciosas —todos eles lutam para ser “presidente” da “segunda Armênia“.
Querem criar uma “segunda Armênia” às custas das terras azeris. Impossível. Não se cria um novo país simplesmente porque há uma comunidade étnica naquele território. O Brasil declarou claramente que apoia a integridade territorial do Azerbaijão em uma reunião do Conselho de Segurança da ONU de 15 de agosto, e incentivou na ocasião o uso da estrada Aghdam-Khankendi como uma conexão natural da região de Karabakh com o resto do Azerbaijão.
Há vários dias, o Crescente Vermelho do Azerbaijão —versão da Cruz Vermelha para países islâmicos— enviou 40 toneladas de farinha aos armênios em Karabakh. A entrada de caminhões ainda está bloqueada em Karabakh pelos separatistas armênios, que não permitem à comunidade armênia local receber a carga urgente.
Durante as negociações entre o presidente do Azerbaijão, o presidente do Conselho da UE e o primeiro-ministro da Armênia, as partes concordaram em considerar também esse caminho. Mas o regime separatista insiste em apenas uma estrada, que está ligada somente à Armênia.
O Azerbaijão não tem nada a esconder. O governo organizou uma viagem a Karabakh para embaixadores estrangeiros em 31 de agosto. E eles viram como aquela estrada permanecia bloqueada. Se existe uma verdadeira necessidade de alimentos, então por que tal assistência é negada? Se há um bloqueio intencional, por que se recusam a utilizar outras estradas?
Quanto aos apelos recentes feitos por Luis Moreno Ocampo, um ex-procurador do Tribunal Penal Internacional (TPI) não deveria pedir ao presidente Lula que culpasse o Azerbaijão. Ocampo talvez tenha feito um ótimo trabalho no passado. Mas também enfrentou alguns problemas, , que custaram a ele e ao TPI uma má reputação.
Ele diz que produziu “opinião legal independente” sobre o suposto “genocídio em curso”. O seu parecer foi elaborado a pedido de uma pessoa a quem se refere como “presidente de Artsakh”. Nem o Brasil nem nenhum país do mundo, incluindo a própria Armênia, reconhecem uma “República de Artsakh”. Pelo contrário, apoiou toda as quatro resoluções do Conselho de Segurança da ONU condenando a ocupação do Azerbaijão por Forças Armadas da Armênia.
Ocampo desenvolveu contatos muito estreitos com autoridades armênias desde as suas visitas ao país em 2010. Na época, ele se encontrou com um ex-líder dos separatistas armênios de Karabakh, um senhor da guerra, o ex-presidente Serzh Sargsyan, que até confessou há alguns anos por que massacraram a população inocente de Khojaly em 1992.
A relação especial de Ocampo com a Armênia é, portanto, um fato. Isso confirma o seu preconceito em relação ao Azerbaijão. Ocampo acha que o Brasil deveria apoiar o separatismo armado no mundo?
O relatório de Ocampo carece de credibilidade. Em 2017, a publicação alemã Der Spiegel divulgou os resultados de uma apuração realizada em conjunto com o Mediapart, site de jornalismo investigativo da França, dentro da rede EIC (European Investigative Collaborations, colaborações investigativas europeias).
Os documentos obtidos retratavam Ocampo como um corrupto, dono inclusive de algumas empresas em vários paraísos fiscais. Ele também teria participado de um acordo secreto com um bilionário de perfil duvidoso profundamente envolvido na guerra civil na Líbia. Ocampo ainda teria utilizado informações sigilosas para proteger seu cliente de um possível processo do TPI. Talvez sua carreira anterior tenha sido boa e famosa, mas ele depois traiu os ideais e o espírito da Corte.
Ocampo não se importa com as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, uma das quais foi adotada quando o Brasil presidia o órgão, em 1993, ou com a declaração feita por Brasília no mesmo fórum alguns dias atrás. Ele também não se importa com o tuíte de outubro de 2020 do atual presidente, Lula, no qual ele declarou claramente que, para resolver um conflito entre a Armênia e o Azerbaijão e dar assistência humanitária à população local, o direito internacional deveria prevalecer.
Lula sabia dos sofrimentos dos quase um milhão de refugiados azeris decorrentes da agressão da Armênia contra o Azerbaijão, dos massacres e atrocidades contra civis inocentes. Na ocasião, ele defendeu claramente o ponto crítico de que o conflito deve ser resolvido com base nas resoluções do Conselho de Segurança da ONU.