Em um momento em que a chegada de estrangeiros bate recordes em Portugal, um novo estudo identificou que, embora sejam pouco visíveis fora do ambiente virtual, grupos anti-imigração estão bem organizados e seguem em atividade no país.
“Existem mobilizações anti-imigração em Portugal e isso é um achado relevante, embora essa constatação já possa parecer óbvia para algumas pessoas”, diz a coordenadora do estudo, a brasileira Thais França, doutora em sociologia e pesquisadora do Iscte (Instituto Universitário de Lisboa).
“De forma geral, o discurso oficial em Portugal é de minimização desse fenômeno. Desde as políticas públicas, até manuais escolares e de turismo, tende-se a falar de Portugal sempre como um país aberto à diversidade e tolerante com a imigração”, explica.
Dados mais recentes indicam que a população estrangeira em Portugal, que tem cerca de 10,3 milhões de habitantes, chegou a quase 1,1 milhão de residentes legais. Já superando as 400 mil pessoas, a comunidade brasileira é, com folga, a maior entre os imigrantes.
A investigação para esse novo trabalho levou cerca de dois anos e integra um projeto de pesquisa europeu que mapeia movimentos contrários à presença de imigrantes.
Além de acompanhar as discussões dos participantes, a pesquisadora também conseguiu entrevistar de forma aprofundada alguns integrantes desses grupos. Segundo ela, não existe um perfil típico dos ativistas contra a imigração.
“São pessoas de perfis diversos, a maioria são homens, mas também há mulheres envolvidas”, detalha. Um ponto em comum, porém, é o fato de que essas pessoas são bem integradas à sociedade e distantes do estereótipo de isolamento social.
Segundo França, a maior parte dos integrantes tenta embasar seus posicionamentos em teorias bem determinadas, sobretudo ligadas à ultradireita, que evocam os supostos riscos e os malefícios do aumento dos estrangeiros residentes.
Ao contrário de alguns outros países europeus, onde manifestações anti-imigração já acontecem com alguma regularidade nas ruas, os grupos em Portugal têm agido principalmente online. Isso não exclui, no entanto, a possibilidade de que as ações possam extrapolar o ambiente virtual no curto prazo.
“Com o aumento das ferramentas de monitoramento sobre alguns discursos nas redes sociais, os grupos migraram para ambientes mais fechados e menos visíveis”, diz a responsável pelo estudo. Ainda assim, não é difícil encontrá-los. “Há comunidades no Telegram, por exemplo, com mais de 10 mil membros.”
O trabalho identificou diferentes graus de intolerância contra a imigração, mas com um ponto similar: a percepção de que, atualmente, Portugal vive uma imigração sem controle.
Existe, de maneira geral, a ideia de que a chegada de estrangeiros está pressionando os serviços públicos, como saúde e de educação, e contribuindo para a manutenção dos baixos salários no país.
“Uma das coisas que esses ativistas anti-imigração dizem é que, com o grande número de imigrantes, começa a haver um investimento muito alto do Estado para a integração dessas pessoas. Como, por exemplo, com a disponibilização de tradução nas escolas ou de comida halal [que segue preceitos para ser consumida para muçulmanos] nas cantinas”, exemplifica.
Na visão dos integrantes desses grupos, esse é um dinheiro que o governo poderia estar gastando com a população portuguesa.
Na avaliação da coordenadora do projeto, o aumento das queixas de xenofobia e de racismo não significa, necessariamente, que as pessoas que praticaram as agressões sejam integrantes de grupos organizados anti-imigração.
“O fato de haver mais casos de racismo e xenofobia com imigrantes não significa que essas pessoas sejam ativistas anti-imigração ou façam parte de uns grupos”, avalia. “Um grupo com uma agenda própria, com uma pauta, é muito diferente de pessoas que agem independente.”
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