Uma pesquisa divulgada nesta semana revelou que somente 35% dos dirigentes dos principais órgãos da ONU são pessoas não brancas. O estudo, divulgado às vésperas do início dos discursos de líderes na Assembleia-Geral das Nações Unidas, aponta para a necessidade de reformas na estrutura administrativa da organização multilateral.
A Plataforma Cipó, um think tank brasileiro, fez levantamentos de políticas relacionadas à diversidade e inclusão em dez dos principais escritórios das Nações Unidas. Desde 2007, quando Ban Ki-moon assumiu a secretaria-geral da organização, os comissariados registraram 31 lideranças. Destas, 20 são pessoas brancas: 14 homens e 6 mulheres.
Maiara Folly, diretora-executiva da plataforma responsável pela pesquisa, afirma que o estudo fornece um alerta importante para todo o sistema ONU, já que o viés da diversidade é essencial para o trabalho. Segundo ela, “para que o multilateralismo e as Nações Unidas consigam ser eficazes em cumprir a missão de estabelecer um mundo mais igual, sustentável e pacífico, o sistema também precisa ser mais diverso e representativo acerca da diversidade mundial“.
O pesquisador Nycolas Candido, um dos responsáveis pelo estudo, diz que o levantamento levou em consideração as “origens culturais e geográficas” das lideranças da organização.
A partir da análise obtida, os pesquisadores notaram que as principais posições não foram ocupadas por profissionais de origem latina, indígena ou do Sudeste Asiático em nenhum mandato.
O estudo foi feito em parceria com a Blue Smoke, uma aliança de organizações que atua para aumentar a transparência e a inclusão no sistema ONU. Representantes da Cipó participaram das discussões da Cúpula do Futuro, realizada no domingo (22), em Nova York, onde o presidente Lula fez seu primeiro discurso durante a viagem diplomática.
Segundo o presidente brasileiro, o Pacto para o Futuro, documento assinado por líderes de 193 países, representa uma direção a ser seguida, mas ainda carece de “ambição e ousadia” para os próximos passos.
A posição defendida por Lula faz coro à conclusão da pesquisa. Segundo o presidente, “o Sul Global [termo não oficial usado para se referir a nações em desenvolvimento] não está representado de forma condizente com seu atual peso político, econômico e demográfico” nas entidades que compõem as Nações Unidas.
O documento ainda sugere, entre outras ações, medidas de combate ao monopólio de alguns países nas lideranças da organização. Para o cargo de secretário-geral, autoridade máxima da ONU, fica definida a “necessidade de que o processo de seleção e nomeação seja guiado pelos princípios de mérito, transparência e inclusão”.Também menciona a disparidade de gênero, afirmando ser imperativo levar em consideração “o fato lamentável de que nunca houve uma mulher secretária-geral”.
O documento define a mesma necessidade de critérios para a seleção dos cargos de alta liderança dos escritórios das Nações Unidas. Para Maiara, “o próximo passo é justamente atuar para a implementação dos compromissos acordados e para que as recomendações sejam realizadas”.
O estudo faz quatro recomendações para as Nações Unidas. Elas envolvem coletar e publicar de forma transparente dados desagregados por raça; desenvolver processos de recrutamento e promoção racialmente sensíveis; integrar considerações raciais em todas as políticas de diversidade, equidade e inclusão da ONU; e, por fim, obrigar todas as entidades a desenvolver planos antirracismo com objetivos, metas e prazos de implementação específicos.
Nycolas reitera que os órgãos da ONU precisam de medidas antirracistas e contrárias à desigualdade de gênero. “Eu acredito que nós precisamos de trabalhos baseados em evidência e com recomendações práticas para transformar essa iniciativa em política completa e sistematizada”, afirma. O levantamento foi supervisionado pela pesquisadora Beatriz Mattos.