No início deste ano eleitoral nos Estados Unidos, com Donald Trump liderando a corrida para ser o candidato presidencial republicano, os americanos devem parar para considerar o que significaria um segundo mandato de Trump para o nosso país e para o mundo e pesar a séria responsabilidade que esta eleição coloca sobre seus ombros.
Neste momento, a maioria dos eleitores americanos não deve ter ilusões sobre quem é Trump. Durante seus muitos anos como incorporador imobiliário e personalidade televisiva, e depois como presidente e figura dominante no Partido Republicano, Trump demonstrou um caráter e temperamento que o tornam totalmente inadequado para um alto cargo.
Como presidente, ele exerceu o poder de forma descuidada e muitas vezes cruel, colocando seu ego e suas necessidades pessoais acima dos interesses de seu país.
Agora, enquanto faz campanha novamente, seus piores impulsos permanecem tão fortes quanto antes —encorajar a violência e a ilegalidade, explorar o medo e o ódio em busca de ganhos políticos, minar o Estado de Direito e a Constituição, aplaudir ditadores— e estão se intensificando enquanto ele tenta recuperar o poder. Ele planeja retaliação, com a intenção de escapar das restrições institucionais, legais e burocráticas que o limitaram em seu primeiro mandato.
Nosso objetivo no início do novo ano, portanto, é emitir um aviso.
Os quatro anos de Trump na Casa Branca causaram danos duradouros à Presidência e à nação. Ele aprofundou as divisões existentes entre os americanos, deixando o país perigosamente polarizado; rebaixou o discurso público a tal ponto que muitos americanos se acostumaram com mentiras, insultos e ataques pessoais nos mais altos níveis de liderança. Seu desprezo pelo Estado de Direito levantou preocupações sobre a estabilidade de longo prazo da democracia americana, e sua falta de bússola moral ameaçou corroer os ideais de serviço nacional.
A República resistiu ao mandato de Trump por uma variedade de razões: sua falta de agenda preparada, as perturbações da pandemia de Covid-19 e os esforços de funcionários que tentaram moderar suas demandas mais perigosas ou irracionais. Mais importante, ela sobreviveu por causa das pessoas e instituições em sua administração e no Partido Republicano que se mostraram fortes o suficiente para resistir aos seus esforços de minar a transferência pacífica de poder.
É instrutivo, após esse governo, ouvir os julgamentos de alguns desses funcionários sobre o presidente que serviram.
John Kelly, chefe de gabinete de Trump, o chamou de “a pessoa mais falha” que já conheceu, alguém que não conseguia entender por que os americanos admiravam aqueles que sacrificaram suas vidas em combate. Bill Barr, que atuou como procurador-geral, e Mark Esper, ex-secretário da Defesa, disseram que Trump repetidamente colocou seus próprios interesses acima dos interesses do país.
Mesmo o mais leal e conservador de todos eles, o vice-presidente Mike Pence, que tomou a posição que ajudou a provocar a insurreição de Trump e seus seguidores em 6 de janeiro de 2021, percebeu. “Naquele dia, o presidente Trump também exigiu que eu escolhesse entre ele e a Constituição”, disse ele.
Não haverá pessoas como essas na Casa Branca se Trump for reeleito. O ex-presidente não tem interesse em ser contido, e ele se cercou de quem deseja institucionalizar a doutrina Maga (sigla para Make America Great Again, ou faça a América grandiosa novamente, slogan da campanha de Trump).
De acordo com reportagem dos jornalistas do New York Times Maggie Haberman, Charlie Savage e Jonathan Swan, Trump e seus aliados ideológicos têm planejado um segundo mandato de Trump há muitos meses. Sob o nome de Projeto 2025, uma coalizão de organizações de direita produziu um manual extenso e recrutou milhares de possíveis nomeados em preparação para um ataque total às estruturas do governo americano e às instituições democráticas que atuaram como freios ao poder de Trump.
O projeto se conecta com os planos de Trump e seus apoiadores de dar uma nova classificação a dezenas de milhares de servidores federais para que eles possam ser demitidos se não aderirem completamente à agenda de Trump. Ele também planeja retirar a independência do Departamento de Justiça e usá-lo para se vingar daqueles que, em sua visão, falharam em criar sua vitória nas eleições de 2020 ou não apoiaram suas demandas inconstitucionais. Trump ainda ameaça encontrar maneiras de usar tropas federais contra aqueles que protestem contra suas políticas.
Essas ambições demonstram que os anos fora do cargo e os crescentes desafios legais que ele enfrenta apenas aguçaram seus piores instintos.
Trump sofreu dois impeachments e, desde que deixou o cargo, foi acusado em quatro casos criminais —dois relacionados aos seus esforços para reverter as eleições de 2020, um por pagamento de dinheiro para silenciar uma estrela pornô e outro por reter documentos sigilosos após deixar o cargo e obstruir os esforços do governo para recuperá-los.
Nenhum outro presidente em exercício ou ex-presidente jamais foi indiciado por acusações criminais. Trump não apenas não mostrou remorso por essas ações, mas também não deu nenhum sinal de que entende essas acusações como qualquer coisa além de uma cruzada política destinada a miná-lo. Ele continua a afirmar que a insurreição de 6 de janeiro foi mal representada, por exemplo. “Havia amor e união”, disse em uma entrevista em agosto. Ele também sugeriu que, se reeleito, poderia usar seus poderes presidenciais para se anistiar.
As incursões de Trump nos assuntos estrangeiros continuam perigosamente equivocadas e incoerentes. Durante seu mandato, ele demonstrou admiração consistente por líderes autocráticos —incluindo Xi Jinping, Vladimir Putin e Kim Jong-un— e desprezo por nossos aliados democráticos.
Enquanto estava na Casa Branca, Trump repetidamente ameaçou deixar a Otan, aliança fundamental para a estabilidade da Europa que ele vê apenas como um dreno dos recursos americanos. Agora, seu site de campanha diz, sem dar detalhes, que ele planeja “finalizar” o processo de “reavaliação fundamental do propósito e da missão da Otan”.
Ele anunciou sua intenção de abandonar a Ucrânia, deixando o país e seus vizinhos vulneráveis a mais agressões russas. Encorajados por um presidente americano, líderes que governam com mão de ferro Hungria, Israel, Índia e outros lugares enfrentariam muito menos pressão moral ou democrática.
Trump deixou clara sua convicção de que apenas “perdedores” aceitam restrições legais, institucionais ou mesmo constitucionais. Ele prometeu vingança contra seus oponentes políticos, a quem chamou de “vermes” e ameaçou executar. Isso é particularmente perturbador em um momento de preocupação crescente com a violência política, com ameaças aumentando contra autoridades eleitas de ambos os partidos.
Reeleger Trump representaria sérios perigos para nossa República e para o mundo. Este não é um momento para ficar de fora, mas para se implicar novamente. Apelamos aos americanos que deixem de lado suas diferenças políticas, queixas e filiações partidárias e que considerem —como famílias, paróquias, conselhos e clubes e como indivíduos— a verdadeira magnitude da escolha que farão em novembro.