O presidente de Bangladesh, Mohamed Shahabuddin, dissolveu nesta terça-feira (6) o Parlamento e indicou o Nobel da Paz Muhammad Yunus como líder de um governo interino até que novas eleições sejam realizadas. A decisão ocorre um dia depois que a primeira-ministra Sheikh Hasina renunciou e fugiu do país após protestos liderados por estudantes que deixaram mais de 400 mortos.
Yunus tem 84 anos, é economista e foi agraciado com o prêmio Nobel em 2006 por ter criado um sistema de microcréditos para pobres. Ainda não se sabe por quanto tempo ele governará o país —as eleições não tem data marcada.
A indicação de Yunus foi uma exigência do movimento estudantil, que convocou os grandes protestos que abalam a nação desde o início de julho e havia exigido a dissolução do Parlamento. Os estudantes também pedem a convocação de eleições em um prazo de três meses.
Os militares tomaram o controle do governo do país de 171 milhões de habitantes na segunda-feira (5), depois que a primeira-ministra renunciou ao cargo após mais de um mês protestos violentos.
Pelo menos 113 pessoas morreram nos violentos confrontos nesta segunda, o dia mais mortal desde o início das manifestações em julho. A primeira-ministra Hasina, 76, fugiu para o exterior depois de governar o país de maioria muçulmana por 15 anos.
Os protestos deixaram pelo menos 413 mortos desde o início de julho, segundo balanço mais recente da AFP baseado em informações divulgadas pela polícia, autoridades e fontes médicas.
O governo dos Estados Unidos ordenou que pessoal não essencial, diplomatas e suas famílias deixem Bangladesh. A embaixada em Daca mantém atividades básicas com capacidade limitada. No mês passado, os americanos alertaram seus cidadãos sobre riscos de distúrbios civis, criminalidade e terrorismo no país asiático.
As manifestações começaram após a reintrodução de um polêmico sistema de cotas que reservava boa parte dos empregos públicos para famílias que estiveram envolvidas na luta por independência de Bangladesh nos anos 1970. Hasina foi acusada de usar o aparato estatal para permanecer no poder.
Sua rival política, a ex-primeira-ministra e líder da oposição Khaleda Zia, foi libertada nesta terça-feira, depois de passar anos em prisão domiciliar, informou o porta-voz do BNP. A soltura, consequência direta da renúncia de sua inimiga Hasina, foi um pedido do presidente Shahabuddin, que ordenou ainda a libertação de outras pessoas detidas durante os protestos que provocaram a queda da primeira-ministra.
“Ela [Zia] já está livre”, declarou A.K.M. Wahiduzzaman, porta-voz do BNP, um dia após a renúncia de Hasina. Zia, 78, foi condenada em 2018 a 17 anos de prisão por corrupção. A política de oposição também passou um período internada.
Hasina, acusada em janeiro de fraude nas eleições, pousou em uma base militar perto de Nova Déli, segundo a imprensa indiana. Mas uma fonte de alto escalão do governo afirmou que ela estava apenas em uma escala, pois seu objetivo é viajar para Londres.
O governo britânico solicitou, no entanto, uma investigação na ONU (Organização das Nações Unidas) dos “níveis inéditos violência” empregados em Bangladesh, o que provoca dúvidas sobre a viagem de Hasina até a capital do Reino Unido.
Em um comunicado, o principal sindicato da polícia pediu perdão por ter atirado contra os estudantes. A organização afirma que os policiais foram obrigados a “abrir fogo” contra os jovens e que, depois, foram “apresentados como os vilões”. Também anunciou uma greve para garantir a segurança dos agentes.
O comandante do Exército, general Waker-Uz-Zaman, deve se reunir com os líderes do movimento estudantil. Na segunda-feira, ele prometeu reparar “todas as injustiças” e suspender o toque de recolher no país. Também anunciou a formação de um governo interino.
Foi então que Asif Mahmud, um dos principais líderes do grupo Students Against Discrimination (estudantes contra a discriminação), citou o prêmio Nobel como opção de governo interino. “Confiamos no doutor Yunus”, escreveu no Facebook.
Na segunda-feira à noite, o presidente Shahabuddin ordenou a libertação das pessoas detidas durante as manifestações. Milhões de bengaleses lotaram as ruas de Daca, a capital.
Os manifestantes invadiram o Parlamento e incendiaram canais de televisão. Algumas pessoas derrubaram estátuas do pai de Hasina, Sheikh Mujibur Rahman, que liderou a luta pela independência contra o Paquistão em 1971.
Centenas de casas, negócios e templos hindus foram vandalizados, preocupando a Índia. Hindus representam 8% da população de Bangladesh e historicamente apoiam o partido Liga Awami de Hasina.