Tarde de sexta na China, e a mídia ainda esperava sair o obituário oficial no telejornal noturno da CCTV, para rememorar adequadamente Li Keqiang, primeiro-ministro por uma década, até março deste ano.
A morte havia sido anunciada no telejornal da quinta com a chamada que correu o país, “O camarada Li Keqiang faleceu”, mais a informação de que “foram feitos todos os esforços” para ressuscitá-lo, após ataque do coração.
Hu Xijing, ex-editor e hoje colunista do Global Times, reproduziu na plataforma Weibo o vídeo da CCTV e escreveu apenas: “Que choque, profundas condolências”. O site da Caixin, publicação financeira próxima do ideário liberalizante de Li, levantou fotos de sua trajetória e um perfil que a revista havia publicado dez anos antes.
O obituário saiu na noite de sexta, afinal, e foi reproduzido por toda parte. Foi elogioso e sucinto: “Li foi exaltado como um excelente membro do PCC. Um soldado comunista leal e testado pelo tempo e um notável revolucionário proletário, estadista e líder do partido e do estado”.
Em mídia social, por Weibo, WeChat e Douyin, o TikTok chinês, a reação foi bem mais ampla e emotiva. Ele foi lembrado como “o premiê do povo”, por seu comportamento mais informal e empatia, na abordagem de episódios graves como os efeitos de um terremoto na província de Sichuan, que visitou logo que assumiu.
Fechando a sexta-feira, o tópico “O camarada Li Keqiang faleceu” superava 1,8 bilhão de visualizações no Weibo e encabeçava o Douyin, segundo o monitoramento Whatsonweibo. Entre os comentários dos netizens, como são chamados os usuários do país, “É tão repentino”, “É difícil acreditar” e “Descanse em paz, nosso respeitado premiê”.
Uma das passagens citadas foi sua reação, no ano passado, ao caso de uma mulher encontrada acorrentada em Xuzhou. Cobrou punição pesada e criticou a violação dos direitos femininos não só na região, a meio caminho entre Pequim e Xangai, mas em outras pela China. Também foi lembrada a sua visita a Wuhan, no início da pandemia, em janeiro de 2020.
No WeChat, mais sóbrio e político do que Weibo e Douyin, um texto citou uma fala atribuída a Li numa reunião do Conselho de Estado no início do ano: “O poder do governo vem do povo. As políticas devem ser executadas de maneira que corresponda às expectativas popular”.
Outro reproduziu sua resposta, numa conversa com jornalistas estrangeiros também neste ano, ao ser questionado quanto às pressões de Pequim sobre empresas privadas: “Posso falar com firmeza que a China vai se abrir. As águas do rio Yangtze e do rio Amarelo não vão reverter seu fluxo”.
Foi também esse o tom de personalidades chinesas que escreveram na plataforma X. Wang Xiangwei, ex-editor e hoje colunista no South China Morning Post, postou que “ondas de tristeza estão varrendo as redes sociais da China após o anúncio chocante”.
“Um momento de risco para a liderança chinesa num tempo de incerteza, em que se prepara uma sessão plenária crucial do PCC nas próximas semanas”, avaliou. “A julgar pela história recente, a morte súbita de um líder pode ser um catalisador de mudança. Dias após a morte de Jiang Zemin, em novembro, a Covid Zero foi suspensa.”
Advogado como Li, Tao Jingzhou, que foi seu colega de turma na Universidade de Pequim, publicou uma foto do primeiro-ministro correndo e olhando o relógio, tratando-o pelo nome pessoal: “Keqiang nos deixou para sempre. Foi um homem que nunca podia fazer uma pausa. Dedicou a sua vida a servir o país”.