O Congresso da Argentina começa a se movimentar depois de ter recebido, nesta quarta-feira (27), um megaprojeto de lei apelidado de “lei ônibus” enviado pelo presidente ultraliberal Javier Milei que propõe uma abrangente reforma do Estado. Ao mesmo tempo, o governo se articula para discutir texto no fim de janeiro, mesmo período em que uma greve geral foi convocada por um dos sindicatos mais influentes do país.
Para o presidente da Câmara de Deputados, Martín Menem, a intenção é que sejam definidos em breve os integrantes das comissões em que o projeto será tratado com o objetivo de começar a trabalhar já na próxima semana os principais temas. Menem, sobrinho do ex-presidente Carlos Menem e apadrinhado por Milei, integra o partido governista A Liberdade Avança.
Intitulado “Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos”, o documento proposto por Milei ganhou o apelido de “lei ônibus” por transitar por vários setores. O projeto, com 664 artigos, propõe uma abrangente reforma do Estado, a eliminação das eleições primárias, mudanças no âmbito penal e desregulamentação da economia, entre outros pontos.
Nesta quinta (28), um dos sindicatos de trabalhadores mais influentes na Argentina, a Confederação Geral do Trabalho (CGT), convocou uma greve nacional para 24 de janeiro como reação ao projeto. Em comunicado, a CGT afirma que também solicitou reuniões com legisladores que deverão discutir o projeto em sessões extraordinárias. Será mais uma de várias manifestações contra a agenda de Milei, incluindo um protesto nesta quarta (27) contra o “megadecreto” do presidente que vai modificar ou revogar mais de 300 leis no país e deve entrar em vigor nesta sexta-feira (29).
Segundo informações publicadas pelo jornal Clarín, a intenção do partido governista é que o projeto de “lei ônibus” passe por apenas quatro comissões: Orçamento, Legislação Geral, Assuntos Constitucionais e Relações Exteriores. Porém, membros do kirchnerismo já se manifestaram dizendo que a proposta deveria transitar por ao menos 25 das 46 comissões –outros deputados da oposição limitaram esse número a uma dezena.
A coalizão de Javier Milei, A Liberdade Avança, detém apenas 37 dos 257 deputados e 7 dos 72 senadores. A maior força, que continua sendo o peronismo e o kirchnerismo por meio da aliança Frente de Todos, vem demonstrando clara oposição de suas bancadas.
O projeto enviado ao Congresso provoca tensões não apenas em torno de quais comissões deve envolver, mas também pela intenção do governo de começar a discuti-lo em plenário em 25 de janeiro.
De acordo com o Clarín, representantes da oposição afirmam ser impossível discutir o mega pacote até essa data e cobraram do governo que defina prioridades.
“Acredito que a prioridade hoje é resolver a situação econômica. Por isso, vamos trabalhar para debater esses temas de maneira profunda. O presidente precisa definir prioridades porque a lei é muito abrangente, disse Paula Oliveto, deputada pela Coalición Cívica.
Além disso, o documento carrega temas controversos como a delegação de poderes extraordinários ao Poder Executivo, algo já solicitado por gestões anteriores, mas sem sucesso. Um dos capítulos da “lei ônibus” declara “emergência pública em questões econômicas, financeiras, fiscais, previdenciárias, de segurança, de defesa, tarifárias, energéticas, de saúde, administrativas e sociais até 31 de dezembro de 2025”.
Entre os outros pontos polêmicos estão restrições a protestos e bloqueios de vias, a revogação das eleições primárias (chamadas de Paso, em que argentinos são convocados a escolher os políticos que concorrerão nas eleições de fato) e a autorização para o Executivo privatizar as empresas estatais, entre elas Aerolíneas Argentinas, YPF e o Banco Nación.
De acordo com informações do Clarín, depois de chegar à Câmara de Deputados o projeto deve ser encaminhado às comissões que vão emitir pareceres depois de debaterem temas específicos –permitindo, então, que seja discutido em plenário. Em situações de emergência, um projeto pode ser discutido em plenário sem ter passado previamente pelas comissões, mas para isso é necessário uma maioria especial de dois terços dos presentes.
Após a aprovação da Câmara dos Deputados, o projeto deverá ser enviado ao Senado, onde a proposta também deve seguir o mesmo percurso da Câmara de Deputados, passando por comissões que terão que emitir parecer para então levá-lo ao plenário.
O Senado, então, discute a proposta em plenário, onde será submetida a uma votação em geral e, em seguida, a uma votação em particular para cada artigo. Se a lei for modificada, deverá retornar à Câmara de Deputados. Os artigos que exigem maioria absoluta são os eleitorais, os relacionados a partidos políticos e alguns tributários.