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México: Massacre de Ayotzinapa faz país sangrar há 10 anos – 21/09/2024 – Sylvia Colombo

Dona Brígida vivia na parte dos fundos de uma casa no povoado de El Pericón, no estado de Guerrero, no sul do México. Em 2014, aos 83 anos, já não saía muito dali, mas era visitada pelo filho e pelos netos com frequência.

Até que um deles, Alexander Mora Venancio, então com 21 anos, deixou de aparecer. Brígida perguntava por ele, mas os familiares desconversavam, diziam que Alexander estava muito ocupado com os estudos em Ayotzinapa, a poucos quilômetros dali. Ela contou à Folha que tinha muito orgulho do neto, que ele sonhava em ser professor.

A mentira bondosa foi contada todos os dias até a morte de Dona Brígida, quatro anos depois. Enquanto isso, seus parentes, que viviam na parte da frente da casa, ergueram um altar, bem ao estilo mexicano, com fotos do rapaz, notícias de jornal e cartazes pedindo justiça.

Alexander era um dos 43 estudantes que havia desaparecido em 26 de setembro de 2014, mergulhando o país numa onda de revolta e expondo mundialmente a tragédia da violência mexicana, que até hoje já conta com mais de 120 mil desaparecidos.

O sumiço dos 43 estudantes de Ayotzinapa completa agora dez anos, sem uma conclusão clara e sem Justiça. Ocorreu no governo de Enrique Peña Nieto (Partido Revolucionário Institucional), atravessou o de Andrés Manuel López Obrador (Morena) e chegará ao início da gestão de sua sucessora, Claudia Sheinbaum (mesmo partido), que tem início em 1º de outubro.

A tragédia de Ayotzinapa causou imenso desgaste a Peña Nieto, embora as principais razões dela estivessem relacionadas à corrupção de autoridades, cartéis de narcotráfico e forças de segurança locais.

Os estudantes viajavam em quatro ônibus para participar de uma manifestação política contra o então prefeito da cidade de Iguala. No caminho, foram interceptados pela polícia do município, que disparou contra eles e matou seis no local. Apenas um dos ônibus foi encontrado. Os demais, assim como seus 43 passageiros, jamais apareceram.

Peña Nieto tentou abafar a crise rapidamente, enquanto uma multidão saiu às ruas em todo o país em protesto. Sem investigação suficiente, o governo anunciou que os estudantes haviam sido mortos pelo cartel local Guerreros Unidos, por terem sido confundidos com membros de outro cartel, o Los Rojos, e que seus corpos haviam sido incinerados num lixão próximo do vilarejo de Cocula.

A versão, porém, logo caiu por terra, principalmente depois que especialistas forenses estrangeiros concluíram que não havia sinais de uma fogueira daquelas proporções no local indicado, muito menos restos mortais do grupo de jovens.

A hipótese mais corrente uma década depois gira em torno de um conluio que envolveu a autoridade local, o cartel, a polícia e também o Exército nacional, razão pela qual houve pressa em camuflar o episódio. Esta versão, porém, carece das evidências necessárias para que se realizem um julgamento e as condenações devidas.

Nas últimas semanas, Sheinbaum se reuniu com os familiares das vítimas, mas não avançou muito em propostas para resolver o tema. No México de hoje, há mais de 2.000 valas coletivas, muitas delas descobertas pelo esforço de patrulhas de familiares que saem a buscar seus seres queridos.

Se deseja atacar o doloroso problema que faz o México sangrar há mais de 20 anos, a nova presidente terá de apresentar uma solução mais eficiente no enfrentamento do narcotráfico e da corrupção.


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Fonte: Folha de São Paulo

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