Em um protesto contra o desaparecimento de 43 estudantes no México, um grupo de manifestantes derrubou uma das portas da sede do governo nesta quarta-feira (6), quando o presidente Andrés Manuel Lopez Obrador participava de uma entrevista coletiva no interior do palácio.
Para derrubar a porta, os manifestantes usaram uma caminhonete branca da Comissão Federal de Eletricidade, a empresa estatal de energia. Cinco janelas foram quebradas e, em uma delas, os manifestantes escreveram: “só queremos um diálogo”.
A polícia usou gás lacrimogêneo para dispersar o grupo e fez uma espécie de barreira dentro da sede do governo a fim de evitar qualquer invasão. Segundo a agência de notícia Reuters, nenhum manifestante entrou no palácio, mas alguns dos envolvidos na derrubada da porta foram detidos, informou a mídia local
Questionado sobre o incidente durante a entrevista coletiva, o presidente mexicano disse que não iria reprimir o protesto e que o governo continuaria a investigar o caso dos estudantes desaparecidos. “A porta será consertada, e não haverá problemas, mas o que eles querem é provocar”, disse Obrador.
Sem apresentar provas, o presidente mexicano afirmou que os manifestantes estavam sendo manipulados por grupos de direitos humanos contrários a seu governo. AMLO, como ele é chamado, também atacou os advogados representantes das famílias, argumentando que eles proibiam os pais dos estudantes desaparecidos de ter contato com o governo.
Em sua página no X, o Centro de Direitos Humanos Miguel Agustín Pro Juárez (Prodh), que representa as famílias dos estudantes desaparecidos, explicou que os pais e mães não são manipulados, afirmou que o protesto de alguns jovens tem se transformado em ações que a organização desaprova e pediu o restabelecimento de um diálogo respeitoso, supervisionado por órgãos internacionais de direitos humanos.
O desaparecimento dos 43 estudantes completa dez anos eem 2024 e é até hoje um crime sem solução. Em 26 de setembro de 2014, os jovens da Escola Normal Rural de Ayotzinapa viajavam em direção a Cidade do México, até que a polícia da cidade de Iguala, no estado de Guerrero, desviou os ônibus dos estudantes e, em meio à interceptação, houve um tiroteio e nove pessoas morreram no local.
Meses depois, equipes forenses internacionais encontraram o corpo do estudante Alexander Mora Venancio, identificado a partir de um fragmento de osso e de um dente, segundo seu pai, e de Jhosivani Guerrero de la Cruz.
Diante do anseio por respostas e a demora do governo em realizar investigações para entender o que aconteceu, o México foi tomado por protestos que pediam a renúncia do então presidente Enrique Peña Nieto (PRI).
“O governo contava com o fato de que tantas tragédias envolvendo narcotráfico já eram tão comuns e correntes no México, que não reagiu rápido, até que percebeu que as câmeras e olhares do mundo inteiro estavam direcionados para cá”, disse à Folha, em 2018, Ioan Grillo, jornalista britânico radicado no México e autor de livros sobre violência.
A investigação do governo mexicano apontou que os estudantes foram sequestrados e mortos pelo cartel Guerreiros Unidos, no lixão da cidade de Cocula. Os narcotraficantes, segundo a investigação local, teriam sido acionados pelo então prefeito de Iguala e sua mulher, sendo estes dois últimos presos em novembro de 2014. Além disso, conforme apontaram investigações independentes, o próprio Exército mexicano estaria envolvido no caso.
Apesar dos direcionamentos que as investigações proporcionaram, não se sabe exatamente o papel que o ex-prefeito e sua mulher desempenharam no crime, ou de que forma o Exército se relaciona a ele, nem a causa da morte dos estudantes, em sua maioria, adolescentes. A hipótese dos corpos terem sido queimados foi descartada por um relatório de forenses estrangeiros, já que eram muitos e nenhum vestígio foi encontrado.
Ao longo dos anos, segundo os representantes das famílias, houve uma quebra de diálogo entre o governo do México e os pais dos estudantes devido à substituição dos responsáveis pelo caso. Para alguns grupos de direitos humanos, há uma certa indiferença do atual presidente em relação às manifestações daqueles que clamam por respostas.