O presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou nesta quarta-feira (10) que “ninguém ganhou” as eleições legislativas realizadas no domingo (7) na França, onde a esquerda ficou em primeiro lugar, mas não obteve maioria absoluta. O líder pediu que o país seja governado por uma ampla coalizão de forças políticas que compartilhem de “valores republicanos” —ou seja, excluindo a ultradireita.
Em carta aberta publicada na imprensa francesa, Macron fez um apelo “a todas as forças políticas que se identificam com as instituições republicanas, o Estado de Direito, o parlamentarismo, a orientação europeia e a defesa da independência da França” a fim de que se construa “uma maioria sólida, necessariamente plural, para o país”.
A votação, que Macron convocou de surpresa após a vitória significativa da ultradireita nas eleições europeias em junho, lançou a França em território desconhecido, com três blocos politicamente divergentes e sem um caminho óbvio para formar um governo. Nenhum partido ou coalizão obteve maioria absoluta, de 289 deputados, na nova Assembleia Nacional.
O apelo de Macron por uma aliança com valores republicanos foi interpretado como uma forma de excluir a Reunião Nacional (RN), da ultradireitista Marine Le Pen, mas também a França Insubmissa, partido majoritário da NFP (Nova Frente Popular), que venceu as eleições e é liderada por Jean-Luc Mélenchon.
A sugestão do presidente implicaria, assim, em um racha da coalizão de esquerda que competiu no pleito de forma unificada —analistas apontaram, antes da eleição, que Macron apostava que o campo político não conseguiria se unir, o que possibilitaria ao seu governo forjar uma aliança com partidos de centro-esquerda.
“Ninguém ganhou. Nenhuma força política obteve uma maioria suficiente, e os blocos ou coalizões surgidos destas eleições são todos minoritários”, disse Macron na carta.
A NFP ficou em primeiro lugar, conquistando cerca de 190 assentos, e a aliança centrista de Macron atingiu por volta de 160. A ultradireita elegeu pouco mais de 140 parlamentares.
Macron escreveu ainda: “Coloquemos nossa esperança na capacidade de nossos líderes políticos de demonstrar senso, harmonia e calma em seu interesse e no do país”. “É à luz desses princípios que decidirei sobre a nomeação do primeiro-ministro.”
Até lá, prosseguiu Macron, o governo atual continuará a exercer suas responsabilidades —sem deixar claro se ele realmente pretende aceitar a renúncia de Gabriel Attal, atual primeiro-ministro, que prometeu ficar no cargo até o fim das Olimpíadas de Paris.
O presidente sofre pressão da NFP para que nomeie um de seus membros como premiê em breve, mas a coalizão ainda não chegou a um consenso sobre quem vai indicar ao cargo. Mélenchon é considerado radical demais por membros de centro-esquerda do grupo, mas a França Insubmissa insiste que o primeiro-ministro seja um de seus correligionários.
A NFP, que inclui ambientalistas, socialistas, comunistas e o LFI, anunciou que proporia um candidato antes do final da semana.
Mélenchon está apoiando a deputada Clémence Guetté, não muito conhecida, mas popular entre os ativistas da esquerda radical. Aos 33 anos, ela oferece uma imagem menos polêmica do que Mélenchon. O líder socialista mais moderado, Olivier Faure, também disse que estaria disposto a assumir o cargo.
As opções de governo na França incluem agora uma ampla coalizão, com macronistas e a esquerda, um governo minoritário da NFP ou, em uma hipótese extrema, um governo liderado por pessoas sem filiação política, que buscaria aprovar leis no parlamento caso a caso, com acordos pontuais.
Jordan Bardella, presidente da RN, disse que Macron era o culpado pela paralisia política. “E agora sua mensagem é: ‘resolvam algo’. Irresponsável!” escreveu ele na plataforma X, referindo-se à carta de Macron.
A líder de ultradireita Marine Le Pen, mentora de Bardella, passou os últimos anos limpando a imagem de um partido antes conhecido por racismo e antissemitismo, e agora terá de decidir qual estratégia adotar para vencer as eleições presidenciais de 2027, nas quais Macron, agora no seu segundo mandato, não poderá concorrer.
Na quarta-feira, Le Pen traçou paralelos entre o apelo de um político de esquerda por uma marcha em direção ao gabinete do primeiro-ministro e o ataque ao Capitólio por apoiadores do ex-presidente dos EUA Donald Trump em 2021.