O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem cobrado em discursos que outros países reforcem suas contribuições para a agência da ONU voltada a refugiados palestinos (UNRWA, na sigla em inglês) e prometeu “aporte adicional” para o órgão, mas o repasse brasileiro continua inalterado.
O ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) informou o Congresso, na segunda-feira (1º), que a doação do Brasil para a agência em 2024 será a mesma dos últimos quatros anos. Em ofício encaminhado à Câmara, o chanceler disse que neste ano o Itamaraty realizará contribuição de US$ 75 mil (cerca de R$ 380 mil) para a UNRWA.
O valor, de acordo com o mesmo documento, é o mesmo doado anualmente pelo Brasil desde 2020 —ou seja, três desses pagamentos feitos ainda no governo Jair Bolsonaro (PL). A quantia corresponde a uma fatia insignificante (menos de 0,01%) do total de US$ 1,17 bilhão recebido pela agência em 2022, último ano em que há balanço disponível.
O governo brasileiro doa menos, por exemplo, que países como Malta (US$ 80 mil em 2022) e Chipre (US$ 101 mil). Entre os latinos, o México repassou dez vezes mais (US$ 750 mil). Estados Unidos, Alemanha e União Europeia são os maiores doadores; juntos, destinaram mais da metade dos recursos à disposição da UNRWA.
Depois de ser questionado pela Folha, o Palácio do Planalto disse em nota que Lula defende a revisão do montante. “O tema está em discussão dentro do governo”, informou a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social).
Em resposta a requerimento de informação do deputado Alberto Fraga (PL-DF), Vieira detalhou os aportes realizados nos últimos quatro anos. “O governo brasileiro fez, à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA), aportes financeiros de caráter humanitário, por meio do Programa Mundial de Alimentos (PMA), nos valores de USD 75.000,00, em cada um dos anos de 2020, 2021, 2022 e 2023, nas datas de 18/12/2020, 17/11/2021, 16/12/2022 e 16/05/2023”, disse.
“Cumprindo instrução do Presidente da República, que anunciou que seu governo faria aporte adicional de recursos para a UNRWA, a Agência Brasileira de Cooperação [vinculada ao Itamaraty] providenciará nova contribuição, correspondente ao ano corrente de 2024, no mesmo valor de USD 75.000,00”, prosseguiu o chanceler, no mesmo ofício.
Em 15 de fevereiro, durante discurso na sede da Liga Árabe, no Cairo, Lula anunciou que realizaria “um novo aporte de recursos para a UNRWA”, sem detalhar valores, e pediu que outras nações mantivessem e até mesmo reforçassem os repasses.
A fala ocorreu num contexto em que diferentes governos, entre eles o dos Estados Unidos, tinham anunciado a suspensão de contribuições para a UNRWA devido a acusações feitas por Israel de que funcionários do órgão tinham ajudado o Hamas nos ataques terroristas de 7 de outubro.
No mesmo ofício encaminhado ao deputado Fraga, Mauro Vieira afirmou que, diante da disposição da ONU de demitir os funcionários envolvidos e dos processos de investigação abertos, “países que anunciaram cortes à agência reverteram a decisão, como Austrália, Bélgica, Canadá e Suécia”.
“Não se pode minimizar o impacto imensurável de eventual descontinuidade das atividades da UNRWA sobre a população em Gaza, que já se encontra em situação extremada de flagelo humanitário“, escreveu o ministro na mensagem ao parlamentar.
Dias antes de ir ao Egito, Lula fez praticamente a mesma promessa de mais ajuda na embaixada da Palestina em Brasília, durante jantar com embaixadores de países árabes e muçulmanos.
“As recentes denúncias contra funcionários da UNRWA precisam ser devidamente investigadas, mas não podem paralisá-la. O Brasil exorta a comunidade internacional a manter e reforçar suas contribuições para o bom funcionamento das suas atividades. Meu governo fará aporte adicional de recursos para a agência”, afirmou Lula na ocasião, segundo transcrição divulgada pelo Planalto.
Em 18 de fevereiro, durante uma entrevista a jornalistas em Adis Abeba (Etiópia), Lula foi questionado sobre qual seria o montante da doação brasileira.
“O Brasil não apenas afirmou que vai dar contribuição —eu não posso dizer quanto porque não é o presidente que decide, é preciso ver quem é que cuida disso no governo, para saber quanto é que vai dar— como o Brasil disse que vai defender na ONU a definição do Estado palestino ser reconhecido definitivamente como Estado pleno e soberano”, respondeu.
Foi nesta mesma viagem a Adis Abeba que o presidente comparou a ofensiva militar de Israel em Gaza à decisão de Hitler de “matar os judeus”. A referência ao Holocausto nazista abriu uma crise diplomática com Israel e gerou críticas de entidades judaicas no Brasil.