O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) declarou, nesta terça-feira (25), que a Lei 6.759/2020 que institui a educação domiciliar, conhecida como homeschooling, no Distrito Federal é inconstitucional, por vício formal de iniciativa. De acordo com o colegiado, houve uma afronta à competência privativa da União ao legislar sobre matéria de educação.
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A decisão da justiça atende a uma ação proposta pelo Sindicato dos Professores do DF (Sinpro/DF), sob o argumento de que a norma fere a Constituição Federal, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei Orgânica do Distrito Federal (LODF).
Segundo o sindicato, “o dispositivo institui a educação domiciliar no DF como uma modalidade de ensino solidária, na qual a família assume a responsabilidade pelo desenvolvimento pedagógico do educando, de modo que fique a cargo do Poder Executivo acompanhar e fiscalizar o desenvolvimento dos alunos”. Na visão do Sinpro/DF, no entanto, a normatização é inconstitucional, pela ausência de competência legislativa concorrente do Distrito Federal para tratar do tema e pela exigência de lei federal que a regule.
Os representantes da sociedade civil que defendem o homeschooling – como a Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned) e a Associação de Famílias Educadoras do DF (Fameduc) – apontaram que a norma não é incompatível com a LDB, e que os pais tem autonomia familiar para escolher o gênero de ensino a ser ministrado aos seus filhos.
Uma das autoras da lei, a ex-deputada distrital Júlia Lucy, considerou a decisão do tribunal um “retrocesso” e um “ataque frontal à organização federativa brasileira”. “O artigo 24 da Carta Magna define que estados detêm competência concorrente para legislarem sobre educação com a União. Se o Congresso não legisla, câmaras estaduais podem fazê-lo de forma plena”, escreveu Lucy.
Lei do DF entrou em vigor em 2020
A lei que regulamenta o homeschooling no Distrito Federal foi sancionada pelo governador Ibaneis Rocha (MDB) no dia 16 de dezembro de 2020. O texto estabelece as condições para que as famílias possam aderir à educação domiciliar e as garantias dadas aos alunos homeschoolers. Determina a aplicação de avaliações sobre a aprendizagem desses estudantes e ainda a produção de laudos psicossociais a cada seis meses.
De acordo com a lei, “[…] a família deve demonstrar aptidão técnica para o desenvolvimento das atividades pedagógicas ou contratar profissionais capacitados, de acordo com as exigências da SEE/DF […]”. O texto diz também que essas famílias serão acompanhadas por um conselheiro tutelar.
Para a Aned, a lei permanece em vigor até que se transite em julgado. “Por conta da divergência e da fase processual é possível recorrer dessa decisão para instância superior e ao próprio STF que pode confirmar a competência do DF a legislar”, explica a associação.
Caso a lei venha ser efetivamente derrubada, a Aned reforçou que o homeschooling não fica proibido, tendo em vista a decisão do STF, que não vedou a prática, desde que o assunto seja votado no Congresso. “Os Desembargadores rejeitaram o argumento de inconstitucionalidade, pois reafirmaram que o próprio STF já decidiu que tem amparo na Constituição. Porém, se a lei for realmente revogada após os recursos, as famílias poderão estar sujeitas a responder a processos de acordo com interpretações subjetivas e ações do Ministério Público”, alerta a associação.
O Projeto de Lei 1.338/2022, que trata da regulamentação da oferta do ensino domiciliar, foi aprovado na Câmara dos Deputados em maio do ano passado e tramita agora no Senado. A senadora Professora Dorinha (União/GO) foi designada como relatora da proposta, que está em discussão na Comissão de Educação, onde foram realizadas algumas audiências públicas ao longo de 2022. Antes de virar lei, a proposta precisa ser aprovada pelas comissões e no plenário para seguir a sanção presidencial.
A Gazeta do Povo mostrou em uma reportagem do ano passado que o projeto tem enfrentado resistência de alguns senadores. Há senadores que pretendem aguardar as audiências públicas para assumir um posicionamento. Outros apontam problemas como a possível falta de qualificação dos pais e prejuízos com a socialização das crianças para se posicionarem contra a proposta.