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Jovens de Portugal promovem onda de protestos climáticos – 18/10/2023 – Ambiente

Uma ativista ambiental portuguesa colou-se à porta de entrada de um avião na manhã desta quarta-feira (18). Na semana anterior, manifestantes lançaram tinta vermelha contra um quadro de Pablo Picasso, além de bloquearem o trânsito em rodovias importantes de Lisboa.

No último mês, Portugal tem sido sacudido por uma série de ações de ambientalistas, que incluíram até acertar o ministro do Ambiente com ovos com tinta verde.

Um dos principais responsáveis pela onda de manifestações recentes é o coletivo Climáximo, que tem se especializado em iniciativas de desobediência civil como forma de chamar a atenção para a emergência ambiental.

“Face uma crise tão grande, temos de abrir uma discussão de crise pública com democracia radical. A desobediência civil é, historicamente, uma ferramenta capaz de colocar a crise climática no centro do debate, ao permitir a qualquer pessoa parar de consentir com a normalidade”, disse Noah Zino, ativista da entidade.

Segundo ela, a Climáximo tentou anteriormente diversas outras abordagens, todas sem sucesso.

“Já fizemos tudo. Desde 2015 que assinamos petições e organizamos as maiores manifestações sobre clima no país. Escrevemos inúmeros artigos em jornais, demos em dezenas de entrevistas, palestras, formações e sessões públicas. Percorremos 400 km em Portugal para falar e organizar com as populações mais afetadas pela crise climática”, enumera.

A ativista ambiental destaca que Portugal segue investindo, segundo o FMI (Fundo Monetário Internacional), mais de 3,3 milhões de euros todos os dias na economia fóssil, além de ter projetos para a construção de um novos aeroportos e gasodutos.

“Face uma crise climática que, segundo a OMS [Organização Mundial da Saúde], já mata centenas de milhares de pessoas todos os anos, estes projetos são efetivamente projetos de armas de destruição em massa. Se eles sabem que estão matando em massa e decidem continuar a fazê-lo, então sabemos que o governo e as empresas declararam guerra às pessoas e ao planeta”, afirmou.

A ação da Climáximo no aeroporto, em um avião que se preparava para percorrer o trecho entre Lisboa e o Porto (pouco mais de 300 km), tinha o objetivo de destacar também a grande quantidade de emissões nas viagens aéreas de curta duração.

Nos últimos anos, Portugal ficou para trás no investimento em ferrovia em comparação a vários outros países da União Europeia. Enquanto a vizinha Espanha construiu uma moderna rede de trens em alta velocidade, a rede ferroviária lusitana diminuiu cerca de 18% desde o ano 2000.

Não há, por exemplo, ligação direta ferroviária entre as capitais Lisboa e Madri. Anunciado há sete anos, o plano de expansão ferroviária tem menos de 20% dos projetos concluídos.

Há pelo menos três anos, os museus europeus são visados pela ala mais radical do movimento ambientalista, que utiliza a visibilidade dos “ataques cênicos” aos quadros para garantir espaço na mídia e viralizar nas redes sociais.

Na última sexta-feira (13), os ambientalistas portugueses tiveram como alvo “Femme dans un fauteuil (métamorphose)”, de Pablo Picasso, em exposição no Centro Cultural de Belém, também na capital portuguesa. Aproveitando um momento de distração dos seguranças, os jovens atiraram tinta vermelha contra a obra.

Apesar do incidente, o quadro, que conta com uma proteção de acrílico transparente, não foi danificado, de acordo com a direção do espaço cultural.

Políticos também são alvos frequentes. No fim de setembro, outro grupo ambientalista, a GCE (Greve Climática Estudantil), atingiu o ministro do Ambiente português, Duarte Cordeiro, com ovos contendo tinta verde. O político socialista foi alvejado enquanto participava de uma palestra intitulada “A nova energia é verde”, ao lado de executivos de empresas ligado ao setor de petróleo e gás.

A ação foi amplamente divulgada nas redes sociais do grupo, onde os jovens apresentam suas explicações para as manifestações. Os ambientalistas criticam a proximidade do governo com as companhias ligadas aos combustíveis fósseis.

“Está claro que esta conferência é uma fachada para limpar a imagem das empresas que em Portugal estão a lucrar com as crises climática e de custo de vida”, justificaram os manifestantes.

Os ambientalistas da GCE, que pedem o fim do uso dos combustíveis fósseis até 2030, afirmam que irão intensificar as manifestações. “Prometemos continuar a não dar paz ao governo. Vamos voltar com uma onda de ações a partir de 13 de novembro, com ocupações nas escolas e perturbação do normal funcionamento das instituições”, antecipam.

Alvo dos ativistas, o ministro Duarte Cordeiro optou por não prestar queixa contra as duas jovens responsáveis pela ação.

Nos últimos meses, diversos ativistas foram detidos —e liberados em seguida— por participação em protestos, sobretudo nos que envolvem bloqueio de trânsito e depredação de vidraças e fachadas de empresas poluidoras.

Os ambientalistas se preparam agora para uma maratona de visitas aos tribunais, ainda que especialistas considerem que o cenário de prisões efetivas seja bastante remoto.

Noah Zino, da Climáximo, diz que os ativistas estão cientes dos riscos judiciais e da possibilidade de animosidade entre a população. Houve registro de agressões contra alguns dos jovens que participaram de ação para fechar o trânsito em Lisboa. Motoristas insatisfeitos saíram de seus carros e arrancaram, com violência, o grupo do asfalto, para desobstruir a passagem.

“Todas as pessoas têm receio. Somos humanas, com famílias e empregos. Entendemos também a frustração das pessoas que nos agrediram. Vivemos uma sociedade que nos estica até ao limite, e qualquer interrupção da normalidade pode criar reações emocionais. Sabemos também que não haverá normalidade para defender em colapso climático.”

Na avaliação de Marc Lomazzi, jornalista francês especialista no tema e autor do livro “Ultra Ecologicus: Les Nouveaux Croisés de l’Écologie” (ultraecológicos: os novos cruzados da ecologia), a sociedade europeia, cada vez mais preocupada com as questões relacionadas ao aquecimento global, costuma ver com alguma simpatia os ambientalistas.

“Globalmente, enquanto as coisas se mantiverem pacíficas, a tendência é de que a opinião pública seja favorável. Evidentemente, se eles passarem para ações violentas, haverá um divórcio da opinião pública”, destacou Lomazzi à Folha, em novembro, pouco após o lançamento de seu livro, que explora as origens e as características do ambientalismo radical.

Mesmo com uma certa tolerância da sociedade, a onda de ações ambientalistas radicais já provoca reações políticas. Países como Itália e Reino Unido estão promovendo alterações na legislação mirando especificamente esse tipo de manifestação, classificada por alguns políticos como “ecovandalismo”.

Além da desobediência civil, grupos de jovens portugueses também têm buscado a via judicial para lutar contra as mudanças climáticas.

No fim de setembro, um processo movimento por seis deles, com idades entre 11 a 24 anos, começou a ser julgado pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos, uma das mais altas instâncias legais da Europa. A decisão, que só deve sair no ano que vem, pode obrigar mais de 30 países a reverem suas emissões de gases-estufa.

Fonte: Folha de São Paulo

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