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Jill Dando: assassinato permanece envolto em mistério – 24/09/2023 – Mundo

A apresentadora e jornalista da rede britânica BBC Jill Dando foi assassinada em abril de 1999 com único disparo à queima-roupa do lado de fora de sua casa, em plena luz do dia. Vinte e quatro anos depois, o caso continua sem solução, apesar de ser uma das maiores e mais notórias investigações de homicídio da história do Reino Unido.

Agora, um novo documentário da Netflix, dividido em três episódios, tentará responder à pergunta: quem assassinou Jill Dando?

A série documental —que se baseia num especial mais curto produzido pela BBC em 2019— retrata a falecida apresentadora de programas como “Crimewatch” e “Holiday” como a “menina de ouro da televisão britânica” e uma “[princesa] Diana da televisão”.

Também inclui relatos em primeira mão de sua família, amigos e jornalistas, como sua colega da BBC Jennie Bond, que conta ter ficado “em estado de choque” quando deu a notícia do assassinato de Dando aos telespectadores, bem como depoimentos dos chefes de polícia que investigaram o caso.

A série também explica muitas das “teorias fantasiosas” —como se refere a elas o irmão de Dando, Nigel— que foram investigadas pela Polícia Metropolitana de Londres para entender por que “a queridinha da nação” foi assassinada naquele dia no bairro de Fulham, no oeste de Londres, aos 37 anos.

As hipóteses para o seu assassinato incluem desde um perseguidor enlouquecido de celebridades ou amante enfurecido, passando por uma trama envolvendo mafiosos ou outros criminosos, devido ao seu trabalho público para ajudar a capturar criminosos.

Além disso, o documentário lança luz sobre um homem de ascendência sérvia que ligou para a BBC alegando que Dando havia sido executada como vingança pelo atentado a bomba apoiado pelos britânicos ao canal estatal sérvio em Belgrado.

Mas Nigel Dando diz ter sua própria teoria.

Ele afirma que as imagens de câmeras de vigilância mostram que ninguém seguiu sua irmã para casa naquele dia e que, naquela altura, estava passando muito pouco tempo no imóvel pois morava com seu noivo, Alan Farthing.

Como alguém poderia saber, então, que ela estava chegando naquele momento?

Dando diz à BBC News: “Minha teoria, que tenho desde antes do lançamento deste documentário e mais ainda agora que pude ver as investigações policiais com mais detalhes, é que era simplesmente alguém que estava na rua naquele dia, que pode ou não saber que ela morava lá, que estava armado na época… alguém que a reconheceu e que pensou que talvez pudesse ganhar seus cinco minutos de fama atirando nela.”

“E essa é a minha visão do que aconteceu. Por mais estranho que possa parecer às pessoas, é certamente uma das teorias que abundam: a de que Jill estava simplesmente no lugar errado na hora errada”, acrescenta.

Na época, Nigel trabalhava como jornalista do jornal “Bristol Evening Post”.

Ele não reclama da ampla cobertura midiática do caso, que descreve como um “choque imenso” para a sua família.

Segundo ele, o assassinato de sua irmã tem todos os elementos de uma “baita história”.

“Uma jovem que alcança o status de celebridade, vira uma grande estrela da BBC e, de repente, leva um tiro sem motivo aparente, na sua porta, em plena luz do dia”, enumera.

“Se você tirar meus profundos sentimentos de tristeza dessa equação, é uma baita história”.

A misteriosa morte de sua irmã “muito amada” e “generosa” chocou tanto o público britânico que, para Nigel, “Jill não será esquecida”.

Um ‘mistério perfeito’

A produtora-executiva Emma Cooper — que já tinha trabalhado com a Netflix num projeto sobre o desaparecimento da menina britânica Madeleine McCann — diz que era “importante” para a equipe “que a memória e o legado de Jill ocupassem um lugar central” no documentário.

Cooper descreve o assassinato como “o mistério perfeito do início ao fim”.

Ela lembra que, na história recente, não é comum que “nomes queridos pelo público” sejam assassinados a sangue frio nos subúrbios. “É algo que não acontece”, diz. “E é algo que não aconteceu desde então”, acrescenta.

Estatisticamente, a maioria das vítimas de homicídio é morta por alguém que as conhece.

Assim, como narra o próprio documentário, Farthing, namorado de Jill Dando, foi interrogado pela polícia, assim como seu ex-namorado e editor de notícias da BBC Breakfast, Bob Wheaton.

Seu agente Jon Roseman também chegou a ser questionado pelos policiais – ele havia escrito, coincidentemente, um romance policial em que descreve uma cena macabra semelhante à do assassinato.

Todos foram descartados como suspeitos, assim como uma pessoa que correspondia à aparência do retrato falado feito com base nos depoimentos de testemunhas que afirmaram ter visto alguém suando em um ponto de ônibus perto do momento do crime.

No documentário, a polícia admite que a divulgação do retrato falado foi um “grande erro” na investigação.

Como a motivação precisa não foi estabelecida e as provas reais ou a arma do crime nunca se materializaram, as autoridades tiveram que voltar à estaca zero.

A única prova não circunstancial que eles tinham era uma única partícula de resíduo após o disparo que combinava com a munição usada no assassinato.

Depois de um ano de pressão crescente sobre a polícia devido à imensa cobrança da mídia para encontrar quem que havia assassinado Dando (incluindo um pedido de informações veiculado no “Crimewatch”, programa que ela apresentava), a partícula foi usada para acusar formalmente Barry George —um suposto lobo solitário, obcecado por armas.

A história da prisão de George recebeu tanta atenção quanto a morte de Dando. E, da noite para o dia, ele se tornou o homem mais famoso —ou infame— do país.

Detalhes de seu passado foram tornados públicos, incluindo uma condenação por estupro, uma tentativa fracassada de atuar como dublê e uma série de pseudônimos que ele usou em associação com cantores famosos.

George dizia às pessoas que era primo de Freddy Mercury, vocalista da banda Queen, alegando que seu nome era Barry Bulsara, o que foi negado por representantes do falecido cantor.

A Justiça britânica o considerou culpado, e ele cumpriu pena de oito anos pelo crime, que sempre negou ter cometido.

Mas, em agosto de 2008, graças ao apoio de sua irmã, George foi declarado inocente após a realização de um novo julgamento no qual as provas foram descartadas, e sua condenação, suspensa.

No entanto, mais tarde ele perdeu o pedido de indenização por condenação injusta.

O documentário mostra como é a vida dele hoje —George alega que foi transformado em um “bode expiatório” e “perseguido”.

O último episódio se concentra na discussão que o advogado de George, Michael Mansfield, teve com o chefe de polícia Hamish Campbell.

O advogado insiste veementemente que a acusação não se sustenta, que o seu cliente “não era capaz de cometer homicídio” e que crime havia sido cometido por um profissional.

Por outro lado, o Campbell se mostra convencido, como permanece até hoje, de que foi George. “Não há mistério nisso”, diz Campbell.

‘Refrescar a memória’

Quem matou Jill Dando escapou impune.

Embora acredite que seja “altamente improvável que a polícia consiga capturar alguém” agora, e não considere que o caso algum dia será reaberto, Nigel Dando continua esperançoso de que o documentário da Netflix possa “refrescar a memória de alguém.”

“O lado da investigação policial do documentário é realmente interessante e lança uma nova luz sobre as linhas de investigação que eles perseguiam, bem como a magnitude das informações que recebiam”, diz ele.

“E então você se pergunta se há algo em todos esses detalhes, escondido em um arquivo. De repente, alguém tem uma ideia do que aconteceu naquele dia e por que aconteceu.”

“Ou talvez o próprio perpetrador diga que convive com esse terrível segredo há muito tempo e que é hora de ir a algum lugar contar a alguém o que aconteceu.”

“Não espero que isso aconteça, mas seria o resultado ideal deste documentário.”

“Quem matou Jill Dando?” estreia na Netflix em 26 de setembro.

Este texto foi publicado originalmente aqui.

Fonte: Folha de São Paulo

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