Israel bombardeou a Faixa de Gaza de norte a sul neste sábado (9), em uma nova fase da guerra no território palestino, conflito que completou dois meses nesta semana. Os ataques acontecem um dia depois de os Estados Unidos usaram seu poder de veto no Conselho de Segurança da ONU para proteger o aliado histórico no Oriente Médio de uma demanda global por cessar-fogo.
No sul do território, para onde grande parte dos palestinos fugiu após o ultimato de Israel para sair do norte, dois dos últimos hospitais em funcionamento na região relataram 133 mortos e 259 feridos em 24 horas. Segundo autoridades de saúde locais, já são mais de 17 mil mortos do lado palestino desde o início da guerra, iniciada após Israel sofrer um ataque do grupo terrorista Hamas que fez 1.200 vítimas.
Segundo a Agência da ONU para Refugiados Palestinos (UNRWA), quase 85% dos 2,3 milhões de pessoas que moram no denso território palestino foi deslocada. Com os bombardeios se espalhando por todo o território, moradores e agências das Nações Unidas afirmam que não há mais lugares seguros para ir —Israel bloqueou a principal rota norte-sul ao longo da estreita faixa e está direcionando a população para a costa do Mediterrâneo.
Os mortos e feridos chegaram durante a noite ao sobrecarregado hospital Nasser, na cidade de Khan Yunis, no sul. Após uma ambulância estacionar, um médico saiu do veículo com o corpo inerte de uma menina vestida com agasalho rosa. Dentro do centro de saúde, crianças feridas choravam e se contorciam no chão de azulejos enquanto enfermeiras corriam para confortá-las. Do lado de fora, corpos estavam alinhados em lençóis brancos.
Na mesma cidade, uma casa foi consumida por um incêndio após ser atingida durante a noite.
Zainab Khalil, 57, deslocada com 30 parentes e amigos em Khan Yunis disse que parece ser “questão de tempo” para que Israel ataque o local em que está. “Estamos ouvindo bombardeios a noite toda”, afirmou à agência de notícias Reuters. “Nós não dormimos à noite. Ficamos acordados tentando fazer as crianças dormirem e com medo de que o local fosse bombardeado. Durante o dia começa outra tragédia: como alimentar as crianças?”
Não houve registros de novos números de mortos e feridos em outras partes de Gaza, incluindo a metade norte inteira, onde os hospitais pararam de funcionar e as ambulâncias muitas vezes não conseguem mais chegar aos locais de bombardeios. “Acreditamos que o número de mártires sob os escombros pode ser maior do que os recebidos nos hospitais”, disse Ashraf al-Qidra, porta-voz do Ministério da Saúde controlado pelo Hamas, à Reuters.
Os bombardeios na porção norte têm sido mais intensos na Cidade de Gaza e nos assentamentos perto da fronteira, onde explosões podiam ser vistas de Israel ao longo de todo o muro que separa o Estado judeu do território palestino. Famílias da região publicaram mensagens nas redes sociais implorando às equipes de emergência para tentar resgatar entes queridos ainda presos ali.
“Apelamos à Cruz Vermelha e à emergência civil para irem imediatamente à casa da família Attallah. As pessoas estão sitiadas dentro de sua casa na rua Jala, na Cidade de Gaza, perto do prédio Zaharna. A casa está pegando fogo”, escreveram parentes.
Desde 9 de outubro, Israel impôs um cerco quase total a Gaza, dificultando a chegada de água, alimentos, medicamentos e eletricidade. Os bombardeios israelenses só cessaram durante a trégua de uma semana que entrou em vigor em 24 de novembro, negociada com a mediação do Qatar, do Egito e dos Estados Unidos.
Durante o cessar-fogo de uma semana que terminou na sexta passada (1º), Tel Aviv e Hamas trocaram reféns por prisioneiros palestinos detidos em prisões israelenses.
Na quarta-feira (6), o secretário-geral da ONU, António Guterres, invocou o artigo 99 do estatuto da organização que lidera para convocar uma reunião de emergência do Conselho de Segurança e aliviar a situação catastrófica na Faixa de Gaza. No entanto, o pedido de trégua imediata que teve voto favorável de 13 dos 15 membros do conselho foi bloqueado por Washington. O Reino Unido se absteve.
Para o premiê da Autoridade Palestina, Mohammed Shtayyeh, a decisão é “uma vergonha” e “dá mais um cheque em branco à ocupação para massacrar, destruir e deslocar”. Nesta sexta (8), Guterres afirmou que a população de Gaza está perto de um “abismo” e vive um “pesadelo humanitário”.
Na última semana, Israel expandiu sua campanha terrestre para a metade sul da Faixa de Gaza, intensificando os ataques à principal cidade do sul, Khan Yunis. Simultaneamente, ambos os lados relataram um aumento significativo nos combates no norte.
Israel diz que está limitando os danos aos civis fornecendo a eles mapas mostrando áreas seguras e culpa o Hamas por causar mortes de civis ao se esconder entre eles, o que os combatentes negam. Os palestinos dizem que a campanha se transformou em uma guerra de terra arrasada contra toda a população.
Washington diz ter pedido a Israel mais ações para proteger os civis na próxima fase da guerra. Esta semana, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, disse que há uma “diferença” entre as promessas de Israel de proteger os civis e o resultado no conflito.