Pouco antes de a ativista iraniana Narges Mohammadi, 51, ser laureada com o Prêmio Nobel da Paz, nesta sexta-feira (6), outro caso de suposta agressão contra uma mulher voltou a mobilizar organizações que atuam pelos direitos humanos no Irã.
Segundo o grupo de direitos curdos Hengaw, com sede na Noruega, a adolescente Armita Geravand, 16, foi espancada e “gravemente ferida” no último domingo (1º) por agentes da polícia moral, responsável por aplicar os códigos de conduta religiosos no país. As agressões teriam ocorrido no metrô de Teerã, onde ela foi abordada por não usar o hijab, o véu islâmico. As autoridades negam os relatos.
Imagens de câmera de segurança divulgadas nas redes sociais mostram Geravand entrando sozinha no vagão do metrô. Pouco depois, ela é carregada para fora do trem, já aparentemente inconsciente, e outras mulheres a socorrem na plataforma da estação. No vídeo, não é possível ver as supostas agressões.
Ativistas disseram à agência de notícias Reuters que Geravand entrou em coma —as autoridades não divulgaram detalhes da saúde da adolescente. Ela teria sido internada no hospital Fajr, que tem segurança reforçada. Nesta quinta (5), grupos de direitos humanos disseram que Shahin Ahmadi, a mãe da adolescente, havia sido detida por protestar contra as restrições de visita à unidade, o que o regime nega.
A adolescente mora em Teerã e nasceu em Kermanshah, cidade majoritariamente curda no oeste do país, ainda de acordo com o Hengaw. Na segunda, a agência de notícias oficial, Irna, afirmou que ela perdeu a consciência depois de sofrer uma queda no metrô. A versão foi ecoada pelo diretor-geral do transporte, Masood Dorosti, que negou qualquer “desentendimento verbal ou físico” entre a adolescente “e passageiros ou empregados do metrô”.
Na quarta-feira, Alemanha e Estados Unidos manifestaram preocupação com o caso da adolescente. “No Irã, uma jovem luta por sua vida, apenas porque seu cabelo podia ser visto no metrô. Isso é intolerável”, escreveu a ministra alemã das Relações Exteriores, Annalena Baerbock, na plataforma, o antigo Twitter.
O americano e enviado especial ao Irã, Abram Paley, por sua vez, afirmou que Washington estava “preocupado com as informações de que a chamada polícia da moral iraniana agrediu” a adolescente.
No último dia 20, o Parlamento iraniano aumentou a pressão sobre as mulheres que se recusam a usar o véu islâmico. Segundo texto aprovado pelos deputados, as mulheres sem a vestimenta “promovem nudez” e, em alguns casos, “zombam do hijab”. Assim, os deputados aprovaram nova legislação que determina o uso do item inclusive em veículos. Donos de empresas cujas funcionárias desrespeitarem a regra também poderão ser punidos com multas e até proibição de deixar o país.
A votação no Parlamento aconteceu quatro dias após o aniversário de um ano da morte de Mahsa Amini. A jovem curda foi detida por supostamente não usar o hijab da forma correta em Teerã. Os policiais dizem que ela sofreu um ataque cardíaco enquanto estava sob custódia. Já a família de Mahsa alega que ela foi agredida por agentes da polícia moral, responsável por aplicar os códigos de conduta religiosos no país.
O episódio desencadeou uma onda de protestos em defesa dos direitos das mulheres e contra o regime do Irã, e a repressão foi dura. Pelo menos 22 mil pessoas foram detidas nos protestos –os maiores desde a fundação da República Islâmica, em 1979— e sete acabaram executadas pelo regime.
Um ano depois, as autoridades iranianas estão tomando medidas para evitar novos protestos. Ativistas relatam mais policiais nas ruas e restrições ao uso da internet. Além de bloquear milhares de páginas, o Irã tem imposto uma espécie de “toque de recolher digital”, interrompendo o acesso virtual à noite, quando as manifestações são mais frequentes.
Apesar da repressão, cada vez mais mulheres iranianas têm saído às ruas com as cabeças descobertas, principalmente nas grandes cidades. Em resposta, as autoridades passaram a investir na instalação de câmeras nas ruas para identificar e punir quem desobedece o código de vestimenta.
Organizações apontam que o regime também recrudesceu a perseguição à imprensa. Em relatório recente, a Repórteres Sem Fronteiras afirmou que autoridades detiveram 79 jornalistas desde o início dos protestos —31 deles são mulheres. A entidade descreve as prisões e acusações arbitrárias como “um labirinto de repressão estatal”. Dos 79 jornalistas que foram presos, 12 ainda estão atrás das grades.