As forças de Vladimir Putin voltaram a atacar nesta quinta (21) a rede energética da Ucrânia após uma pausa de seis meses, gerando temores de que uma nova onda de ações destinadas a deixar o país no escuro tenha começado.
A Rússia empregou 43 mísseis de cruzeiro, 36 dos quais Kiev afirma ter interceptado. Foram atingidas cidades no centro, nordeste e no oeste do país. “Houve blecautes parciais nas regiões de Rivne, Jitomir, Kiev, Dnipropetrovsk e Kharkiv”, afirmou no Telegram a operadora Ukrenergo.
Em 10 de outubro do ano passado, após ter a ponte que liga a Crimeia ocupada à Rússia atacada pela primeira vez, Moscou iniciou uma campanha contra centrais de distribuição de energia do país invadido. As ações quase semanais duraram até janeiro, auge do inverno no Hemisfério Norte, com a Ucrânia sendo deixada no escuro sob frio abaixo de zero grau.
As ondas passaram a ser esporádicas, com a última registrada em março, quando a Rússia empregou 81 mísseis em um de seus maiores ataques em toda a guerra. Curiosamente, Moscou poupou os centros produtores, o que é facilmente explicável no caso da matriz nuclear do país —antes da guerra, 24% da energia vinha dessa fonte, mas a Rússia tomou e na prática desativou 1 das 4 usinas de Kiev.
“O inverno está chegando”, escreveu no X (ex-Twitter) o deputado Andrii Osadtchuk, fazendo referência ao sombrio bordão da série de TV Game of Thrones. Pelo menos 18 pessoas ficaram feridas nos ataques, enquanto 2 mortes registradas no país ocorreram em bombardeios de artilharia.
Por óbvio, não é possível saber se Moscou continuará com as ações, mas elas podem indicar a gestação de uma nova fase na guerra. Em comparação com a temporada passada, Kiev tem acesso a mais defesas aéreas ocidentais, embora elas estejam concentradas em centros como a capital —destino de 20 dos mísseis nesta madrugada.
A etapa atual do conflito é marcada pelas dificuldades da Ucrânia em fazer avançar sua contraofensiva de modo decisivo, e a chegada das chuvas do outono no mês que vem serve como prazo final para isso. Depois, o terreno fica largamente impróprio para movimentos de tropas e blindados. Não que seja impossível, mas fica mais difícil e favorece troca de fogo em posições estáticas e campanhas aéreas com mísseis, no caso russo.
Nas últimas semanas, a Ucrânia também escalou seus ataques contra a península da Crimeia, que Putin anexou após a queda do governo pró-Moscou de Kiev em 2014. Ali, já houve ações contra baterias antiaéreas, pontes, aeródromos e a sede da Frota do Mar Negro, em Sebastopol.
Nesta quinta, o SBU, serviço de inteligência da Ucrânia, afirmou que promoveu um ataque bem-sucedido contra a base aérea de Saki, onde ficam caças navais da Frota do Mar Negro e outras aeronaves. Ainda não é possível estimar os danos, feitos segundo Kiev por um ataque inicial com drones suicidas, que ocupou as defesas aéreas, seguido pela ação de versões terrestres do míssil antinavio Netuno.
A tática já foi usada para destruir um poderoso sistema antiaéreo não muito longe de Saki, no fim de agosto. Agora, a Rússia só disse que derrubou 19 drones perto da base. Ela havia sido alvo de um dos mais eficazes ataques ucranianos na Crimeia até aqui, quando ao menos oito caças russos foram destruídos na pista em agosto do ano passado.
Os ataques à península têm adicionado incômodo nos já ansiosos aliados ocidentais de Kiev. Há relatos críveis de que os EUA consideram a anexação de 2014 um fato consumado, mesmo que ilegal, e que seria inteligente mantê-la como uma peça de eventual negociação de paz. O presidente Volodimir Zelenski se recusa, propondo a desocupação total de seu território.
Tudo isso tem gerado tensões que se misturam a fatores domésticos, como no caso da Polônia, cujo premiê disse na quarta (20) que não mais enviaria armas para a Ucrânia. Isso ocorre porque os países estão em uma disputa acerca de um embargo polonês aos grãos de Kiev, cujo escoamento pelo mar Negro está interrompido desde que Putin deixou um acordo para esse fim.
Como haverá eleições em outubro no país, a oposição de extrema-direita ataca o governo de direita, criticando políticas pró-Ucrânia, o que ajuda a entender a explosiva colocação do premiê Mateusz Morawiecki.