Em uma escalada militar não vista há anos no Oriente Médio, os Estados Unidos decidiram mudar de tática para pressionar o Irã a não se envolver na guerra que Israel trava contra o grupo terrorista palestino Hamas na Faixa de Gaza.
Em meio a um comunicado mais geral acerca do reforço de material bélico na região, feito no domingo (22), o Departamento de Defesa anunciou que o segundo grupo de porta-aviões enviado à área conflagrada deixaria de responder ao Comando Europeu das Força Armadas americanas e passaria para a responsabilidade do Comando Central.
Não é mera burocracia: isso significa que o grupo do porta-aviões de propulsão nuclear USS Dwight Eisenhower não ficará junto ao do USS Gerald Ford, já na região, perto da costa israelense no mar Mediterrâneo —área do Comando Europeu.
Ele irá atravessar o canal de Suez rumo ao mar Vermelho e ao Índico, restando saber onde ficará baseado. Segundo observadores militares, em ocasiões anteriores em que os EUA buscavam sinalizar sua presença ao Irã, a área preferencial de ação é o golfo de Omã, na boca do golfo Pérsico.
Além disso, o mar Vermelho tem se provado especialmente tenso para os americanos, com o destróier USS Carney tendo abatido ao menos 3 mísseis de cruzeiro e 12 drones lançados por milícias da etnia houthi, aliadas do Irã, da costa do Iêmen rumo a Israel na semana passada.
Mesmo a passagem do Eisenhower pela região não será desprovida de risco, apesar do grande poder de fogo defensivo seu e de sua escolta de combate, composta de um cruzador e três destróieres, além de navio de apoio e um eventual submarino nuclear de ataque.
O grupo de ataque estava no meio do Atlântico na segunda (23), segundo dados abertos de navegação. Deve chegar à região de Israel em talvez duas semanas.
Porta-aviões, dos quais Washington dispõe da maior frota do mundo, 11, são o expoente máximo da projeção de poder militar dos EUA. Levam dezenas de aeronaves, 55 delas usualmente de ataque, o que é mais do que boa parte das Forças Aéreas do mundo. Além disso, sua escolta típica carrega cerca de 800 mísseis, entre modelos de cruzeiro para ataque em terra e antinavio.
O presidente Joe Biden explicitou, na semana passada, que o objetivo da movimentação militar era o de conter o Irã, que apoia o Hamas e, principalmente, o Hizbullah . Aliado dos palestinos, o grupo libanês está em meio a escaramuças diárias com Israel durante a guerra no norte do país, mas não entrou com toda sua força no conflito apesar da retórica dos dirigentes.
Um deles, o chefe-adjunto Naim Qassem, disse nesta terça (24) que o Hizbullah estará “no coração da defesa de Gaza” quando e se os israelenses cumprirem sua promessa de invadir o território por “terra, mar e ar”, como afirmou na véspera o ministro Yoav Gallant (Defesa).
O “timing” da operação tem dividido políticos israelenses e seus apoiadores americanos, que temem pelos mais de 200 reféns nas mãos do Hamas e, principalmente, o risco de escalada regional de uma ação muito dura. A mais recente advertência por comedimento veio do ex-presidente Barack Obama, de quem Biden foi vice por oito anos.
Enquanto isso, os americanos são acusados pela arquirrival Rússia de escalar desnecessariamente a tensão regional. Vladimir Putin, um aliado do Irã com interesses e bases militares na também anti-Israel Síria, chegou a colocar aviões com mísseis hipersônicos que podem atingir os navios americanos em patrulha, embora ninguém espere ação de fato.
Já no embate EUA-Irã, o risco de algo sair de controle é bem maior, ainda que Teerã insista que apenas seus aliados estão a atacar Israel. Duas bases americanas na Síria foram atingidas por drones na segunda, sem vítimas, e a Casa Branca acusou os iranianos de terem “facilitado” a ação —um passo aquém de responsabilização direta.
Por ora, além dos porta-aviões, os americanos enviaram para suas bases com caças F-15 e F-16, além de aviões de ataque A-10, os “tanques voadores” de sua Força Aérea. Nos últimos dias, a presença constante de quatro aviões de reabastecimento aéreo dos EUA em rotas da Itália para o Oriente Médio sugere que a transferência está em curso.
Washington também vai emprestar sistemas antiaéreos Patriot e Thaad, este de alta altitude, para operação em Israel. O movimento provavelmente desagradou a Ucrânia, que penou para ter algumas baterias de Patriot na sua guerra contra a invasão russa, e nunca recebeu algo como o Thaad.
Toda essa movimentação ocorre em meio ao principal exercício de simulação de ataques nucleares promovido anualmente pela Otan (aliança militar liderada pelos EUA), o Steadfast Noon. Iniciado na semana passada, ele acabará na quinta (26) após envolver 60 aviões de 13 países, incluindo bombardeiros B-52 e caças F-35 capazes de empregar armas atômicas.
A Otan enfatizou que o exercício é rotineiro e nada teve a ver com as guerras em curso, particularmente a da Ucrânia em que a Rússia é uma potência nuclear envolvida. Por coincidência, contudo, ele está sendo realizado na região do Mediterrâneo próximo da Itália e da Croácia, não muito distante do teatro de operações do Oriente Médio.