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EUA: Como idade elevada de políticos desafia democracia – 01/10/2023 – Mundo

Quando Nancy Pelosi anunciou na semana passada que buscaria mais um mandato na Câmara dos Representantes, a notícia foi recebida com incredulidade.

Embora alguns democratas tenham apreciado a perspectiva de mais dois anos trabalhando ao lado de uma experiente estadista —e uma arrecadadora de fundos formidável— muitos outros observadores políticos estavam menos entusiasmados.

Isso se deve em grande parte ao fato de que a Oradora Emérita, como Pelosi é agora conhecida, terá 84 anos quando ocorrerem as próximas eleições nos EUA, e sua decisão vem em um momento em que candidatos idosos se tornaram uma questão importante na política americana.

Os EUA são uma exceção mesmo em um mundo onde a maioria dos legisladores é muito mais velha do que a população em geral. Comparado a países semelhantes, os EUA são especialmente dominados por políticos mais velhos; 1 em cada 5 congressistas tem mais de 70 anos, o que faz da profissão uma das mais idosas da nação.

Essa tendência tem levado a pedidos de limites máximos de mandato, aposentadoria obrigatória e até mesmo testes compulsórios de competência mental para aqueles com mais de 75 anos. Na semana passada, o deputado republicano John James apresentou uma legislação para impedir que aqueles com 75 anos ou mais durante seu mandato concorressem à Presidência, vice-presidência ou ao Congresso.

“Para a democracia em geral, é bom ter uma renovação [de líderes]”, diz Daniel Stockemer, professor de estudos políticos da Universidade de Ottawa, que pesquisa a representação etária em todo o mundo, incluindo os EUA. Ele argumenta que os membros mais velhos não devem ser excluídos, mas o espaço deve ser liberado para novatos em vez de permitir que “as mesmas pessoas comandem o show”.

A reação à declaração de Pelosi, eleita pela primeira vez em 1987, é o mais recente ponto de conflito em um debate maior sobre a crescente gerontocracia nos EUA. Ela sucede, por exemplo, preocupações com a saúde de senadores mais velhos, incluindo o republicano Mitch McConnell, 81, e com a democrata eleita pela Califórnia Dianne Feinstein, 90 —morta nesta sexta-feira (29), ela estava na política desde o final dos anos 1970.

Enquanto isso, o octogenário McConnell congelou duas vezes no meio de uma frase enquanto falava com repórteres recentemente, o que levou a uma consulta com um médico do Congresso.

Preocupações semelhantes também têm assombrado Joe Biden, o presidente mais velho da história dos EUA, que, aos 80 anos, concorre à reeleição em uma provável disputa contra o favorito republicano Donald Trump, de 77 anos. Ambos os homens foram instados pelo ex-candidato presidencial Mitt Romney, de 76 anos, a “se afastarem” e abrir caminho para a próxima geração.

Em agosto, uma pesquisa da Associated Press e do NORC Center for Public Affairs Research indicou que três quartos do público acham que Biden é velho demais para servir como presidente por mais um mandato, incluindo mais de dois terços dos democratas.

O desconforto em relação à gerontocracia americana vai além das preocupações com a aptidão física e a competência mental desses líderes.

Afinal, assim como ocorre com outros grupos minoritários, a sub-representação severa dos jovens provavelmente significa que seus interesses não estão sendo adequadamente abordados pelos formuladores de políticas, argumentam cientistas sociais, acrescentando que isso pode contribuir para a apatia política entre os jovens.

As legislaturas devem, portanto, “assemelhar-se um pouco à população para tomar decisões que se assemelhem ao que ela em geral deseja”, diz Stockemer.

Nos EUA, no entanto, a idade média tanto do Senado quanto da Câmara tem aumentado desde o início do século. Isso contrasta com a Alemanha, onde a idade média do Bundestag tem diminuído desde 2013, embora as tendências se mantenham mais ou menos estáveis nos últimos anos nas câmaras baixas dos parlamentos britânico e francês, de acordo com dados coletados por pesquisadores da Universidade de Ottawa.

A Câmara dos Representantes dos Estados Unidos também é mais velha do que seus equivalentes em outros países do G7 e na Rússia, com uma idade média de 58 anos. No Senado, esse número sobe para 65, o que significa que metade dos senadores está na idade da aposentadoria ou além dela. Considerando que essas idades são calculadas em relação ao início das sessões do Congresso, aqueles que estão no cargo estarão ainda mais velhos quando terminarem seus mandatos.

Com apenas cerca de 7% do Congresso com menos de 40 anos, isso pode não ser bom para a representação e aprovação de leis sobre questões que os jovens americanos se preocupam, como a necessidade de ação climática mais profunda.

Jon Fiva, professor da Norwegian Business School, afirma que políticos eleitos se comportam de maneira diferente durante os debates legislativos de acordo com sua idade e, “presumivelmente, também ao implementar políticas”. Ele estudou como a idade, o gênero, a origem social e a representação urbano-rural no Parlamento da Noruega afetam as discussões políticas

A idade está emergindo como uma nova linha divisória política que às vezes pode até superar a lealdade partidária. Ser simplesmente democrata ou republicano não decide as opiniões de uma pessoa. “É mais importante se você é um democrata jovem ou idoso, ou um republicano jovem ou idoso”, diz Fiva.

Por exemplo, uma pesquisa de 2021 do Pew Research Center descobriu que adultos da geração Z —nascidos após 1996— estavam mais interessados em lidar com as mudanças climáticas do que as gerações mais antigas. Mesmo entre os republicanos, os adultos mais jovens eram menos inclinados a apoiar o uso de combustíveis fósseis, com 44% da geração Z dizendo que apoiavam extração de petróleo com uso de técnicas agressivas de perfuração do solo em comparação com 74% dos baby boomers e republicanos mais velhos.

Outra pesquisa descobriu que os republicanos da geração Z também divergem de seus colegas mais velhos em questões como o reconhecimento da injustiça racial e o maior envolvimento do governo para resolver problemas, em vez de deixar que empresas e indivíduos lidem com eles.

Embora a diferença entre a idade dos legisladores e a população em geral seja especialmente marcante nos Estados Unidos, a sub-representação dos jovens na formulação de políticas é um problema em todo o mundo.

De acordo com novos dados da União Interparlamentar, uma organização internacional de parlamentos nacionais, apenas 2,8% dos legisladores em todo o mundo têm menos de 30 anos. Em comparação, aproximadamente 18% da população mundial têm entre 18 e 29 anos.

Muitos desafios impedem que jovens aspirantes a legisladores entrem no cargo, como a falta de conexões políticas e endossos, poder limitado de arrecadação de fundos, e restrições de idade mínima estabelecidas por lei. Para ajudar os jovens a superar esses obstáculos, grupos como o Run for Something surgiram recentemente para oferecer treinamento, orientação e financiamento.

“Nosso governo hoje é administrado como uma gerontocracia”, diz Juan Ramiro Sarmiento, 29, porta-voz do Run For Something, que ajuda candidatos progressistas com menos de 40 anos a concorrerem a eleições estaduais e locais. “Portanto, não é surpresa que as políticas públicas que surgem de lá beneficiem eles.”

Isso significa que políticos mais velhos não vão aprovar leis que os impeçam de se reeleger, diz ele. Em vez disso, é necessário uma “massa crítica” de políticos jovens para trazer mudanças.

Brandon Sakbun, 27, que concorre à Prefeitura em Terre Haute, no estado de Indiana, depois de vencer a indicação democrata no início deste ano, está otimista de que mais eleitores começarão a apoiar candidatos mais jovens, pois procuram ideias e soluções frescas e fora do status quo.

“Estamos enfrentando um conjunto diferente de desafios com os quais as pessoas não foram confrontadas [anteriormente]”, diz ele, acrescentando que pessoas de ambos os partidos podem apoiar a ideia de “passar o bastão para uma nova geração”.

Fonte: Folha de São Paulo

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