Moradores de Derna, na Líbia, ainda procuravam por parentes e amigos desaparecidos nesta quarta-feira (13), dois dias após uma tempestade devastadora atingir o leste do país. A força da chuva fez com que duas barragens localizadas na parte de cima da cidade se rompessem, arrastando veículos, casas e até pontes inteiras em direção ao mar.
Até o momento, foram confirmadas as mortes de ao menos 5.300 pessoas em decorrência das chuvas em todo o país. Nesta quarta, Hichem Abu Chkiouat, membro do governo líbio que integra o comitê de emergência formado para responder à crise, afirmou que a expectativa é de que esse número dobre. “O mar despeja constantemente dezenas de corpos”, disse ele à agência de notícias Reuters.
Tempestade arrastou veículos e casas inteiras mar adentro
Imagens de satélite mostram uma área da cidade de Derna, na Líbia, antes e depois de uma forte tempestade inundá-la
– Planet Labs PBC – 2.set.23 e 12.set.23/via Reuters
As autoridades do país estimam que o número de desaparecidos seja de 10 mil —a agência de coordenação de ajuda humanitária da ONU (Ocha, na sigla em inglês) situa a cifra na casa dos 5.000. Em relatório divulgado nesta quarta, outro escritório da ONU, a OIM (Organização Internacional para as Migrações) atualizou o número de pessoas desabrigadas para 30 mil.
Ruptura de barragem criou torrente forte em leito de rio em geral seco
Imagens de satélite da cidade de Derna, na Líbia, antes e depois de ruptura de barragem em decorrência de fortes chuvas
– Planet Labs PBC – 2.set.23 e 12.set.23/via Reuters
No ano passado, um pesquisador havia alertado para o fato de que a falta de manutenção das barragens acima de Derna tornavam a cidade particularmente vulnerável a desastres. “Se ocorrer uma grande inundação, o resultado será catastrófico”, escreveu Abdelwanees A. R. Ashoor, especialista em hidrologia ligado à Universidade Omar Al-Mukhtar, no artigo em questão.
A primeira barragem rompida fica a 11,5 km do município, e autoridades locais anunciaram uma investigação para apurar as causas do incidente. A outra estrutura rompida fica no começo do perímetro urbana.
A crise política que assola a Líbia há uma década também contribuiu para agravar a situação, uma vez que ela erodiu a confiança da população nas autoridades e impediu o investimento em infraestrutura. O país não tem um governo centralizado desde que o ditador Muammar Gaddafi foi derrubado em 2011, após 42 anos no poder. A partir de 2014, as regiões leste e oeste do país passaram a ser administradas por facções rivais.
Outras cidades, como Benghazi, Sousse, Al Bayda e Al-Marj, também foram atingidas
Imagens de satélite mostra a cidade de Al-Marj, no leste da Líbia, antes e depois de ser atingida por tempestade
– Planet Labs PBC – 6.ago.23 e 11.set.23/via Reuters
Derna foi especialmente afetada pelos combates iniciados na época, tendo sido tomada por militantes do Estado Islâmico e, depois, por grupos de jihadistas rivais. Quando o Exército Nacional Líbio (LNA), do comandante Khalifa Haftar, assumiu seu controle em 2019, muitos de seus moradores disseram que as forças puniram tanto jihadistas quanto habitantes comuns.
Dados da Organização Meteorológica Mundial (OMM), agência da ONU para questões do clima, indicam que eventos climáticos extremos como secas, enchentes, deslizamentos de terra, tempestades e incêndios mais do que triplicaram ao longo dos últimos 50 anos em consequência do aquecimento global.
Outro órgão ligado à ONU, o IPCC (Painel Intergovernamental para a Mudança Climática), já afirmou em relatório que hoje é inequívoco que parte dessas mudanças foi causada pela ação humana.