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Eleição argentina mostra como 3ª força pode mudar o jogo – 22/10/2023 – Mundo

Difícil não descrever as eleições deste domingo (22) como as mais tensas e históricas das últimas duas décadas. Em 2003, vivia-se uma apreensão parecida. Afinal, o país estava afundado numa crise econômica, acreditem, bem pior que a atual.

A pobreza ultrapassava os 50%, o peso havia sofrido uma imensa desvalorização, após o “corralito” ter impedido que as pessoas retirassem dos bancos seus dólares, como se podia fazer até 2001, na famosa política do 1 para 1. Para sobreviver, criou-se até uma moeda nova, os “patacones”. Os piqueteiros seguiam nas ruas, com protestos e bloqueio de ruas no centro de Buenos Aires. A fome era uma constante no conurbano bonaerense, e armavam-se bandejões para ajudar os que nada tinham para comer.

Nesse contexto, o populista peronista e liberal Carlos Menem, mesmo depois de ter governado por dois mandatos, quis voltar. A insatisfação com ele e suas políticas eram tão grandes que despontou na Patagônia uma figura até então desconhecida.

Sabendo que ia perder o segundo turno para o apelidado “El Pinguino”, Menem desistiu, e de repente Néstor Kirchner, outro peronista, mais à esquerda, transformou-se no presidente improvável que levantaria a Argentina e fundaria a corrente política predominante no país nos 20 anos seguintes, o kirchnerismo.

Mas, 20 anos depois, o desgaste do kirchnerismo é evidente. Com uma administração desastrosa do governo, a corrupção grassou, e se tornou comum emitir moeda e distribuir subsídios de modo a criar a segunda maior inflação da América Latina, atrás apenas da Venezuela. O interregno do governo de direita de Mauricio Macri também fracassou, terminando com um país endividado até o pescoço.

Na eleição deste domingo, que só encontra uma possível comparação em termos de alta voltagem com a chegada do “desconhecido” Kirchner ao poder em 2003, vivemos uma última semana em que os candidatos jogaram suas últimas cartadas —e foram cartadas bastante arriscadas.

Milei realizou um ato performático em que se mesclou com a imagem de um leão colérico, seu guru econômico praguejou contra o papa Francisco e o Vaticano, os jornalistas foram insultados aos gritos de “filhos da puta”.

Massa, sob a orientação dos marqueteiros brasileiros Sidônio Palmeira, Raul Rabelo e da consultora Macaco Gordo, da Bahia, adotou estratégia semelhante à de Lula (Brasil) e à de Gustavo Petro (Colômbia) alertando para o avanço da extrema direita na região e recorrendo ao nacionalismo peronista, à soberania da moeda, das ilhas Malvinas etc.

Patricia Bullrich apostou na linguagem popular de modo um pouco bruto: “Parem de roubar” e “delinquentes” foram alguns dos termos mais utilizados em seus discursos.

Se antes a Argentina tinha uma “grieta”, uma cisão entre peronistas e não peronistas, agora tem duas, ou mais. Nesta votação, vemos como a chegada de uma terceira força, que passa despercebida ante os olhos das pesquisas tradicionais, pode mudar o jogo político de um país para sempre.

Outra demonstração de que essas eleições são as mais importantes dos últimos 20 anos é que as três forças políticas chamaram muita gente às ruas para acompanhar as votações e, ao final da noite, a apuração dos votos.

Durante o dia, os candidatos obedeceram a planos estratégicos desenhados minuciosamente por seus times. No caso de Milei, seu carro quase foi devorado pela multidão. Impossível que não se soubesse de antemão que o percurso que teria de andar, de uns 20 metros, até o local de sua votação, seria impossível com a multidão aglomerada.

Ao mesmo tempo, Massa esperava que Milei votasse mais rápido para poder dar suas declarações. Não deu certo, e o ministro acabou sendo silenciado pelos meios que colocaram o foco no circo armado em torno de Milei.

As eleições argentinas sempre foram vividas de modo visceral, mas à moda antiga, com intrigas de bastidores e informações plantadas nos meios. Esta, de 2023, nos mostra uma preocupação muito maior com as imagens, com palavras medidas, com mais estrategistas agindo nos dois lados.

Fonte: Folha de São Paulo

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