O perdão que Joe Biden concedeu a seu filho, Hunter, neste domingo (1º), semanas antes do fim de seu mandato, atraiu críticas de opositores e aliados do presidente dos Estados Unidos, como o governador democrata de Colorado, Jared Polis, e o vencedor das eleições de novembro, o republicano Donald Trump.
As reações eram esperadas —a medida representa uma reviravolta na carreira política de Biden, em grande parte construída na ideia de que ele nunca interferiria na justiça, mesmo após se tornar o primeiro presidente americano em exercício a ver um filho condenado em um processo criminal.
Hunter foi condenado em junho por mentir sobre seu uso de drogas para conseguir comprar uma arma em outubro de 2018 e por possui-la ilegalmente por 11 dias. Na ocasião, Biden disse que respeitaria o resultado e que não concederia indulto ao filho.
Em um comunicado, Polis se disse decepcionado e afirmou que a ação abriria um precedente ruim para futuras gestões. Trata-se de uma referência a possíveis indultos de Trump, que, durante a campanha, prometeu mais de uma vez perdoar os condenados pela invasão do Capitólio em janeiro de 2021 que “fossem inocentes”, sem detalhar como isso seria avaliado.
Com essa medida contam algumas das 1.500 pessoas acusadas de crimes relacionados à tentativa de impedir a diplomação de Biden em 6 de janeiro de 2021 —um “dia do amor” em que “nada de errado” aconteceu, afirmou o republicano em outubro.
Não seria surpresa, uma vez que Trump contornou diversas vezes o processo usual para exercer esse poder, embora tenha criticado a medida de seu sucessor. “O perdão dado por Joe a Hunter inclui os reféns de 6 de janeiro, que estão presos há anos? Que abuso e erro da justiça”, escreveu o republicano em sua rede social.
Conceder clemência é uma prerrogativa do presidente americano e, diferentemente do que ocorre no Brasil, não precisa da autorização do Legislativo. Em geral, porém, os políticos na Casa Branca costumam respeitar as etapas mediadas pelo Gabinete do Procurador de Indultos, subordinado ao Departamento de Justiça.
É a esse órgão que recorrem as pessoas que buscam perdão, redução, prorrogação ou remissão de uma pena, em um processo que costuma durar mais de um ano e cuja palavra final é do presidente.
Trump não foi o presidente americano que mais lançou mão desse recurso. Segundo o Pew Research Center, Barack Obama fica na frente de qualquer outro presidente desde Harry Truman, que saiu da Casa Branca em 1953. Obama usou o recurso 1.927 vezes, contra ao menos 237 indultos de Trump.
Algumas clemências de Trump, no entanto, chamaram a atenção justamente por se aplicarem a aliados —especialmente em suas últimas semanas no poder. Em dezembro de 2020, o republicano fez duas rodadas de indultos que chamaram a atenção.
A primeira incluiu congressistas republicanos condenados por corrupção e pessoas condenadas no caso que investigava a suposta interferência russa nas eleições de 2016. Na lista estava George Papadopoulos, que havia sido seu assessor de política externa na campanha.
A segunda rodada incluiu Paul Manafort, diretor da campanha de 2016, Roger Stone, seu amigo e conselheiro informal de longa data, e Charles Kushner, pai de seu genro, Jared.
Os dois primeiros se recusaram a cooperar com promotores durante a investigação da interferência russa, enquanto o terceiro havia sido condenado a dois anos de prisão depois de se declarar culpado, em 2004, de 18 acusações de evasão fiscal, adulteração de testemunhas e doações ilegais para campanha. No último fim de semana, Trump disse que vai nomear Kushner embaixador dos EUA na França.
Na madrugada de 20 de janeiro de 2021, por fim, a horas de deixar a Presidência dos EUA, Trump concedeu uma nova leva de indultos a diversos aliados, entre os quais seu ex-assessor e ideólogo de extrema direita Steve Bannon.
Além de Bannon, Trump também concedeu perdão presidencial a Elliott Broidy, um doador da campanha que confessou ter conspirado para violar leis estrangeiras de lobby político, ao ex-prefeito de Detroit Kwame Kilpatrick, que cumpria pena de 28 anos de prisão por corrupção, e aos rappers Lil Wayne e Kodak Black, condenados por crimes relacionados a posse ilegal de armas.
Antes de Trump, outros presidentes já haviam usado o cargo para perdoar pessoas próximas, embora não de forma tão extensiva.
Em seu último dia no cargo, o presidente Bill Clinton, por exemplo, perdoou seu meio-irmão Roger por antigas acusações relacionadas a posse de cocaína. Já Abraham Lincoln, presidente entre 1861 e 1865, perdoou sua cunhada, Emilie Todd Helm.