Lai Ching-te, 64, do Partido Democrático Progressista (PDP), candidato mais favorável à independência da ilha, saiu na frente na apuração para presidente de Taiwan, com mandato para os próximos quatro anos, em votação realizada neste sábado. A posse só acontece em 20 de maio. Às vésperas da votação, Pequim o declarou um “sério perigo“.
Lai é o atual vice-presidente, e sua eleição representa a terceira vitória seguida inédita para um partido na ilha, desde o primeiro pleito democrático, em 1996. Com 91% dos votos apurados pela Comissão Central da Eleição, Lai somava 40,5%, contra 33,3% de Hou Yu-ih (Kuomintang, KMT) e 26,2% de Ko Wen-je (Partido do Povo de Taiwan, PPT).
Hou e Ko, defensores da retomada dos contatos com a China, chegaram a anunciar uma chapa única, mas acabaram desistindo no início de dezembro, sem acordo sobre quem seria o candidato.
Marcadamente contrário à China, Lai buscou se afastar durante a campanha de declarações anteriores, em que descrevia a si mesmo como “um trabalhador pragmático pela independência”. Passou a dizer que Taiwan já é independente, como República da China, nome oficial da ilha. Mas deslizes na reta final mostraram que sua capacidade de moderação é limitada.
No único debate entre os candidatos, há duas semanas, ele falou que não é possível confiar na Constituição da República da China (Taiwan) para negociar com Pequim, indicando que poderia buscar mudanças. Foi uma divergência frontal com a postura histórica da presidente Tsai Ing-wen, também do PDP, mas de ala mais conciliatória.
“Esse tipo de comentário de Lai no mínimo levanta dúvidas quanto à sua capacidade de manter disciplina ao abordar questões sobre o estreito”, avaliou Amanda Hsiao, analista do “think tank” europeu Crisis Group, durante a transmissão da apuração na TV pública de Taiwan. Foi uma referência ao estreito que separa a ilha do continente.
Para Hsiao, tanto Pequim como Washington vão medir as palavras do presidente eleito, daqui até a posse, “num teste de como Lai se comporta, sobre segurança nacional e outros assuntos”. Ela acredita que o pronunciamento mais significativo, para tanto, será aquele a ser feito no próprio dia 20 de maio.
A eleição foi acompanhada com atenção por China e Estados Unidos, inclusive com uma reunião que tratou do tema em Washington, na véspera, entre o chefe do Departamento Internacional do Partido Comunista, Liu Jianchao, e o secretário de Estado, Antony Blinken.
Em Pequim, também um dia antes, a porta-voz do Ministério do Exterior, Mao Ning, afirmou que, “qualquer que seja o resultado, ele não vai mudar o fato básico de que Taiwan faz parte da China e de que só existe uma China”. Horas antes, o Ministério da Defesa em Pequim havia afirmado que iria “esmagar qualquer plano separatista”.
No final da manhã, o Ministério de Defesa em Taipé voltou a divulgar ter avistado balões, aviões e navios chineses. Por outro lado, levantamento do jornal South China Morning Post, de Hong Kong, apontou que “não houve mudança significativa no padrão” de envio dos equipamentos militares pela China, nos três meses anteriores à eleição.
Analistas políticos projetam que, com a eleição de Lai, Pequim mantenha alguma pressão sobre a ilha, nos próximos meses, mas de forma mais sutil.
Nas primeiras horas da votação, que começou às 8h de sábado (21h de sexta em Brasília), a hashtag Eleição em Taiwan chegou ao alto da rede social chinesa Weibo, com mensagens em apoio à reaproximação. Mas ela acabou derrubada, passando a entrar o aviso de que “o conteúdo deste tópico não está sendo exibido, de acordo com as normas”.
As urnas foram fechadas às 16h (5h em Brasília). Ao longo do dia, os candidatos votaram sem incidentes nos seus distritos, Lai em Tainan, cidade no sul da ilha; Hou em Nova Taipé, onde é prefeito, e Ko em Taipé, a capital taiwanesa, onde foi prefeito, duas cidades no norte.
O atual prefeito de Taipé, Chiang Wan-an, do KMT, votou na capital com o vice de Hou, Jaw Shaw-kang, uma celebridade de televisão. Bisneto do ex-líder Chiang Kai-shek, ele poderia assumir a liderança do partido, a partir de agora.