Joe Biden parecia excessivamente cansado e com a fala confusa ao ser entrevistado pelos jornalistas que o acompanhavam a bordo do avião presidencial americano. O democrata voltava a Washington depois da curta viagem a Israel no momento mais delicado do país em décadas.
Pronunciando lentamente as palavras e com longas pausas, Biden se referiu aos massacres em que as vítimas são mortas por armas de fogo. Ele disse que há muito tempo acreditava em algo, mas a sequência da frase é inaudível. Referiu-se à necessidade de as pessoas “pegarem” ou demonstrarem algo, mas tampouco está claro ao que se referia.
A CNN, que participou da entrevista, deu a entender que em outro momento —não no 1’38” do vídeo que a emissora levou ao ar— Biden disse estar satisfeito por ter conseguido desbloquear a entrada da ajuda humanitária na Faixa de Gaza, submetida à reação militar israelense depois dos “ataques terroristas horríveis do Hamas“.
Bem antes do conflito de Gaza e da viagem de Biden a Israel, a BBC publicou um podcast sobre os efeitos da idade avançada na rotina do presidente e seus planos de disputar novamente a Casa Branca. Caso seja reeleito em novembro de 2024, Biden estará completando 82 anos. E chegará ao fim de seu eventual segundo mandato com 86. Será o mais idoso dos presidentes da história dos Estados Unidos.
Três quartos dos eleitores dizem acreditar que Biden não deveria disputar uma nova eleição. Mas, dentro do Partido Democrata ele é a alternativa para derrotar Donald Trump —que, por sua vez, se for eleito em 2024, tomará posse com 77 anos e governará até os 81.
Comparemos: um dos mais populares presidentes dos EUA no século 20 foi John Kennedy. Ele tinha 44 anos ao tomar posse em 1961 e teria concluído seu mandato com 48, caso não tivesse sido assassinado em 1963.
Especialista em estratégia eleitoral do Partido Republicano, Scott Jennings diz no podcast que o problema da idade é levantado desde que Biden tomou posse. “O eleitor nota que ele dá sinais frequentes de cansaço” —parte dos republicanos se refere a Biden como “sleepy Joe” (Joe dorminhoco).
Não é o que pensa Christy Setzer, do Partido Democrata. “A idade será um tema menor na campanha eleitoral do ano que vem”, diz.
Diante de diagnósticos contraditórios, quem desempata é James Politi, chefe da sucursal em Washington do jornal britânico Financial Times. Ele diz que a velhice entrou há meses na pauta política, quando Biden perdeu o equilíbrio e caiu durante uma solenidade militar no Colorado.
Caso se recandidate, diz o jornalista, o presidente com certeza fará um discurso no qual associará a idade a atributos positivos, como a maturidade necessária para tomar decisões. Poderá também insistir na parceria que faz com sua vice, Kamala Harris, que está completando 59 anos —proporcionalmente uma mocinha.
Jay Olshansky é professor de saúde pública na Universidade de Illinois, em Chicago. Ele diz no podcast que, pelo prontuário médico dos candidatos, Trump é o mais predisposto a alguma desagradável surpresa coronária. Biden se exercita e não está psicologicamente estressado por processos judiciais como seu adversário republicano. No entanto, ambos necessitam de poucos medicamentos e demonstram uma agilidade física e mental de alguém com dez ou vinte anos a menos.
A propósito, o republicano Scott Jennings assinala que a saúde de Biden está bem mais exposta que a de Trump porque ele, como presidente, aparece com mais frequência na televisão. E a rotina presidencial é bastante carregada. “Na Casa Branca, ele trabalha bem mais que um deputado ou um senador. Ser chefe do Executivo é bem pior que exercer um emprego em tempo parcial.”
Um dos aspectos evocados no podcast foi o da adequação de Biden ao que os eleitores esperam dele. A economia americana vai bem, e o Executivo conseguiu até agora aprovar no Congresso o que é de seu interesse. Isso conta bem mais que a idade, embora ninguém garanta que a imagem do presidente como um ancião decrépito possa surgir nos comerciais veiculados na TV durante a campanha. O jogo é pesado e sujo.
Por fim, a BBC também ouviu Amanda Litman, fundadora de uma ONG que estimula pessoas jovens a disputarem cargos públicos. Ela não critica diretamente Biden e Trump, mas constata que os Estados Unidos atravessam uma tendência “gerontocrática” contra a qual a sociedade precisa agir.