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China observa a eleição turbulenta dos Estados Unidos – 08/08/2024 – Ian Bremmer

Como a liderança do Partido Comunista Chinês reagirá à eleição altamente imprevisível nos EUA? Os líderes chineses estão convencidos de que um dos poucos pontos em que os republicanos e democratas americanos concordam é o desejo de frear o crescimento natural da China e a expansão legítima de sua influência.

Segundo Pequim, os dois partidos discordam apenas sobre quais armas políticas e econômicas usar, além de como e quando usá-las. Essa visão de Pequim não deve surpreender Washington. Afinal, o presidente Biden seguiu a toada de Trump no poder, com novas tarifas, novas restrições tecnológicas e uma expansão de alianças anti-China com parceiros como Japão, Coreia do Sul, Austrália e até Índia.

Mas parece que a preparação da China para mudanças em Washington se concentra em adaptar-se para enfrentar os desafios criados por um possível segundo mandato de Donald Trump. Por enquanto, Trump continua sendo o favorito para vencer a eleição nos EUA, e Pequim sabe que a preparação antecipada é mais crucial para um novo governo Trump do que para um governo de Kamala Harris.

No momento, o desejo de Pequim por estabilidade, tanto nas relações com Washington quanto no sistema internacional de forma mais geral, permanece forte, pois a economia chinesa está lenta para se recuperar dos traumas infligidos pelas políticas de lockdown draconianas durante a pandemia.

Oficialmente, autoridades da China afirmam que o fechamento dos mercados dos EUA, mais provável se Trump voltar à Casa Branca, forçaria uma intensificação da tentativa chinesa de fortalecer seus próprios mercados consumidores e uma mudança para outros mercados estrangeiros. Por enquanto, a China parece pouco disposta a intensificar uma guerra comercial que considera provável.

A China estabeleceu as bases para uma melhor comunicação entre os governos e militares chineses e americanos. Mas as autoridades do Partido Comunista Chinês também estão tentando descobrir se as mais recentes ameaças de Trump, de 60% de tarifas sobre todas as exportações chinesas, são uma promessa aos eleitores que ele pretende cumprir —nesse caso como parte de uma estratégia mais ampla de desvinculação —ou uma tática de negociação destinada a pressionar Pequim por melhores termos comerciais e de investimento.

Sua maior preocupação é que Trump possa revogar o status de Relações Comerciais Normais Permanentes da China, uma medida que equivaleria a uma reversão do acordo que levou o país a ingressar na OMC, a base do crescimento chinês e das relações econômicas EUA-China por mais de uma geração.

Pequim poderia simplesmente tentar suportar a dor imposta pelos primeiros movimentos de Trump contra a economia da China, na esperança de que uma combinação de fraqueza econômica americana e a falta de vontade chinesa de lutar possam persuadir Trump a escolher outro alvo para pressão internacional.

A China também poderia buscar ajuda de outros países, especialmente na Ásia, que são aliados dos EUA, mas ainda dependentes de boas relações econômicas com Pequim. Em troca de oferecer a esses países maior acesso aos mercados chineses, a China os pressionaria a fazer lobby na Casa Branca de Trump por uma abordagem menos conflituosa (e/ou se voltar para Pequim caso se sintam antagonizados pelas políticas de “América Primeiro” de Trump).

Mas absorver mais dor econômica em um momento de crescimento já fraco arrisca alienar os consumidores chineses, que podem parar de culpar os funcionários locais por uma economia fraca e direcionar sua raiva para a liderança do Partido Comunista.

A maior preocupação é se os líderes chineses decidirem que a estratégia de engajamento limitado do ano passado não produziu bons resultados, e que o próximo presidente hostil dos EUA estará sempre a uma eleição de distância. Se for esse o caso, a China pode responder à pressão econômica do governo Trump (ou Harris) com uma política de segurança mais assertiva.

Se os EUA realmente se tornarem mais agressivos na desvinculação da economia chinesa, Washington teria menos poder para pressionar Pequim a recuar de sua campanha de pressão militar e diplomática contra Taiwan.

A China também poderia adotar uma abordagem mais amigável, com o intuito de tornar menos popular politicamente a ação contrária dos EUA. Se Pequim se comprometesse a investir na produção e criação de empregos em solo americano e, além disso, negociasse um acordo para limitar a expansão do mercado global a um nível mutuamente aceitável, a China poderia criar uma nova alavanca para influenciar o futuro da política dos EUA.

As autoridades chinesas, por outro lado, estão bem cientes de que Trump pode ver movimentos como esses como um sinal de fraqueza da China e intensificar sua estratégia de pressão. Mesmo que Trump ou Kamala chegassem a um acordo desse tipo, não há garantia de que o próximo presidente dos EUA não o rasgaria e exigiria um novo.

Também não está claro se é vantajoso para a China se alinhar mais de perto às posições dos EUA nas guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, pois o fim desses conflitos poderia permitir que Washington direcionasse muito mais de sua atenção indesejada para “ser duro com a China”.

O cenário mais provável para 2025 é um período de tensão no qual a liderança da China e uma nova administração em Washington avaliam as forças e fraquezas um do outro. Talvez o melhor que cada lado possa esperar é que a incerteza econômica contínua, tanto em Washington quanto em Pequim, impulsione uma limitação pragmática de danos adicionais para o relacionamento bilateral mais importante do mundo.


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Fonte: Folha de São Paulo

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