O Brasil deve voltar a pleitear a divulgação de atas de votação e cobrar transparência por parte da Venezuela em reunião extraordinária da OEA (Organização dos Estados Americanos) marcada para esta quarta-feira (31). O país, por outro lado, descarta se unir a qualquer iniciativa do órgão que busque condenar Nicolás Maduro.
Embora a lisura das eleições venezuelanas seja questionada, o entendimento entre diplomatas brasileiros é o de que é preciso manter um canal de diálogo aberto para ajudar a solucionar conflitos —inclusive entre países que hoje não dialogam com o regime de Maduro.
Nesta semana, manifestantes chavistas ameaçaram invadir a Embaixada da Argentina em Caracas. Graças à intervenção brasileira, foram dissuadidos.
Atualmente, o Estado brasileiro tem como representante permanente junto à OEA o embaixador Benoni Belli. Na reunião convocada pelo Conselho Permanente do órgão, ele deve reforçar que é preciso divulgar os dados eleitorais para sanar dúvidas e para que haja tranquilidade em relação ao resultado do pleito.
Há, na diplomacia brasileira, a compreensão de que a OEA tem pouca influência sobre a Venezuela, e que uma condenação coletiva por parte de seus membros tampouco seria positiva.
O descrédito é atribuído, principalmente, à atuação do secretário-geral do órgão, Luis Almagro. Nos últimos anos, ele se alinhou e reconheceu a Presidência autoproclamada de Juan Guaidó, defendeu a imposição de sanções contra o governo venezuelano e sugeriu uma intervenção armada no território.
Nas palavras de um diplomata ouvido pela coluna, o dirigente da OEA se colocou ao lado de uma oposição que nem sempre é democrática, e com isso perdeu qualquer poder de intermediação.
Integrantes do Itamaraty argumentam que, em um cenário conflagrado como o venezuelano, a cautela é fundamental para não encerrar qualquer oportunidade de diálogo.
Afirmam, ainda, que o fato de o Brasil insistir na divulgação das atas é uma cobrança importante e, até então, incomum para as gestões petistas.
Mais que um pedido, a demada seria uma sinalização de que o regime de Maduro não tem carta-branca, apesar da declaração feita por Lula (PT) minimizando a tensão.
Um endosso do Brasil a um texto do Conselho Permanente da OEA com críticas moderadas à Venezuela não é descartado, mas dificilmente deve haver consenso na reunião desta quarta-feira.
Argentina, Peru e Equador são alguns dos países que cobram uma reprimenda mais dura, enquanto Honduras, Bolívia e São Vicente e Granadinas já parabenizaram Maduro.
O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, rejeitou participar da reunião extraordinária convocada para falar sobre a Venezuela.
AMLO, como é conhecido, afirmou que ficaria de fora por não concordar “com a atitude de parcialidade da OEA” —na terça-feira (30), o gabinete de Almagro divulgou um comunicado afirmando que a Venezuela sofreu sua “mais aberrante manipulação”.
Como mostrou a Folha, o Carter Center, um dos únicos e o mais importante observador eleitoral independente nas eleições da Venezuela, afirmou que o processo no país de Maduro não pode ser considerado democrático.
“O processo eleitoral não alcançou patamares internacionais de integridade eleitoral em nenhuma de suas etapas relevantes e infringiu inúmeros preceitos da própria legislação nacional”, disse a organização americana, que foi convidada pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral), de maioria chavista, e enviou 17 especialistas ao país.
Maduro foi declarado eleito pelo CNE em um comunicado geral que afirma que apenas 80% dos votos foram computados. O órgão atribui 51,2% dos votos a Maduro e 44,2% para o opositor Edmundo González.
“Foi um processo que ocorreu em um ambiente de restrição de liberdades contra atores políticos, organizações da sociedade civil e meios de comunicação”, diz o Carter Center, que ainda publicará seu relatório oficial.
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
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