Um sentimento se dissemina entre a maioria dos libaneses: o de que em algum momento Israel vai invadir o país. Há dois dias, pelo menos, as prateleiras dos supermercados de áreas como Hamra, um bairro multicultural e diverso, estão se esvaziando de produtos essenciais, sob a expectativa de desabastecimento. A água mineral desapareceu. Já faltam itens como óleo, pão pré-assado e enlatados.
O trânsito na rua Baalbak, paralela à movimentada avenida Hamra, é caótico e intenso, agravado pela estreiteza da via. Ambulâncias circulam sem parar ao longo do dia, sem um destino claramente definido. Deslocados que vieram do sul e se hospedaram nos hotéis da região caminham apressados, perdidos em meio à desorientação do local. Na área de Hamra, as ruas estão tomadas de pessoas que fogem dos ataques de Israel. Segundo governo, mais de 1 milhão já se deslocaram internamente ou buscaram refúgio em outros países.
“Não me preocupam as ameaças. Todos conhecemos o que aconteceu na última guerra. Os sionistas perderam em sua tentativa de invasão e fugiram porque não resistem ao poder do Hezbollah“, disse Mahdi, um xiita de Haret Hreik, no sul do país, que está de luto pelo assassinato de seu líder, Hassan Nasrallah.
A declaração de Mahdi reflete o discurso de Naim Qassem, número dois da milícia extremista, feito nesta segunda-feira (30), no qual afirmou que os combatentes do grupo xiita estão prontos para defender o território caso Israel lance uma ofensiva terrestre.
A rotina em Beirute tem sido de constante alerta. Nesta segunda, um estrondo ecoou pela cidade quando dois andares de um prédio foram destruídos por um drone, que matou três líderes da Frente Popular para a Libertação da Palestina na região de Kola —próximo a um terminal de ônibus e a poucos metros da Universidade Árabe de Beirute e do campo de refugiados Mar Elias, conhecido por abrigar palestinos cristãos desde sua criação pela Igreja Ortodoxa em 1952.
Esse ataque aumentou a tensão entre os moradores desde as primeiras horas do dia. “Não há para onde ir. Este é o nosso país. Se houver uma invasão, teremos que confiar no Hezbollah e nos líderes da resistência”, diz Mohammed, fumando enquanto se apoia na grade do calçadão da Corniche, à beira-mar.
Ele veio de Seddiqine —ao sul da cidade costeira de Tiro—, está hospedado em um hotel lotado de deslocados com sua esposa e seus quatro filhos e, após dois dias de viagem, está aguardando parentes para se mudar para uma vila perto de Trípoli, no norte.
“Como vamos estar preparados para outra invasão terrestre? Eu vivi todas as guerras. Além disso, nossa situação econômica está muito deteriorada após a Covid”, afirma Arslan, um comerciante de origem drusa, que não simpatiza com as milícias xiitas e as responsabiliza por esta situação. Resta saber qual será a estratégia da milícia xiita, que tem se preparado por anos para este confronto.