O Kremlin afirmou nesta quarta (30) que a investigação sobre a queda do avião do líder mercenário Ievguêni Prigojin considera a possibilidade de o jato ter sido derrubado em uma ação deliberada.
“É óbvio que diferentes versões estão sendo consideradas, inclusive a versão, e você sabe do que eu estou falando, digamos, de uma atrocidade deliberada”, disse o porta-voz Dmitri Peskov em sua conversa diária com repórteres.
Prigojin, seu adjunto Dmitri Utkin e outras oito pessoas morreram na quarta passada (23), quando o jato executivo Embraer Legacy 600 em que voavam caiu abruptamente no meio do caminho entre Moscou e São Petersburgo.
Os padrões de voo registrados por sites de monitoramento aéreo indicam que houve algum evento catastrófico a bordo, levando a uma queda vertical após 32 segundos de instabilidade. Países como os Estados Unidos e a Ucrânia imediatamente apontaram o presidente Vladimir Putin como principal suspeito do crime.
Prigojin, afinal, era um aliado próximo do presidente até desentender-se com a cúpula militar russa acerca da competição entre o seu Grupo Wagner e forças regulares em ação na Guerra da Ucrânia. No fim de junho, a crise desandou em um motim que visava derrubar a chefia das Forças Armadas, abortado no seu primeiro dia, mas que expôs publicamente Putin da forma mais humilhante em suas duas décadas de poder.
Peskov chamou a hipótese, sustentada pela longa coleção de mortos em condições suspeitas ou assassinados entre desafetos do Kremlin, de mentira absoluta.
Os EUA descartaram, presumivelmente devido à análise de seu monitoramento de lançamentos na Rússia, o emprego de um míssil antiaéreo, o que teoricamente só poderia ser feito por forças do Kremlin —embora a versão também isente eventuais ações de infiltrados no território russo.
O cipoal de suposições seguirá denso, até porque é a Rússia que comanda as informações acerca da investigação da queda da aeronave.
Também nesta quarta, Peskov afirmou que não há chance de participação estrangeira “numa investigação russa”. Ele se referia ao relato, adiantado pela agência Reuters e confirmado pela Folha, de que Moscou não iria solicitar apoio à apuração às autoridades brasileiras.
Isso seria a praxe, já que o jato em que Prigojin morreu foi fabricado no Brasil. Segundo o anexo 13 da convenção da Icao (Organização Internacional de Aviação Civil, na sigla inglesa), que é assinada tanto por Brasília quanto por Moscou, a recomendação era a da participação da Embraer na análise do caso.
Não há obrigatoriedade, contudo. O avião específico não recebia manutenção da fabricante brasileira desde que entrou em uma lista de sanções dos EUA em 2019.
Prigojin foi enterrado na terça (29) em um cemitério nos arredores de sua cidade natal, São Petersburgo, onde também nasceu Putin, com quem se relacionava desde os anos 1990. O funeral foi fechado, e não se sabe se houve honras militares a que tinha direito por ter a medalha de Herói da Rússia, mais alta condecoração do país.
Nesta quarta começaram as visitas de membros do Wagner e outros admiradores de Prigojin ao túmulo, ainda uma cova simples ornada com uma cruz ortodoxa de madeira. Como ocorre em cemitérios do grupo, ela deverá ser substituída por uma pirâmide pequena de granito.
A luta pelo espólio militar e econômico do Wagner continua, com Putin fazendo o papel de mediador. O grupo tem presença em pelo menos sete países africanos e na Síria. Após o motim, seu núcleo foi exilado em Belarus, ditadura amiga da Rússia que mediou o fim da rebelião.