Horas depois de o presidente da Argentina, Javier Milei, anunciar que pretendia cortar mais 70 mil funcionários públicos, seu porta-voz, Manuel Adorni, afirmou que, “por enquanto”, serão 15 mil os funcionários dispensados. Esses contratos vencem no próximo domingo (31) e não serão renovados.
Adorni esclareceu em sua entrevista coletiva diária nesta quarta (27) que o número citado pelo mandatário é o total de postos de trabalho temporários que estão em análise pelo governo, como parte do seu “plano motosserra” para reduzir os gastos públicos, zerar o déficit e baixar a inflação no país.
Em dezembro, a Casa Rosada já havia anunciado o corte de outros 5 mil servidores temporários cujos contratos venciam naquele mês, afirmando que o restante seria revisado nos três meses seguintes. Agora, a gestão decidiu cortar mais 15 mil e renovar o restante por seis meses para continuar as análises.
“Houve bastante confusão [sobre os números]”, declarou o porta-voz em entrevista coletiva, sem citar erro do presidente. “O objetivo é chegar ao que corresponde. Se são 70 mil, que sejam 70 mil, se ficarmos em 15 mil, que sejam 15 mil. O trabalho é extremamente cirúrgico para não cometer erros e para que ninguém que não mereça perca seu emprego.”
A fala de Milei se deu em um evento de negócios em Buenos Aires nesta terça (26), no qual ele disse que “estão caindo mais contratos, e vão cair 70 mil contratos” federais. Apesar de alto, o número representa apenas 2% dos 3,4 milhões de trabalhadores do setor público da Argentina no total.
Por enquanto, o ultraliberal ainda conta com popularidade elevada para fazer seus ajustes, mas as medidas também geram forte resistência por outra parte da sociedade. O líder sindical Rodolfo Aguiar, da ATE Nacional (Associação de Trabalhadores do Estado), falou em nova paralisação geral após o anúncio.
“Eles querem nos encurralar para que […] não falemos sobre o enfrentamento do maior ajuste salarial dos últimos tempos e, com ele, o grave deterioro de todas as condições de vida dos trabalhadores e aposentados. Vamos continuar lutando e multiplicando os protestos para impedir qualquer demissão ilegal e injustificada na administração pública”, escreveu no X.
Apesar do aumento da pobreza, Milei não dá sinais de recuo. No evento desta terça, listou outros cortes de gastos que fez até agora: eliminou as obras públicas (“algo de que se sente profundamente orgulhoso”), reduziu transferências às províncias e retirou mais de 200 mil planos de seguridade social que classificou como irregulares.
“Há muito mais motosserra” discursou, dizendo que espera uma recuperação econômica em forma de “V”. Ele argumentou que “em nenhum momento descuidou da política social”, citando a duplicação ou triplicação dos valores transferidos às famílias mais pobres.
No discurso, Milei ainda citou pesquisas que mostram que os argentinos estão mais otimistas sobre o futuro da economia, e um indicador recente de confiança no governo aumentou apesar de suas medidas de austeridade. “As pessoas têm esperança, estão vendo a luz no fim do túnel”, concluiu.
Quanto ao câmbio, o ultraliberal classificou de “ridículos” os apelos por uma nova desvalorização drástica do peso —medida que fez os preços dispararem no país em dezembro— e disse que os contratos futuros estão alinhados com o modelo de depreciação progressiva do Banco Central, conhecido como “crawling peg”.
Ele acrescentou que o Banco Central argentino caminha para alcançar reservas de dólar neutras, comparado a um cenário de dezembro em que os caixas públicos estavam no vermelho em US$ 11,5 bilhões (mais de R$ 50 bilhões).
Por fim, descreveu a rejeição de seu megadecreto de desregulação da economia no Senado neste mês como “maravilhosa”, porque deixou expostos “todos os dedos sujos” de políticos que ele chama de “delinquentes”. A norma segue em vigor e só deixará de valer caso a Câmara também a rejeite por inteiro.
Milei acrescentou, por fim, que seus esforços para reformar a economia argentina serão redobrados após as eleições parlamentares de 2025, com mais de 3.000 reformas nos planos do governo, segundo ele.