A reação da ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela ao veto do Brasil à entrada do país vizinho no Brics é “totalmente desproporcional”, de acordo com Celso Amorim, assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assuntos internacionais.
“A reação que tem havido à entrada da Venezuela no Brics é uma reação totalmente desproporcional, cheia de acusações ao presidente Lula e à chancelaria”, afirmou o ex-chanceler, que foi enviado do governo federal à eleição venezuelana em julho.
O regime Maduro criticou duramente o governo Lula e o Itamaraty desde que o Brasil bloqueou o ingresso de Caracas no grupo na última cúpula em Kazan, na Rússia. A organização reúne, além de Brasil e Rússia, China, Índia, África do Sul e outros membros recentes, como Irã, Emirados Árabes Unidos, Egito e Etiópia —Arábia Saudita foi convidada, mas não formalizou o ingresso.
“A chancelaria brasileira decidiu manter o veto que Jair Bolsonaro aplicou contra a Venezuela durante anos, reproduzindo o ódio, exclusão e intolerância promovidos a partir dos centros de poder do Ocidente”, afirmou o Ministério das Relações Exteriores venezuelano em nota na ocasião.
Para Caracas, o veto brasileiro “constitui uma agressão e um gesto hostil que se soma à política criminosa de sanções que foram impostas contra o povo valente e revolucionário da Venezuela”.
Maduro chegou a dizer que o Itamaraty é um órgão vinculado ao governo dos Estados Unidos nesta segunda (28). O ditador gastou 40 minutos das 2h30 de seu programa semanal, o Con Maduro Más, para falar sobre as relações com o Brasil, e chamou o veto de “facada nas costas”.
Amorim participa a convite de audiência da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional para comentar as posições do governo brasileiro sobre o pleito em Caracas.
O embaixador afirmou ainda que a conciliação da Venezuela não vai se resolver com uma única eleição, e que o governo brasileiro espera que ocorram eleições parlamentares e regionais no país, previstas para 2025.
Perguntado por deputados presentes se considerava o regime Maduro uma ditadura, Amorim ressaltou que a interlocução com Caracas diminuiu desde as eleições, mas disse que não classifica países dessa forma.
“Hoje somos muito críticos à Venezuela, mas não é um esporte rentável ficar classificando países, porque as coisas podem mudar, e podemos ajudar que mudem se formos comedidos na linguagem”, disse.
O presidente Lula também evita o termo. Em meados de agosto, o petista afirmou que o regime de Caracas tinha “viés autoritário”.
“Não acho que é uma ditadura. É diferente de ditadura. É um governo com viés autoritário, mas não é uma ditadura como conhecemos nesse mundo”, afirmou Lula em entrevista.
Amorim afirma ainda que perguntou sobre as atas da eleição a Maduro, em reunião que teria durado cerca de uma hora no Palácio de Miraflores após o pleito. De acordo com o embaixador, o ditador disse que as atas seriam publicadas nos próximos dias, “como sempre ocorre”.
“Isso não ocorreu. Investimos muito em uma eleição isenta, e esses fatores criaram um mal-estar. Há um mal-estar hoje no governo [com Caracas]. Torço para que desapareça”, disse Amorim.
Em sua ida à Venezuela, o embaixador afirma ter se reunido também com Edmundo González, candidato da oposição que hoje está exilado na Espanha e questionou os resultados do pleito.
Edmundo chegou a ser alvo de mandado de prisão no início de setembro. O Ministério Público venezuelano, alinhado ao regime de Maduro, ordenou a prisão do opositor sob acusação de desobediência das leis, falsificação de documentos públicos, conspiração usurpação de funções e sabotagem —acusações que poderiam resultar em até 30 anos de prisão.
À época, Amorim afirmou que não havia “como negar que há uma escalada autoritária na Venezuela. Não vemos abertura ao diálogo e há forte reação [de Caracas] a qualquer comentário”.