“Sou o crítico mais agressivo do Islã na história. Se você não acredita em mim, pergunte aos árabes.”
Taleb Al A., 50, o médico que atropelou dezenas de pessoas, matou ao menos quatro e foi preso pela polícia em um mercado de Natal em Magdeburgo, na Alemanha, nesta sexta-feira (20), era um conhecido ativista anti-islã, com 40 mil seguidores no X, e simpatizante da extrema direita do país. O ataque é investigado como terrorismo.
O perfil do suspeito pelo ataque, que as autoridades e a imprensa alemã não publicam o sobrenome por questões legais e de privacidade, intriga as autoridades, já que não se encaixa na figura típica de terrorista. A frase que abre este texto é de uma entrevista dada por Taleb, em 2019, ao Frankfurter Allgemeine Zeitung, que o jornal econômico decidiu republicar neste sábado.
O médico, então, falava como ativista, que denunciava a opressão do regime saudita aos seus cidadãos, notadamente às mulheres. Afirmava também que a perseguição a quem não se mantivesse conectado aos preceitos do Islã era intensa, inclusive no exterior.
“Até há alguns anos, quase ninguém da população civil saudita sabia que existia um caminho para a liberdade: o asilo. Fui o primeiro a fornecer informações aos requerentes de asilo sauditas, primeiro no Twitter, depois no Telegram”, afirma Taleb.
Ele explica as razões de ter pedido asilo na Alemanha em 2016 dez anos depois de ter chegado ao país e mesmo tendo residência e trabalho. A pressão que sofria de seu grupo social teria se tornado insuportável, descreve. “Eu não podia dizer a eles que não iria mais à mesquita. Os muçulmanos aqui tratam pessoas como eu, que têm origem islâmica mas não são mais crentes, sem compreensão nem tolerância.”
Como Taleb passou do ativismo anti-Islã ao ponto de cometer um ataque normalmente imputado ao objeto de suas críticas é o desafio das autoridades neste momento. Sua atuação anti-Islã era conhecida, a ponto de ter sido procurado para a entrevista e merecido um alerta da Arábia Saudita para a Alemanha sobre seu comportamento _na verdade, dizendo que ele seria um risco aos muçulmanos no país.
As últimas postagens do médico são ainda mais incongruentes com o desfecho do ataque. Ele reclamava da “Alemanha que está se islamizando” e tecia elogios a Alice Weidel, candidata a premiê pela AfD, o partido de extrema direita, conhecido pela retórica agressiva anti-imigração. Até o bilionário Elon Musk ganhava afagos. O cabo eleitoral de Donald Trump agora opina no X sobre as eleições alemãs, com elogios à AfD e provocações ao primeiro-ministro Olaf Scholz.
A trajetória incomum de Taleb nas redes sociais sugere problemas de saúde mental, disseram alguns analistas ouvidos pela imprensa alemã. As autoridades já são criticadas por não terem detectado o comportamento peculiar do médico, que usava um rifle estilo AR-15 como imagem de perfil em sua rede social.
Scholz e outros políticos alemães, incluindo integrantes da oposição, como Friedrich Merz, participam de missa em homenagem às vítimas em Magdeburgo neste sábado (16). Pela manhã, vistoriaram o local do ataque, no centro da cidade.
Os quatro mortos incluem um bebê. Há dezenas de feridos graves, e o número de vítimas pode aumentar. A cidade está tomada por forças de segurança.
Alguns mercados de Natal, uma tradição na Alemanha desde a Idade Média, foram cancelados neste fim de semana no país. Outros tiveram a segurança reforçada e anunciam homenagens aos afetados pelo ataque na capital do estado da Saxônia-Anhalt.