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Carta aberta a Rebeca Andrade – 07/08/2024 – José Manuel Diogo

Prezada Rebeca,

O espírito olímpico é a personificação da superação e da união, um ícone da esperança que transcende fronteiras e celebra a capacidade humana de vencer desafios. As Olimpíadas não são apenas uma competição esportiva; elas são como um altar, capazes de definir conceitos para a humanidade. Sua presença em Paris, querida Rebeca, é o testemunho vivo desse espírito transformador. Quero dizer-lhe porquê.

A icônica imagem —que o futuro sempre celebrará— em que você recebe homenagens de suas colegas ginastas americanas é tão poderosa quanto aquelas das vitórias de Jesse Owens nos Jogos Olímpicos de 1936 em Berlim. Assim como Owens quebrou barreiras raciais e desafiou o regime opressor de Hitler e da Alemanha nazista, também você está escrevendo uma nova página na história.

Um pódio da ginástica olímpica composto apenas por mulheres negras seria por si só um feito. Mas o gesto dessas ginastas, vindas do Norte, reverenciando você, uma mulher do Sul, é um símbolo de transformação na humanidade.

Desde o primeiro salto até a aterrissagem perfeita, você não apenas desafiou as leis da física, mas também quebrou barreiras sociais e culturais. Cada movimento seu foi testemunho da força e da resiliência humanas e uma ode à perseverança e ao talento. Seu pódio, engrandecido pela simultânea vênia das americanas, não é só um cumprimento, é símbolo de um ponto de virada histórico.

O Norte prestando homenagem ao Sul não é apenas uma celebração de sua vitória pessoal, mas um marco significativo na luta por reconhecimento e valorização das mulheres, das mulheres negras, e especialmente daquelas do Sul Global.

“Citius, Altius, Fortius” —mais rápido, mais alto, mais forte. Este lema olímpico nunca foi tão bem representado como em suas conquistas. Você, Rebeca, é mais do que uma campeã olímpica; é um símbolo de esperança e mudança e, por isso, sua vitória não é apenas sua, é a vitória de todas as mulheres que lutam por um lugar de destaque e reconhecimento em uma sociedade que muitas vezes as negligencia. Quantas são mesmo as medalhas masculinas que o Brasil conseguiu até agora?

Quando vejo você subir ao pódio, mais do que medalhas, vejo a representação de um futuro mais igualitário, onde as oportunidades não são determinadas pelo gênero ou pela cor da pele, mas pelo talento e pelo esforço. Vejo a celebração da diversidade e da inclusão.

Você nos mostra que, com determinação, qualquer sonho é possível, independentemente das circunstâncias iniciais. E, ao fazê-lo, inspira não só meninas e mulheres no Brasil, mas pessoas em todo o mundo, inclusive a mim, branco, normativo, mas que procuro melhorar o legado trágico dos meus antepassados. O espírito olímpico é, em sua essência, transformador da humanidade. E você é esse espírito.

Ave Rebeca, “morituri te salutant”, aqueles que estão prestes a morrer a saúdam. Você continuará a brilhar, não mais apenas como uma estrela do esporte, mas como um farol de mudança e inspiração para toda a humanidade.

Com profunda admiração e gratidão,

José Manuel


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Fonte: Folha de São Paulo

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