Uma projeção independente com base em amostragem de votos na Venezuela, liderada por pesquisadores brasileiros, mostra o opositor Edmundo González com 66,7% nas eleições presidenciais realizadas no domingo (28), ante 30,7% para o ditador Nicolás Maduro. A margem de erro é de 0,6 ponto porcentual, e a confiança, de 95%.
O levantamento foi produzido durante o processo de apuração no país, mas divulgado apenas após serem anunciados os números oficiais do órgão eleitoral, que declarou vitória de Maduro com 51,2% dos votos, contra 44,2% para González, ao que se seguiram acusações de fraude.
A oposição afirmou que teria atas que projetavam vitória do ex-diplomata com 70% dos votos, mas tampouco detalhou.
O levantamento e a validação da metodologia foram liderados, entre outros, por Dalson Figueiredo, professor associado de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e Raphael Nishimura, do Instituto de Pesquisa Social da Universidade de Michigan, ambos com ampla experiência em amostragem eleitoral.
A equipe foi convidada para o projeto por uma ONG venezuelana de Caracas para realizar a projeção. A organização, cujo nome não é divulgado publicamente porque sua liderança teme retaliação do regime de Maduro, identifica-se como opositora da ditadura.
A pesquisa não foi financiada pela oposição, e sim por verba de uma fundação europeia de origem sueca cujo nome os organizadores também pedem que não seja divulgado para evitar que por meio dela se descubra o nome da organização local.
Ao longo dos últimos meses, os pesquisadores coletaram as bases de dados de quatro eleições anteriores na Venezuela para identificar mesas de votação que tendiam a ser mais chavistas ou mais opositoras e, com isso, selecionar uma amostra a ser analisada que não pendesse mais para um lado ou para o outro.
“Os dados históricos ajudam a selecionar quais urnas averiguar”, explica Nishimura. “Se escolhermos de maneira aleatória, podemos ter uma amostragem que só tenha peso para a oposição, ou apenas para o governo.”
Disso, foram selecionadas 1.500 mesas de votação —são 30 mil no país—, uma amostra que é considerada robusta por especialistas. A ideia dos pesquisadores era que, após o fechamento das urnas, sua equipe em campo obtivesse as atas eleitorais que, segundo o regramento eleitoral local, devem ser divulgadas para as testemunhas da mesa.
Isso ocorreu, mas não para todas as atas. Das 1.500 buscadas pelo projeto, apenas 700 foram divulgadas ao longo do domingo, uma amostra ainda considerada ampla para extrapolar seus resultados.
A campanha da coalizão opositora tem afirmado que o regime impediu a divulgação de mais da metade das atas eleitorais. O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) tampouco as publicou em seu sistema online e tem sido pressionado a fazê-lo por países como o Brasil.
Para enxugar sua amostragem, os pesquisadores usaram dados da eleição presidencial de 2013, quando Maduro foi eleito por margem microscópica após já assumir a Presidência em consequência da morte de Hugo Chávez; as eleições legislativas de 2015 e de 2020 e as eleições regionais de 2021.
Com isso, as milhares de mesas de votação foram classificadas em uma escala de sete diferentes perfis, sendo 1 o mais favorável à oposição e 7 o mais favorável ao regime. Mesmo nas áreas mais chavistas analisadas, enquadradas neste último grupo, Edmundo González desponta na liderança no levantamento dos brasileiros, com mais de 49% dos votos.
Reservadamente pelo temor de divulgar seu nome, o líder social e ativista cuja ONG deu início ao projeto afirma à reportagem que foi pensada a escolha de chamar pesquisadores brasileiros renomados. Ele disse que dois foram os fatores para a decisão.
Primeiro, o fato de o Brasil ser um dos países com maior peso nas negociações diplomáticas da Venezuela. Segundo, o fato de que os brasileiros envolvidos já tinham experiência em pesquisas eleitorais no Brasil, que recentemente foi alvo de acusações infundadas da ultradireita que colocavam em dúvida a lisura do processo eleitoral.
Os pesquisadores atualizariam seus dados conforme recebem mais atas eleitorais. Com a amostragem que têm, porém, já afirmam que o quadro geral, de maioria para Edmundo González, não mudará.