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Artistas criam folhetos para buscar raptados pelo Hamas – 16/10/2023 – Mundo

Desde o início da guerra em Israel e Gaza, as paisagens urbanas de cidades como Nova York, Berlim, Lisboa e Buenos Aires têm sido cobertas com símbolos emergentes da dor nacional dos israelenses.

São folhetos —afixados em postes de luz, troncos de árvores e placas de estacionamento, e nas escadarias das estações de metrô— cada um com a palavra “sequestrado”, junto a uma fotografia de alguém raptado em Israel por terroristas do Hamas.

Os cartazes parecem surgir do nada e, em alguns casos, desaparecem com a mesma rapidez, arrancados como um sinal da angústia e da raiva produzidas pelo conflito no Oriente Médio.

Parte arte de rua e parte campanha ativista viral, os folhetos foram criados pelos artistas israelenses Nitzan Mintz, 32, e seu parceiro, que atende pelo nome de Dede Bandaid, 36. Não há uma lista pública oficial dos sequestrados, então os artistas têm mantido contato direto com parentes e amigos daqueles que foram raptados para obter nomes e fotos.

Eles estavam na cidade de Nova York em uma visita de três meses, vindos de Israel, quando a guerra começou. “Nos sentimos completamente inúteis e miseráveis estando tão longe de nosso país”, disse Mintz. “Não conseguíamos suportar, então nos perguntamos: ‘Como podemos usar nossos talentos como artistas de rua para apoiar a questão de trazer de volta para casa essas pessoas?'”

Há cerca de uma semana, eles (junto com Tal Huber, designer em Israel) começaram a criar esses totens dos desaparecidos e compartilhar arquivos digitais das imagens que podem ser baixadas e impressas em 12 idiomas, incluindo português, sérvio e holandês. Desde então, em uma onda popular, as pessoas imprimiram os folhetos e os colaram em espaços públicos ao redor do mundo. Gal Gadot, Amy Schumer e Jack Black, entre outros, espalharam as mensagens no Instagram. Em Nova York, milhares de cartazes foram colocados pelos próprios artistas.

Os folhetos mostram bebês e crianças —Kfir, de 9 meses; e Emma e Yuli, gêmeas de 3 anos com os cabelos presos— assim como adolescentes e avós, como Liri Albag,18, e Margalit Moses, 78. A maioria das pessoas que até agora apareceram nos cartazes é israelense. Alguns também são cidadãos dos Estados Unidos, da Argentina e da Alemanha. Todos são mostrados em imagens tiradas antes de 7 de outubro, quando o Hamas atacou Israel: eles estão dando mamadeiras para bebês, sorrindo com cônjuges, posando para selfies sob a marcante faixa “SEQUESTRADO”.

Os folhetos lembram cartazes semelhantes que eram onipresentes em Nova York nos dias após o ataque de 11 de setembro de 2001, quando os entes queridos esperavam que seus parentes desaparecidos pudessem estar feridos em hospitais ou vagando pela cidade.

Nem obituário, nem discurso fúnebre, disse Mintz, os sinais não devem ser confundidos com memoriais para os reféns. “Ainda há esperança de que eles estejam vivos”, disse ela.

Em algumas cidades, os cartazes foram arrancados logo após serem colocados. Os artistas não ficaram chocados. “Nós sabíamos que isso iria acontecer”, disse Mintz. “Somos artistas de rua —nossa arte não dura muito tempo.”

Ela acrescentou: “Nosso objetivo é colocar 10 mil para cada um que for retirado. Precisamos mantê-lo vivo.”

Para Mintz e Dede, a vida se tornou um ciclo de percorrer bairros desconhecidos de Nova York em busca de gráficas, arrancar fita adesiva do rolo e tentar fazer sua parte para absorver o horror sentido por seus compatriotas israelenses. O governo israelense agora diz que quase 200 pessoas foram sequestradas por terroristas do Hamas —a facção fala em até 250.

“Avós sequestrados!” disse Mintz enquanto olhava para um monte de folhetos recém-impressos. “Não consigo acreditar que estou dizendo essas palavras.”

Agora, com centenas de milhares de palestinos desabrigados, já que o governo israelense os instou a fugir para o sul de Gaza antes de uma provável invasão terrestre, os artistas disseram que estavam rezando pela paz. “Não estou feliz com o que está acontecendo em Gaza, é terrível”, disse Mintz. “Quero que os palestinos sejam livres do Hamas, quero que nossas crianças aprendam juntas, quero que a Palestina prospere e seja rica, mas eles precisam de uma liderança diferente.”

Ela defende que haja mudanças em Israel. “Nos últimos dois anos, metade da população protestou todos os dias contra nosso governo”, disse ela. “Então também temos problemas. Primeiro, precisamos substituir o Hamas imediatamente, mas acredito que também precisamos substituir nosso governo.”

No último sábado (14), Mintz e Dede passaram metade do dia colando 600 panfletos em qualquer superfície plana que estivesse seca o suficiente para a fita colar. Eles evitam principalmente colocar papéis no metrô, mas neste dia chuvoso em Nova York eles seguiram o tráfego de pedestres e colaram dezenas de placas ao longo das escadarias da estação Myrtle-Wyckoff Avenues, no Brooklyn. Os passageiros do metrô diminuíram a velocidade para dar uma olhada.

Mintz até entrou em um banheiro de metrô e colocou um panfleto mostrando o bebê Kfir.

Eles focaram o resto do dia em divulgação —reconectando-se com Huber em Israel para trabalhar em novos panfletos e no compartilhamento de centenas de postagens nas redes sociais, na tentativa de expandir o círculo daqueles que podem participar do esforço. Os três também estavam respondendo mensagens de parentes das vítimas de sequestro, pedindo que seus entes queridos fossem incluídos na campanha.

Tal Shani, 47, passou vários dias angustiantes tentando pensar em algo, qualquer coisa, que pudesse fazer para ajudar seu filho Amit Shani, 16, que foi sequestrado de seu kibutz.

“Um amigo me perguntou se eu queria um cartaz do Amit, e eu disse sim”, disse Shani em uma entrevista por telefone no domingo (15). “Esta é a única coisa que posso fazer por ele agora, deixar seu rosto espalhado para que todos saibam o que aconteceu.”

Ainda assim, é doloroso para ela olhar essas imagens. “É muito difícil para mim agora ver o rosto dele, olhar para a foto dele”, disse ela. “Ele é meu bebê! Ele é grande, mas ele é meu bebê. Ver o rosto dele e a palavra acima é ‘sequestrado?’ O quê? Não é real! Mas é.”

Foi em 8 de outubro que os artistas começaram a pensar em maneiras de servir o país deles a uma distância de 9.100 km. Eles se concentraram nos que foram sequestrados, disseram, porque acreditam que a guerra diminuiria se os reféns fossem libertados.

Eles consideraram imprimir mensagens de “desaparecidos” nas laterais das embalagens de leite, mas não quiseram esperar para encomendar os materiais necessários. Eles simplificaram a ideia e se conectaram com Huber, que criou o design digital dos pôsteres.

No início da semana passada, Mintz e Dede imprimiram 2.000 panfletos, compraram algumas centenas de rolos de fita adesiva e carregaram os suprimentos por Manhattan enquanto os colavam em postes de energia nas esquinas e nos parques. Eles pediram ajuda a estranhos, oferecendo pilhas de folhetos e fitas adesivas para qualquer pessoa que pudesse aderir à campanha. Eles não encontraram interessados.

Foi então que decidiram compartilhar links para os arquivos digitais nas redes sociais e traduzi-los para outros idiomas. “Foi como jogar um fósforo em um campo seco”, disse Mintz. Em três horas, eles começaram a notar panfletos por toda Nova York que eles não tinham colocado. Então as imagens se espalharam no Instagram.

“Os sequestrados ainda não foram libertados”, disse Dede, “mas parece que estamos fazendo alguma coisa”.



Fonte: Folha de São Paulo

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