O partido nacionalista que governo a Polônia desde 2015 foi o vencedor das eleições parlamentares do país do Leste Europeu neste domingo (15), aponta pesquisa de boca de urna, mas não deverá obter maioria para formar um governo sozinho.
Assim, é possível que a oposição, que já cantou vitória, forme o próximo governo, mas tudo depende de resultados finais. É o mais importante pleito no país desde o fim do comunismo, em 1989, com repercussões que vão da Guerra da Ucrânia à União Europeia.
Segundo dados do instituto Ipsos para a rede TVN24, o PiS (Lei e Justiça, na sigla polonesa) e seu grupo Direita Unida obtiveram 36,8% dos votos, ou cerca de 200 das 460 cadeiras da Sejm, a Câmara dos Deputados local.
O segundo colocado foi o liberal KO (Coalizão Cívica), do ex-premiê Donald Tusk, que marcou 31,6% na boca de urna. O político celebrou o resultado, afirmando que “acabou o reinado do PiS”. Já o líder da sigla governista, Jaroslaw Kazcinsky, disse que ainda é incerto o que irá ocorrer.
Com isso, os resultados deverão depender da fragmentada composição abaixo dos dois: O TD (Terceira Via) teve 13% na pesquisa, ante 8,6% do NL (Nova Esquerda) e 6,2%, do Confederação. Tusk cantou vitória, dizendo que terá mais condições de formar um governo.
Até aqui, as atenções se voltavam para a última agremiação, um grupo que reúne diversos integrantes da extrema-direita local, incluindo xenófobos e antissemitas. De todos os partidos principais, o Confederação é o único que parece disposto negociar com o atual governo, que já adernava mais à direita, de olho justamente no eleitorado radicalizado —que, confirmada a boca de urna, teve votação um pouco menor do que a esperada.
Estão em jogo as 460 cadeiras do Sejm, hoje com maioria governista, e 100 do Senado, ora oposicionista.
A campanha eleitoral foi pesada, com diversas acusações de lado a lado. Contra o PiS pesou mais a alegação de que, além de empregar em seu favor a máquina do Estado, como a TV pública, o partido turbinou o nacionalismo militarista que agora caracteriza a Polônia.
Isso tem diversas implicações, a mais imediata relativa à Guerra da Ucrânia. Um dos mais belicistas membro da Otan, a Polônia embarcou em um programa agudo de rearmamento, encomendando de tanques a caças americanos e sul-coreanos, em contratos anunciados de ao menos R$ 325 bilhões. Neste ano, pretende gastar 4% do PIB com defesa, o dobro da meta da aliança militar ocidental.
Mas o apoio irrestrito a Kiev, que incluiu o envio de 240 tanques T-72 e um número incerto de caças MiG-29, esmaeceu ao longo da campanha eleitoral. Tanto o presidente Andrezj Duda, que foi eleito pelo PiS no mesmo 2015, quando o premiê Mateusz Morawiecki, passaram a fazer críticas ao governo de Volodimir Zelenski por suposta ingratidão.
Ao fim, Morawiecki prometeu não mais enviar armas para a Ucrânia. De forma subjacente às críticas está a resistência polonesa a comprar grãos do vizinho para não alienar a base eleitoral de agricultores, e também um aceno à xenofobia muito forte no país, que recebeu 1 milhão de refugiados da guerra e tem um histórico complexo de relação com Kiev.
Na vizinha Eslováquia, um partido de centro-esquerda favorável à Rússia venceu a eleição parlamentar há duas semanas, mas como não teve maioria para formar o governo aliou-se a uma sigla que, em princípio, quer a manutenção do apoio a Zelenski.
Voltando à Polônia, tão ou mais importante é o impacto da eleição na UE (União Europeia). Com 38 milhões de habitantes, o país é a principal economia do leste do bloco, e desde que o PiS implantou reformas para tolher liberdade do Judiciário, está no alvo de instituições europeias.
A disputa na Corte Europeia de Justiça acerca dessas leis ainda está inconclusa, mas o país periga virar uma nova Hungria, que foi rebaixada na categoria de liberdade política pelos padrões da UE. O iliberalismo parece estar em alta no Leste Europeu, ameaçando os próprios princípios fundadores da união.
O PiS já namorava a xenofobia e esposava práticas de limitação da liberdade de expressão antes mesmo da ascensão da extrema-direita. O país, fortemente católico, tem políticas restritivas ao aborto, e os direitos de comunidades LGBTQI+ são questionados.
Há nuances políticas. Na Hungria, o premiê Viktor Orbán é visto como um aliado de Putin, enquanto os poloneses são radicalmente antirrussos, até pelo passado de dominação por Moscou. Aliás, não só: a Alemanha, cujos nazistas promoveram a partilha do país com os soviéticos e provocaram 7 milhões de mortes polonesas na Segunda Guerra Mundial, é alvo de críticas e pedidos de indenização até hoje.
Na prática, contudo, acomodações são possíveis, até em nome dos acordos econômicos inerentes à carteirinha do clube. Na outra agremiação importante do continente, a Otan, a assertividade polonesa já a tornou um fator incontornável nas mesas de discussão, em especial devido à sua posição de anteparo contra as forças de Vladimir Putin.
Com efeito, o país está em processo de certificar um poderoso sistema antimísseis americano e tem forte presença militar dos EUA, que sempre têm estacionados lá cerca de 10 mil soldados. Isso, somado à sua modernização das Forças Armadas, tem lhe valido o apelido de fortaleza da Otan no leste.