Salvo um cataclisma político hoje inimaginável, Rishi Sunak não será mais primeiro-ministro do Reino Unido em menos de um mês. As pesquisas colocam os conservadores mais de 20 pontos percentuais atrás do rival do Partido Trabalhista, Keir Starmer.
A se confirmar o cenário, os britânicos aparentemente seguirão à esquerda justo quando o resto do mundo rico vira à direita, como foi prova a recente eleição do Parlamento Europeu. A mudança de direção política no Reino Unido, porém, está longe de ser uma guinada; é uma leve curva. A estratégia eleitoral trabalhista —que tem se provado bem-sucedida— é a de se colar tão próximo quanto possível a Sunak pela esquerda.
Se o premiê conservador se move à direita, os trabalhistas vão junto. Se tenta voltar para o centro, vê seu caminho bloqueado por Starmer. Assim, o partido de oposição leva os votos da centro-direita à esquerda.
Os trabalhistas adotaram discurso praticamente idêntico ao dos conservadores em quase tudo. Prometeram reduzir a imigração (que bateu recorde sob Sunak), diminuíram suas metas para atingir a neutralidade nas emissões de carbono e juram que não aumentarão impostos de renda e sobre consumo. O que não respondem é como pretendem, então, melhorar os serviços públicos, em frangalhos depois da política de austeridade implementada desde 2010 pelo também conservador David Cameron.
O caminho da oposição é facilitado pela situação do Partido Conservador, desgastado por 14 anos de governo e sob crise existencial. Se à esquerda há Starmer, pela direita Sunak se depara com um velho fantasma: Nigel Farage.
Populista que mobilizou o país em favor do brexit, Farage reapareceu para anunciar que concorrerá a uma vaga no Parlamento pelo nanico Reform UK, com um único representante na Câmara dos Comuns. Desde que assumiu o comando do partido, levou-o ao terceiro lugar nas pesquisas, logo atrás dos conservadores, e um levantamento já apontou a sigla na vice-liderança.
Farage é um político de carreira. Já tentou por sete vezes eleger-se para o Parlamento. Seu discurso é o clássico da direita populista: tudo é culpa dos políticos (como, claro, se não fosse um deles), dos imigrantes, da esquerda woke. Qualquer semelhança com o bolsonarismo, em geral, e com a trajetória pessoal de Jair Bolsonaro, em particular, não é mera coincidência. Tal como Bolsonaro, Trump e Le Pen, Farage vende-se como um homem do povo contra as elites.
Qual será, então, o impacto do seu reaparecimento sobre as eleições? Por ora, relativamente pequeno. Ninguém acha que o Reform UK ganhará mais do que um punhado, se tanto, de assentos na Câmara dos Comuns, graças ao voto distrital de maioria simples adotado no Reino Unido. O partido é pequeno e não tem nenhuma estrutura burocrática. Sua votação deve ser dispersa, não concentrada em distritos específicos, como deveria ser para maximizar o número de membros eleitos.
Mais difícil é avaliar o efeito de longo prazo na política britânica. Farage diz que quer se tornar a oposição oficial ao governo de Starmer. Isso dependerá de como os conservadores reagirão ao massacre que devem encarar nas urnas. Internamente, o partido se vê dividido entre moderados, que têm ojeriza a Farage, e ultradireitistas, que não veem a hora de abraçá-lo de vez. A derrota fará com que decidam que a única forma de voltar ao poder é pelo centro político ou o possível sucesso de Le Pen e Trump os convencerá de que a vitória virá com a defesa de posições ideológicas cada vez mais extremas?
Sunak certamente não continuará à frente dos conservadores depois da derrota praticamente inevitável no mês que vem. Caberá ao novo líder do partido decidir que direção tomar: o Reino Unido continuará a ser uma das poucas democracias em que a ultradireita não vigora? A julgar pelos ventos que ora sopram no resto da Europa e nos Estados Unidos, a resposta parece ser não.