A Índia recomendou nesta quarta-feira (20) que seus cidadãos evitem viagens ao Canadá. A orientação se dá em um momento em que os dois países enfrentam uma crise diplomática motivada pelo assassinato de um ativista sikh, religião fundada pelo Guru Nanak no século 15, em solo canadense.
As tensões começaram no início da semana, quando o primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, anunciou a expulsão de um agente de segurança indiano de seu país no Parlamento. A justificativa era de que a inteligência canadense suspeitava que o governo indiano estivesse envolvido na morte do ativista Hardeep Singh Nijjar na província da Colúmbia Britânica, no oeste do território, em junho.
Nova Déli chamou as acusações de absurdas e, ato contínuo, ordenou a saída de um diplomata canadense do país. Nesta quarta, avançou novamente contra Ottawa ao publicar um comunicado em que expressa preocupação com a segurança de seus cidadãos em solo canadense devido à proliferação de “crimes de ódio” contra eles.
O texto aconselha, assim, indianos a evitarem viajar para as regiões do país norte-americano onde os incidentes ocorreram, sem citar quais são elas ou detalhar os supostos crimes de ódio. O recado se destina sobretudo a estudantes, que são orientados a exercer extrema cautela e vigilância.
O Canadá tem uma das maiores comunidades de origem indiana no exterior: são 1,4 milhão de pessoas, ou 3,5% dos 40 milhões que compõem a população canadense. Desde 2018, indianos também são a nacionalidade estrangeira mais comum entre estudantes, representando 40% dessa comunidade. Segundo a Agência de Educação Internacional Canadense, há quase 320 mil alunos indianos em solo canadense hoje.
Até o momento, autoridades canadenses não informaram por que suspeitam que o governo indiano esteja conectado com o assassinato de Nijjar. O ativista, morto a tiros na saída de um templo sikh na cidade de Surrey, havia, no entanto, sido designado como terrorista por Nova Déli em julho de 2020.
Uma insurreição sikh provocou milhares de óbitos na Índia nos anos 1980 e 1990. Suas vítimas incluíram Indira Gandhi, assassinada por guarda-costas sikh em 1984, quando era primeira-ministra, e o então ministro-chefe de Punjab, Beant Singh, morto durante um ataque suicida em 1995.
Por fim, no entanto, o governo indiano, liderado pelo Congresso, conseguiu suprimir a revolta. Hoje há pouquíssimo apoio interno ao projeto dos sikhs de criar um Estado independente chamado de Calistão em um território que abrange tanto Punjab, no noroeste da Índia, como partes do Paquistão. O movimento ainda é banido por Nova Déli, que trata o assunto como questão de segurança nacional, embora grupos restritos de ativistas por vezes organizem protestos fora de embaixadas indianas em países como Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e, é claro, Canadá.
O país norte-americano abriga, aliás, a maior quantidade de sikhs fora do estado indiano de Punjab —cerca de 770 mil pessoas declararam o sikhismo como sua religião no censo de 2021. A Índia há muito demonstra insatisfação com a atividade desses seguidores no Canadá, e já urgiu o governo a agir contra os elementos em ocasiões anteriores. Alguns analistas afirmam que Ottawa não abafa o movimento porque eles formariam um grupo político relativamente influente.
A crise diplomática entre os dois países já tem alguns implicações econômicas, com a pausa das negociações de um acordo comercial que deveria ser fechado até o final do ano. O Canadá deu poucos detalhes sobre os obstáculos ao diálogo, enquanto a Índia mencionou “certos desdobramentos políticos”.