A bióloga e advogada Bertha Lutz, considerada uma das principais líderes na luta pelo sufrágio das mulheres no Brasil, foi citada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em seu discurso de abertura da Assembleia-Geral da ONU, nesta terça-feira (19).
“Inspirados na brasileira Bertha Lutz, pioneira na defesa da igualdade de gênero na Carta da ONU, aprovamos a lei que torna obrigatória a igualdade salarial entre mulheres e homens no exercício da mesma função”, afirmou Lula, antes de dizer que o país vai combater “todas as formas de violência contra as mulheres”.
Nascida em 1894 de um casal formado por uma enfermeira e um médico, Lutz foi criada na Europa, onde conheceu a luta pelo voto feminino na Inglaterra. De volta ao Brasil, em 1918, a bióloga virou pesquisadora do Museu Nacional do Rio de Janeiro, conquistando o posto de segunda mulher a entrar no serviço público do país.
Lutz colecionaria pioneirismo em diversas outras áreas ao longo da vida. Na primeira metade do século 20, liderou, por exemplo, a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF). A entidade foi uma das que atuaram para fortalecer a proposta do voto feminino organizando passeatas, palestras e manifestos, publicando artigos na imprensa e se associando a grupos feministas de outros países.
Considerado uma das principais inovações do Código Eleitoral de 1932, que completou 90 anos no ano passado, o voto feminino foi conquistado após a intensa pressão e mobilização que essas organizações protagonizaram.
A população feminina foi às urnas em todo o Brasil pela primeira vez nas eleições gerais de 1933. No pleito, 19 mulheres tentaram um cargo público entre os 1.040 candidatos, e apenas uma delas foi eleita: Carlota Pereira de Queiroz, de uma vertente conservadora de São Paulo. A votação obtida por Lutz a levou à suplência.
Após a morte do titular, Cândido Pessoa, em 1936, a bióloga assumiu com uma pauta focada na igualdade de gênero no trabalho —assunto com o qual tinha afinidade. Ao longo da vida, a bióloga também abordou o tema na OIT (Organização Internacional do Trabalho).
O Congresso seria fechado no ano seguinte, devido à implementação do Estado Novo, mas Lutz seguiria ocupando cargos públicos, como a chefia do setor de Botânica do Museu Nacional. Ela ainda participou do primeiro Congresso Internacional da Mulher das Nações Unidas, na Cidade do México, e participou da construção da Carta da ONU, que estabeleceu as bases para a organização, em 1945.
“Esse feito, por muito tempo atribuído a diplomatas de países desenvolvidos, na verdade foi fruto da insistência de mulheres latino-americanas presentes na conferência, lideradas pela cientista e diplomata brasileira Bertha Lutz”, afirmou a ONU em 2016, com base no trabalho de duas pesquisadoras da Universidade de Londres, a argelina Elise Dietrichson e a norueguesa Fatima Sator.
O documentário “Bertha Lutz – A Mulher na Carta da ONU”, de Guto Barra e Tatiana Issa, acompanha as duas acadêmicas que recuperaram a participação da brasileira na conferência.