Reforços policiais no arquipélago da Nova Caledônia, território ultramarino francês no Pacífico, permanecerão pelo tempo que for necessário, disse o presidente Emmanuel Macron nesta quinta-feira (23), após visitar áreas atingidas pela onda de protestos decorrentes de uma contestada reforma eleitoral na ilha.
A visita de última hora de Macron ocorre após seis pessoas terem sido mortas nos tumultos, que deixaram um rastro de lojas saqueadas e carros incendiados desde que começaram, há mais de uma semana.
“Nas próximas horas e dias, novas e intensas operações serão realizadas onde for necessário, e a ordem republicana em sua totalidade será restabelecida porque não há outra escolha”, disse Macron durante uma reunião com líderes políticos e empresariais na capital do território, Noumea.
As estradas em toda a ilha permaneceram bloqueadas por barricadas de manifestantes, e os moradores compartilharam informações nas redes sociais sobre rotas seguras para obter comida, gasolina e remédios.
Macron sobrevoou áreas destruídas por incêndios criminosos, enquanto tratores trabalhavam para limpar os escombros. Prefeitos dos subúrbios mais atingidos se juntaram à reunião de Macron na Alta Comissão da França, juntamente com líderes pró-franceses e pró-independência.
Descrevendo os distúrbios como “uma insurreição sem precedentes cujo grau de violência ninguém teria previsto”, Macron disse que o reforço na segurança, de cerca de 3.000 homens, permanecerá na Nova Caledônia se necessário, mesmo durante as Olimpíadas de Paris, que começam no fim de julho.
Além da segurança, a questão-chave é qual anúncio Macron poderia fazer em relação à reforma eleitoral que desencadeou os protestos.
Aprovado pela Assembleia Nacional, em Paris, o texto permitiria que milhares de residentes franceses que vivem na Nova Caledônia há pelo menos dez anos passassem a votar no pleito local, o que Paris diz ser necessário para melhorar a democracia na ilha, onde quase um quarto da população se identifica como europeia, a maioria francesa.
Líderes dos indígenas Kanaks, que formam a maior comunidade (40%), querem que a reforma seja revogada, sob temor de que a mudança no eleitorado dilua o voto da etnia e torne mais difícil a aprovação de qualquer futuro referendo sobre independência.
As listas de eleitores foram congeladas pelo Acordo de Noumea, de 1998, que encerrou uma década de violência ao delinear um caminho para a autonomia gradual do território. Mas a expiração do pacto em 2021 e um boicote dos Kanaks a um referendo de independência realizado durante a pandemia de coronavírus no mesmo ano levaram a um impasse político. Nesta quinta, Macron afirmou que não aceitará contestação do resultado dessa consulta, na qual 96% se disseram contrários à separação da França.
‘PAÍS ENGRAÇADO’
Em comentários feitos a um grupo de jovens, Macron não deu sinais de querer recuar na reforma, ainda não ratificada por um congresso especial de ambas as Casas do Parlamento. “Somos um país engraçado. Na França, estrangeiros [se forem cidadãos da UE] podem votar nas eleições locais. Mas pessoas que estão aqui [na Nova Caledônia] há mais de dez anos são avisadas: ‘vocês não podem votar'”, disse.
Entre os líderes políticos que se reuniram com Macron estavam o chefe de governo da Nova Caledônia, Louis Mapou, e o presidente do Congresso local, Roch Wamytan, que foi signatário do Acordo de Noumea.
Antes da reunião, o bloco pró-independência Frente de Libertação Nacional Kanak e Socialista emitiu uma nota na qual disse esperar que Macron fizesse um anúncio forte que pudesse “dar novo fôlego” ao diálogo, o que até o momento não ocorreu. Depois do encontro, o presidente deu uma declaração um tanto dúbia sobre a situação no território. “Acalmar não pode significar voltar atrás. Acalmar não pode significar ignorar a expressão popular que já ocorreu.”
A Nova Caledônia é a terceira maior fornecedora de níquel do mundo, mas o setor está em crise, e 1 em cada 5 residentes vive abaixo do limite de pobreza.