Às 11:52 desta segunda-feira (11), numa cerimônia com chefes de Estado e milhares de chilenos, o Palácio de la Moneda ficou totalmente em silêncio por um minuto.
Neste horário, há exatos 50 anos, o edifício havia sido bombardeado, dando início à ditadura miliar chilena (1973-1990), que deixou mais de 3.000 vítimas.
A cerimônia foi marcada pela emoção, com testemunhos de vítimas, de Isabel Allende, senadora e filha do então presidente Salvador Allende, morto na ocasião, e de outras referências da luta pelos direitos humanos, como a argentina Estela de Carlotto, presidente da Associação das Avós da Praça de Maio.
Estavam presentes os líderes de Colômbia (Gustavo Petro), México (Andrés Manuel López Obrador), Uruguai (Luis Lacalle Pou), Bolívia (Luis Arce), ex-mandatários como Felipe González (Espanha), Juan Manuel Santos (Colômbia) e José Mujica (Uruguai), além dos chilenos Ricardo Lagos e Michelle Bachelet. Vários países mandaram representantes. Do Brasil estiveram os ministros Flavio Dino (Justiça) e Silvio Almeida (Direitos Humanos).
Também do Brasil esteve presente uma delegação de mais de cem ex-exilados brasileiros que buscaram refúgio no país andino durante a ditadura brasileira (1964-1985).
“Estive preso cinco anos no Chile, depois passei 20 anos exilado nos EUA, para mim Allende foi tudo, e depois, só sofrimento. É uma emoção estar aqui hoje”, disse José Espina, 70, que depositava flores na frente da porta lateral do Palácio de la Moneda pela qual foi retirado o corpo de Salvador Allende.
“É claro que se podem debater erros e acertos da Unidade Popular (partido de Allende), mas nunca podemos justificar ou permitir o fim da democracia e o abuso de direitos humanos”, disse a filha de Allende entre lágrimas que comoveram o público.
Em seu discurso, o presidente Gabriel Boric afirmou: “A democracia não está garantida, e é dever da democracia estar atenta ao bem-estar da população. Cuidar do ambiente, das mulheres, do meio ambiente. Isso é cuidar da democracia.”
Nascido 13 anos depois do golpe, Boric pediu que as novas gerações prestassem atenção ao que se viveu nesse período. “É nossa geração que deve levar essa memória e essa tarefa adiante”. Ele reforçou que a única forma de atingir uma conciliação num país dividido é com diálogo e com democracia. “É muito importante reforçar que não se pode separar o golpe do que ocorreu depois. Nada positivo pode nascer em um país se está fundado no abuso de direitos humanos.”
Em rede social, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou: “Mais do que recordar os 50 anos do golpe militar no Chile e da morte do Salvador Allende, hoje é dia de reafirmarmos a democracia como valor essencial para os seres humanos. Que sem ela desaparece aquilo que nos faz humanos.”
Enquanto Boric falava, ao lado do La Moneda passavam grupos organizados de ex-prisioneiros de diferentes centros de tortura, com fotos de companheiros mortos.
A oposição se manteve cautelosa. A maioria não esteve presente e não quis assinar um documento comum proposto por Boric comprometendo-se com a defesa da democracia e a rejeição aos abusos dos direitos humanos.
O principal partido de direita, a UDI, emitiu um comunicado repudiando os atos de violência de Estado, mas enfatizando que o golpe seria inevitável diante da “degradação da situação social e econômica”.
A noite anterior também teve momentos de emoção e de tensão. O Palácio de La Moneda foi abraçado por mulheres vestidas de preto e com velas lembrando as vítimas. Pouco antes, manifestantes antigoverno tentaram atacar a chamada porta de Allende, mas os carabineros (polícia chilena) atuaram, usando gases lacrimogêneos e diluindo a manifestação.